A
maioria dos portugueses olha para o governo de Portugal como o governo de
Portugal, não como o governo da esquerda ou da direita. Milhões de portugueses,
seguramente a maioria, se contarmos com os que não votam, não é dos que
nasceram para votar toda a vida PS, PSD ou outra coisa qualquer. Por isso, não
aceitam o campeonato patrioteiro em que criticar um governo em início de funções
é um crime de lesa-majestade. Já vivemos em democracia tempo suficiente para
perceber que não há nada a ganhar quando se vive em uniões nacionais, em que a
determinado momento deixamos os governos em paz, à espera de que eles mostrem o
que valem, para depois estarmos juntos na crítica e exigir que cedam o lugar a
outros, para voltarmos a ter a quem dar um estado de graça. Não há nada de
antipatriótico, nem de antidemocrático em criticar quem está no poder e quem o
apoia. Habituem-se.
Dito
isto, alguém pensa que uma estratégia em que se aprova aquilo com que não se
concorda e se aceita deixar para as calendas aquilo em que se acredita pode
durar a legislatura inteira? Apoiar um governo ao mesmo tempo que se lhe faz
oposição, como é o caso do Bloco e do PCP, pode parecer uma grande estratégia,
mas não é. Não estar no governo, apoiando-o, é sempre empurrar com a barriga
para a frente. Até ao momento em que as exigências europeias, com que o governo
está comprometido, ponham verdadeiramente à prova o valor intrínseco desta
coligação parlamentar. Por agora, o mal menor é o cimento que liga as esquerdas
ao governo do PS, mas os incómodos desta coligação parlamentar são evidentes. E
não vale a pena acusar a comunicação social de estar a criar factos políticos.
Queixem-se antes do Bloco e do PCP, que já perceberam que têm de puxar pelas
suas bandeiras, numa espécie de campeonato em que, mais do que influenciando o
governo, ganha quem for capaz de causar mais embaraços ao PS.
Bloquistas
a quererem refinanciar a dívida e comunistas a quererem nacionalizar o Novo
Banco, com os socialistas a meterem na gaveta os dois temas, é a garantia de
que a política continua a ser feita com muita hipocrisia, disfarçada de
saudáveis divergências. A arte suprema chegou com o Bloco, o PCP e o PEV a
aprovarem com críticas as contas do Estado dizendo, ipsis verbis, que
"este Orçamento não é o nosso, é o do PS". Até quando poderão os
partidos de esquerda enganar o seu eleitorado, dizendo que não têm nada a ver
com aquilo que só eles são capazes de aprovar?
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