Helena Matos OBSERVADOR
Como sairemos disto? Provavelmente com
uma fuga em frente. Uma fuga que a precipitada saída de Pedro Passos Coelho
veio tornar possível. Que fuga é essa?
O alvo caiu: Luísa Maia Gonçalves
diretora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) foi afastada. O parecer
negativo do SEF à nova Lei de Estrangeiros nascida de um projecto do BE
colocara Luísa Maia Gonçalves (nomeada já por este governo para
aquelas funções) na lista daqueles que Costa teria de sacrificar
para continuar a ser primeiro-ministro.
A opinião dos técnicos deu lugar à
agenda ideológica e a discordância passou automaticamente a desobediência. Por
isso não interessa nada que o SEF tenha razão nos avisos que fez: a lei que
permite autorização de residência com “promessa de contrato de trabalho” faz
disparar os pedidos de visto no SEF. Só entre 11 e 18 de Setembro, deram
entrada 4.073 novos pedidos de visto.
O que conta é ter alguém naquele lugar
que equilibre as contas do deve e haver de António Costa com aqueles que
viabilizam o seu governo.
Não duvido por isso que nos próximos
tempos assistiremos ao afastamento de vários quadros da administração pública e
à crucificação mediática de algumas instituições e pessoas. Nem vai ser
necessário manifestar discordância como fez a ex-directora do Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras. Basta por exemplo questionar a razoabilidade da
obrigatoriedade agora instituída para as empresas com sete ou mais trabalhadores
– estamos a falar do café da esquina! – de implementarem um código de conduta
para proibir o assédio(legislação deste tipo só pode sair da cabeça
de quem nunca trabalhou a não ser no ramo do controlo da vida dos outros!) Ou
por exemplo não mostrar entusiasmo na aplicação da atabalhoada mudança
legislativa que legalizou as barrigas de aluguer cujo voluntarismo foi tal que
agora, como lembra o antigo
presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, Miguel
Oliveira da Silva, as comissões de ética de diversos hospitais confrontam-se com
consequências em que ninguém parece ter pensado.
O que conta é que quanto menos ganham
nas urnas, mais o BE e o PCP exigem em contrapartida a Costa.
Tudo isto leva-me a uma pergunta: como
acabará o governo de António Costa? Não, não estou a falar sobre os cenários
possíveis para o momento da ruptura – virá esta a tempo de António Costa ser
candidato às próximas presidenciais? Vão os maoistas e os trotsquistas
aglutinados no BE usar a estratégia adoptada em Novembro de 1975 por Cunhal e
deixar pendurados na rua os camaradas de há minutos?
Mas não, não é isso. Ou não é apenas
isso. Independentemente do final do governo de António Costa passar por estes
ou outros cenários, a realidade é muito mais complexa e leva-nos a uma pergunta
que nunca tem uma resposta tranquilizadora: como é que a extrema-esquerda vai
deixar o poder?
É dos manuais a agressividade que os
radicais mostram quando percebem que podem chegar ao poder: como esquecer o
nível chocarreiro que em Novembro de 2015 atingiu uma exasperada Catarina
Martins que a cada minuto em que Cavaco Silva não indigitava Costa como
primeiro-ministro via um obstáculo entre si mesma e o poder?!
Mas ensinam também os manuais e a vida
que a tenacidade desses mesmos radicais redobra quando temem perder o poder.
Por isso não posso deixar de sorrir que constato que o país publicado acredita
que um belo dia António Costa ou o PS se poderão desembaraçar facilmente destas
funestas companhias. Ou porque já não precisam delas. Ou porque as trocam por
Assunção Cristas ou Rui Rio, agora que Passos saiu de cena.
Desde que nos idos de 2015 vingou em
Portugal a tese da vacina que não lia tal dislate ou produto da má fé. Para
quem não recordar a tese da vacina lembro que sustentavam os autores da mesma
que Costa devia ser primeiro-ministro quanto antes apesar de ter perdido as
eleições porque assim mais rapidamente os portugueses ficariam esclarecidos
sobre os desmandos da extrema-esquerda. Os autores desta tese
sanitario-política esqueciam ou não queriam lembrar que se a extrema-esquerda é
eficaz na hora de conquistar poder é ainda mais aguerrida na hora de o
defender: mal se viram senhores da situação, os donos da indignação e da rua
retiraram-se dos piquetes, pararam de gritar, deixaram de sentir fome e já têm
dinheiro para medicamentos. De ambulâncias não precisam mesmo
quando estas estão paradas. A cada dia aumenta o preço do silêncio
que viabiliza o sucesso de Costa. E que faz dele um líder carismático e
ganhador, Que todos os dias anuncia um plano e repõe direitos.
Como sairemos disto? Provavelmente com
uma fuga em frente. Uma fuga que a precipitada saída de Passos veio tornar
possível. Que fuga é essa? A regionalização. Costa quer fazê-la e graças a ela
espera prolongar a sua vida como vencedor. Rio também aposta na regionalização
e espera que ela o reforce enquanto líder.
A regionalização não resolve nenhum dos
problemas que já temos e cria outros que bem podíamos dispensar.
PS. O processo-golpe
que está a ter lugar na Catalunha é um bom exemplo de como as velhas tácticas
dos radicais se adaptaram aos novos tempos: a sua presença nas instituições não
serviu para os tornar tolerantes mas sim para mais eficazmente imporem os seus
ditames de uma forma que os votos que receberam nunca permitiria. A outra
conclusão a tirar de tudo aquilo que está a acontecer em Espanha é que quando o
centro perde o rumo crescem os radicais. O que está a acontecer em Espanha só é
possível porque o PSOE se entregou nas mãos dos que gostavam de ser o Podemos.
Assim, o mesmo país que venceu a ETA graças ao Pacto de Ermua, que uniu
socialistas e populares no combate aos terroristas, agora não consegue uma
estratégia comum para tratar de Puigdemont na Catalunha.
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