sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Até para morrer é preciso ter sorte


BARROSO da FONTE
Nascer e viver são destinos de tudo e de todos aqueles que têm vida. Como as flores estiolam depois de embelezarem a natureza, assim as pessoas que se sucedem em circunstâncias que não conseguem controlar.
  Escrevo esta crónica num domingo soalheiro. O país está de luto. Não por morrerem  muitas pessoas. Mas por morrer Mário Soares. Não foi por castigo divino porque Deus não é vingativo. Nem por ser republicano, socialista e laico. Morreu porque o seu prazo de validade acabou aos 92 anos de idade. Até nesta sua última batalha foi feliz, porque nada lhe faltou. Teve tudo aquilo que era possível ter. Dignidade.
No momento em que dedilho estas palavras aparece no ecrã do computador, via Público, este dístico: «Soares morreu. Começa agora o combate da imortalidade».
Ora aqui está: não é preciso ser católico para se obter a imortalidade. O que é preciso é ter sorte. Mário Soares era filho do Padre João Soares. Nada lhe faltou na vida, a confirmar que «não custa viver, o que custa é saber viver». Mário Soares soube viver. E por isso vai ficar na História de Portugal. Só por coisas boas? Só por ser revolucionário? Só por ser honesto e pacífico?
 Antes que escorregue neste labirinto de congeminações satânicas, vou lembrar outras mortes que ocorreram no mesmo espaço temporal. De entre essas só outro nome mereceu destaque: Guilherme Pinto, Presidente da Câmara de Matosinhos. Todos os canais televisivos, nomeadamente aqueles que se dizem de interesse público, cerraram fileiras, mobilizaram todos os repórteres, rebuscaram todos os arquivos. De noite e de dia, desde as vésperas de Natal, talvez por todo o mês, todo o ano, todos os anos. E o mais que se verá. A imortalidade só agora começou...
No mesmo período temporal  morreram três ilustres vultos da cultura portuguesa: Mons. Ângelo Minhava, Padre Doutor João Ribeiro Montes e o Médico especialista Daniel Serrão. Três notáveis personalidades, cada qual a mais ilustrada e todas Transmontanas.
 Não tiveram as televisões que nos martirizam o corpo, a alma e a bolsa, uma palavra que fosse, a lembrar esses desaparecimentos.
Para tudo é preciso ter sorte.  Até para morrer.
Mário Soares foi, inegavelmente, um Homem diferente, destemido, culto e frontal.
Na qualidade de diretor do Paço dos Duques de Bragança, durante cerca de seis anos, recebi-o três vezes nesse Monumento Nacional que funciona como residência oficial do chefe do Estado no norte do País.
Já antes, em 1986, como vereador da Câmara, eu tinha contribuído para aí se realizar a primeira «semana aberta». O executivo era social democrata. Carneiro Jacinto era o jornalista da Presidência. Falou comigo para auscultar se uma Câmara diferente da sua cor, receberia bem essa experiência presidencial. Passou-se esse dialogo com aquele jornalista na Pousada de Santa Marinho da Costa em 24 de Junho. Ainda nesse espaço de tempo, falei com os vereadores da oposição: CDS (Carlos Costa), PS (Manuel Ferreira), CDU (Capela Dias). Que sim senhor. Avançou-se e a experiência que permitiu a Mário Soares, levar a efeito, outras semanas abertas em várias cidades do País. Conservo no meu espólio uma carta de agradecimento de Mário Soares pela maneira como foi benéfico  o meu contributo.
Nada de pessoal me permite censurar o chamado «pai da democracia portuguesa», em quem votei na sua reeleição para a PR, quando concorreu contra Salgado Zenha. O que pasmo é ver e ouvir, chorões e choranas, - verdadeiras poltronas - desta carpidaria-mor do reino.
                                                

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