Joana Bento Rodrigues - OBSERVADOR
Karl
Marx afirmou que a Família é uma estrutura social opressora, na qual o homem
representa o papel de “proprietário”, quer da sua mulher, quer dos seus filhos.
E que desta decorre a aceitação colectiva e acrítica de um sistema patriarcal,
hierarquizado, favorecedor da transmissão da propriedade entre gerações e,
portanto, da perpetuação da propriedade privada, pedra angular do capitalismo e
do sistema financeiro. Foi, por isso, proposta a destruição da Família,
enquanto caminho para o socialismo, tal como foi tentado na União Soviética,
embora sem sucesso. A via da força mostrou-se ineficaz.
Havia
que substituir estes vínculos por outros, como propuseram, posteriormente, os
estudos desenvolvidos pela Escola de Frankfurt. A década de 1970 trouxe a
revolução sexual, a “libertação” da mulher e a dissociação do significado
unitivo do matrimónio. A mulher, agora emancipada do marido, passou a ser
escrava do mercado de trabalho e a fugir ao apelo biológico da maternidade. Em
simultâneo, surge a necessidade de retirar à criança a noção de autoridade dos
pais, substituindo-a pela autodeterminação indiscriminada, numa sociedade
obediente apenas à autoridade do Estado.
Nesse
contexto, o conceito de “género” surge institucionalmente na Conferência de
Pequim de 1995 organizada pela ONU – a IV Conferência Mundial sobre a Mulher:
Acção para a Igualdade, Desenvolvimento e Paz –, que visava alcançar um
conjunto de resoluções para defender os direitos da mulher e a igualdade.
Assim,
a par da bandeira do combate à discriminação, sob pretexto de uma maior
elegância da linguagem, a palavra “sexo” passou a ser progressivamente
substituída por “género”. Ao estilo da novilíngua orwelliana, sexo deixou de
significar a distinção biológica entre masculino e feminino, sendo substituído
por dezenas de géneros à la carte, que vão desde o não-binário
a genderfluid (género variável). Assim se iniciou a
implementação da agenda da ideologia de género, advogando que a identidade
sexual do indivíduo resulta da cultura e não da biologia e que, no fundo, todos
os seres humanos nascem iguais, podendo cada um ser o que pretender.
Enquanto
ideologia, esta não é mais do que um erro a propalar, que derruba os princípios
naturais e instituídos, longe de toda e qualquer fundamentação científica. Mas,
tratando-se de um erro que vai contra os princípios, como pode vingar uma
ideologia? Antes de mais, é necessário alguém interessado no erro; segue-se a
necessidade da sua propagação e a existência de um público-alvo treinado para
não pensar e o aceitar.
Definido
o erro, identificam-se os interessados. São eles as instituições nacionais e
internacionais que procuram conquistar a hegemonia cultural e política.
Baseando-se no princípio marxista da concentração de poder absoluto dos
direitos dos cidadãos, com suposto benefício colectivo (incluindo a manutenção
da Paz mundial), estas aprofundam o controlo da liberdade religiosa, de
pensamento e de comunicação. Prevalece a socialização secundária, focada na interacção
do indivíduo com a sociedade (incluindo escola, grupo de amigos, trabalho), e
onde assume diferentes papéis para corresponder às expectativas dos outros.
Neste processo, as pessoas são descartáveis e substituíveis, em contraste com a
socialização primária, característica da Família, no seio da qual se aprendem
os valores, a moral e os modelos comportamentais, onde as relações são baseadas
no amor e nos vínculos, onde o indivíduo é insubstituível. Naturalmente que há
um grande interessado na secundarização da sociedade e na destruição da
Família: o sistema financeiro.
Apresentada
deste modo, essa imposição seria, desde logo, rejeitada pela sociedade
ocidental, fundada na ética judaico-cristã, na filosofia grega e no direito
romano. Mas não se assiste a essa resistência por dois motivos. Primeiro,
porque, numa perspectiva gramsciana, o erro é implementado paulatinamente e
propagado pelo sistema educacional e meios de comunicação social. Depois,
sentindo (aparentemente) garantidas a sua segurança e comodidade, os cidadãos
não vêem a ditadura de pensamento como uma ameaça.
Em
acréscimo, é imperativo que o erro seja transmitido desde tenra idade, antes da
formação da concepção do certo e do errado. Logo no ensino pré-escolar é
implementada a ideia de que a moralidade surge do próprio para o próprio,
segundo as suas regras pessoais, distanciando-o dos valores cristãos, que
estabeleceriam os limites na conduta, nas leis e na política. Dessa forma, o
indivíduo ficará facilmente permeável a novas ideias, incluindo aquelas
propulsoras dessa hegemonia, que anulam o próprio e a sua individualidade. Em
suma, a ideologia de género é isso: uma forma de anular o certo e o errado,
fugindo às leis naturais e transmitindo a ideia de que tudo surge do
pensamento, da vontade e do sentir. E haverá melhor forma de instalar essa
ambiguidade do que a destruição da identidade do indivíduo, levando-o a aceitar
os juízos dos que o rodeiam e instruíram, incluindo as escolas?
É
por isso que, actualmente, cada vez menos se valorizam os conteúdos a difundir
nas instituições de ensino, que passaram a ser um espaço de doutrinação, pela
disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, onde subliminarmente estão a ser
incluídos os princípios da Ideologia de Género, com vista à “educação das massas”.
E os pais, mais focados nas preocupações económicas, não se apercebem destas
movimentações ou simplesmente se demitem da responsabilidade de educar os
filhos, delegando na escola esse papel.
Nesse
percurso, algo mais grave acontece: os filhos passam a ser da responsabilidade
do Estado e não dos pais. Embora muito pouco noticiado, já não faltam episódios
a denunciarem-no: pais condenados a prisão na Alemanha, por impedirem os filhos
de assistir às aulas de educação sexual nas escolas (2009); na Noruega, os
filhos foram retirados aos pais por serem “muito cristãos” (2016); mais
recentemente, um pai cristão russo e residente na Suécia pediu asilo para sua
família à Polónia, após o Estado sueco entregar as suas filhas a uma família
muçulmana libanesa (2019); uma mãe espanhola
foi condenada a trabalho comunitário por esbofetear o filho que não queria
tomar duche (2019); e tantos outros exemplos.
Desta
forma, começa a instalar-se o receio dos pais educarem os filhos segundo os
preceitos e os costumes familiares da sociedade ocidental. Não será esta uma
forma de marxismo implementado pelo medo, que muitos teimam em rejeitar ou
relativizar?
Não
é por acaso que há quem se sinta fortemente ameaçado por conteúdos leccionados
nas escolas, activismos infiltrados nas instituições públicas, marcas de roupa
e séries televisivas com mensagens subliminares e tantas outras formas de
propaganda. Para os mais distraídos, menos informados e mesmo já manipulados,
tal não é mais do que “teoria da conspiração”, fundamentalismo e intolerância.
Infelizmente não é.
Outros,
mais alerta, apercebem-se desta realidade e surgem grupos* cada vez mais
organizados e políticos que ousam
fazer-se ouvir, fugindo do medo e do politicamente correcto. O travão a este
caminho ideológico só é possível com a participação cívica de todos os pais que
procuram uma sociedade melhor para os seus filhos e que acreditam no valor
inestimável das raízes judaico-cristãos do mundo ocidental.
O
combate em Portugal está só a começar. Todos estamos convocados.
Os
filhos são nossos, não são do Estado.
Médica, membro da Comissão Consultiva da TEM/CDS. A
autora não reconhece o AO 1990.
* Deixem as crianças em paz; Escola sem Partido de Portugal;
Identidade de Género, toda a
verdade; Plataforma Pensar & Debater;
Plataforma Renovar; Pontos nos II; Resistência contra a ideologia de
género e sexualização das crianças; Salvemos os nossos filhos.
Sem comentários:
Enviar um comentário