
Alberto
Gonçalves - OBSERVADOR
Portugal
para os portugueses. Nenhum estrangeiro mentalmente equilibrado aguentaria isto
mais do que um fim-de-semana. A apatia perante os selvagens que mandam no país
não é para todos os paladares.
Tomem lá
uma anedota para descontrair. Conhecem a do cigano, do cavalo e da deputada
municipal do PAN na Moita? É gira: a senhora do PAN criticou os maus-tratos
dispensados aos cavalos por parte dos ciganos da região. A assembleia acusou a
senhora de “xenofobia”. O PAN forçou-a a demitir-se. Os ciganos continuam a
sobrecarregar os cavalos de trabalho e pancada. Os cavalos continuam a sofrer.
O PAN continua a ser o partido que defende os bichos. E, desde que inspire uma
boa indignação, a xenofobia tem costas largas.
Parecendo
que não, até por causa do significado das palavras e doutras minudências,
sempre é preferível que a xenofobia diga respeito à aversão a estrangeiros, e
que os crimes não se castiguem ou perdoem de acordo com a “etnia” dos perpetradores.
Os crimes variam. Os estrangeiros são os do costume. Chegam aí exaustos,
desorientados, vindos de lugares remotos, exprimem-se em línguas diferentes,
vestem roupas esquisitas, exibem costumes estranhos, interpelam transeuntes com
pedidos inconvenientes, atafulham ruas e pracetas, vêem-se frequentemente
explorados por gente sem escrúpulos e, de brinde, acabam insultados onde calha.
Falo, é claro, dos turistas.
Há dias, a
propósito do São João no Porto, o “Público” publicou um artigo acerca do São
João no Porto. É um artigo preguiçoso e mal escrito, sem função ou tema, que se
resume a meia dúzia de depoimentos de feirantes em volta das vendas e da
“tradição”. Entre os feirantes, um vendedor de “pipocas vermelho garrido”
queixa-se das modernices e, em particular, do turismo. O “Público” aproveitou a
deixa e elevou o drama a título: “O São João do Porto já não é o que era? ‘Há
turistas a mais’”.
Não
importa que deixem dinheiro. Não importa que criem emprego. Não importa que
façam a exacta figura que fazemos quando visitamos os países deles. Para boa
parte da esquerda, uns pedaços da “direita” e inúmeros indecisos, os turistas
constituem uma praga atentatória da “vida portuguesa”, a erradicar com
urgência. Além disso, promovem um milagre: em tempos de ofensa fácil e
vigilância apertada, os turistas concedem-nos a liberdade de ofender
forasteiros com uma violência que o PNR não ousaria dedicar a refugiados
sírios. E, ao contrário do que agora é moda, sem aborrecimentos profissionais,
morais ou legais. Para cúmulo, o ódio aos turistas encontra um alvo, ou cinco,
literalmente em cada esquina, enquanto o ódio do PNR a refugiados e afins se vê
à rasca para descobrir destinatários (excepto, talvez, nos aeroportos, a
caminho da Europa que lhes interessa). Aliás, convém evitar quaisquer confusões
com sentimentos de intolerância: se o sr. Trump não permite que as populações
integrais da Guatemala, El Salvador, Nicarágua e México penetrem
confortavelmente o Texas, o sr. Trump é fascista. Se desejarmos enxotar 17
alemães do Chiado, somos patriotas. Em suma, descontados os que chegam na
penúria, que servem a demagogia e o escarcéu, os estrangeiros são
essencialmente desprezíveis e, em prol da higiene pública, reclamam a acção das
autoridades.
A boa
notícia é que as autoridades já começaram a agir. Na pequena escala,
multiplicam as taxas, as taxinhas, os regulamentos, as restrições, as coimas e
o geral inferno burocrático que, grão a grão, transformam as actividades
ligadas ao turismo em suplícios que indivíduo algum suportará. Ao nível “macro”
(perdão), temos os benefícios fiscais ou os 6500 euros que o Estado oferece aos
emigrantes que regressem à terrinha e contribuam para diluir a sujidade
turística e afinar a pureza da “portugalidade”. Apenas se estranha um pouco
que, dado o fulgurante sucesso económico dos drs. Costa e Centeno, os
emigrantes necessitem de incentivo material para voltar aqui. A acreditar nos
peritos amestrados do governo, a pujança de Portugal é tanta que os outrora
foragidos da “troika” deviam esgadanhar-se para alcançar Vilar Formoso. Pelos
vistos, não se esgadanham. E nem os incentivos convencem esses traidores.
Felizmente,
há excepções. Decerto desiludido com a fraca resposta dos emigrantes
indiferenciados, o governo passou a apostar no regresso dos especializados. Em
particular, os funcionários do Estado Islâmico. É uma ideia radiosa, a de
recuperar “jihadistas” em fase indefinida das respectivas carreiras. Trata-se
de trabalhadores altamente motivados, assíduos e dotados de competências raras
nos sectores dos rebentamentos e das decapitações. É verdade que não são
muitos. Mas são muito empenhados e propensos a provocar impacto junto dos que
os rodeiam. Um único terrorista (certificado) é capaz de, sozinho, eliminar
directamente dezenas de turistas e indirectamente afugentar milhares.
Portugal
para os portugueses, pois – mesmo porque nenhum estrangeiro mentalmente
equilibrado aguentaria isto mais do que um fim-de-semana. A apatia perante os
selvagens que mandam no país não é para todos os paladares. O que está a
acontecer no prédio Coutinho, que deliberadamente não invoquei para não chamar
os selvagens pelo seu autêntico nome, é um reles, bastante reles, exemplo do
que acontece diária, impune e discretamente entre o poder e um povo que se quer
orgulhosamente só. É uma sorte: um povo assim orgulhoso de enxovalhos seria
péssima companhia.
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