quarta-feira, 24 de abril de 2019

Quando eu partir



(O meu amigo morreu num trágico acidente. Não teve tempo para dizer adeus. Não disse adeus. E depois, eu estranhei, porque alguns dias a seguir à sua abrupta e inesperada partida, o mundo pareceu-me bastante indiferente à tragédia que o vitimou. E falo do mundo. Não das pessoas que sentiram forte a dor que a sua ausência deixou, muito embora, também essas, com o tempo, não o esquecendo nunca, lá vão vivendo, la se vão conformando. E depois pensei…O meu amigo, sou eu, o meu amigo é qualquer um de nós. Vamo-nos e o mundo continua…indiferente à nossa partida… Por isso, vale a pena aproveitar cada momento…).


E quando eu me for,
Quem vai proferir as minhas palavras?
Quem suportará a minha dor,
Quem da minha dor,
Com persistência, com ardor
Cuidará das minhas lavras?
Quem percorrerá os caminhos
Que me faltam fazer,
Quem, depois de eu morrer,
Dirá tudo o que me falta dizer?
Quem irá abraçar o mundo
Com esta mesma ânsia, esta vontade,
E num silêncio mudo, profundo
Tão profundo como a verdade
Que em meu peito não consigo guardar,
Pegará na minha voz,
Para, com a minha voz gritar…?
E o mundo…vai parar de girar
Porque eu morri?
Vai cair sobre si mesmo,
Vai-se desmoronar
Como se fosse esse o seu destino
Desde o dia em que nasci?
O vento, deixa de soprar?
A água que corre no rio, escoa,
E o rio vai secar?
As manhãs serão serenas
No bico do pássaro que a música entoa,
No seu melancólico despertar?
E a brisa que vem do mar,
Essa brisa que absorvo dentro de mim,
E me faz viver, e me faz acreditar,
E me transporta por outros caminhos sem fim,
Outros mundos, outras vidas
Que essa brisa me faz sonhar.
Essa brisa irá por cá ficar?
Como ficará o mundo quando eu morrer?
Corre a cortina porque a peça terminou?
Apaga as luzes depois do publico desaparecer,
Vai-se embora porque já cá não estou?
Vou-me embora e o mundo nem pestaneja,
Os dias morrem ao anoitecer,
E onde quer que eu vá, onde quer que esteja
Nascem de novo ao amanhecer.
E afinal, não passo de um sopro largado no tempo,
Vivo e quando vivo é esse o meu momento.
Estou…e deixo de estar,
E o mundo move-se, e o mundo gira,
E o mundo não vai acabar,
Porque do mundo a minha pessoa se retira.
O mundo não tem fim,
Mas tem a minha vida, o meu legado.
E ainda bem que é assim,
Pois se a minha vida não tivesse fim,
Estaria o mundo condenado.

António Magalhães - Sheffield - Inglaterra
(Possivelmente Poemas)

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