Amigos dizem-me que vão para o Algarve e encolho os ombros. Conhecidos dizem-me que vão para a Sardenha e adormeço a meio da conversa. Desconhecidos dizem-me que vão para as Maldivas e pergunto-lhes a que propósito falam comigo. Tudo somado, o único destino turístico que me suscita inveja é o lugar onde se realiza o acampamento de jovens do Bloco de Esquerda.
O
acampamento, cito artigo do Público (título: "A ideia de que o mundo pode
ser melhor cabe numa tenda"), realiza-se há 13 anos e, pasme-se, "tem
uma filosofia". Os acampamentos que frequentei na adolescência mal tinham
água quente. Para cúmulo, chama-se Liberdade, nome lindo e revelador de
"uma realidade alternativa, livre de opressões". Presumivelmente, o
nome é também irónico, visto que aquele espaço sem proibições proíbe uma data
de coisas: "sexismo, machismo, homofobia, transfobia, racismo,
xenofobia", diz ao Público a militante Ana Rosa, "de voz serena mas
segura, e uns olhos castanhos rasgados".
Outra
coisa que o Liberdade proíbe é confusões na casa de banho. Embora admitindo que
"a política também passa pelo WC", trajecto que sempre me pareceu
evidente, o acampamento abandonou a experiência de balneários mistos. Razão?
Uma rapariga não gostou que os rapazes, quiçá heterossexuais infiltrados,
olhassem para ela. O infortúnio não impede o BE de sonhar com a mistura, dado
que – continuo e continuarei a citar o Público até que os dedos me doam – o
objectivo é "desafiar os papéis de género e os pudores". Ou, nas
palavras de Ana Rosa, a dos olhos rasgados, "não faz sentido ter casas de
banho binárias. A separação homem/mulher é extremamente redutora".
Se
calhar é por isso que o BE separa a espécie em inúmeras fracções, resumidas na
breve sigla LGBTQIA+ (o "+" é para o que calhar). Caso o próprio
Liberdade levasse isto a sério, precisaria de 30 bonequinhos diferentes só para
as portas dos lavabos. Felizmente, as questões LGBTQIDPVWNA+ ficam limitadas às
festas e às DJs, exclusivamente "mulheres ou mulheres trans género" ("músicas
com letras machistas" serão censuradas). E aos estimulantes debates, que
cobrem ainda temas como: praxe (todos contra), precariedade (todos contra),
tratados europeus (todos contra), Descobrimentos (todos contra) e drogas (todos
a favor).
Porém,
o melhor do Liberdade são sem dúvida os jogos. "Há um em que duas pessoas
do mesmo género (binário ou não) trocam uma laranja com o pescoço –
‘Normalmente cai. É um desastre sempre, mas é divertido.’" Divertido é
favor. E há o "comboio de massagens", "gestos muitas vezes
sexualizados" que conseguem, "de forma pacífica e sem obrigar ninguém
a nada, desconstruir algumas ideias". Prevejo que, de desconstrução em
desconstrução, o Liberdade tenha um final feliz.
A
palavra a Ana Rosa, os olhos já fora das órbitas: "No acampamento
construímos um pouco a realidade que queremos", e que, com a ajuda do dr.
Costa, tentam impor às massas a benefício destas. Resta informar que este Verão
o Liberdade decorre em Oliveira do Hospital, decerto psiquiátrico. Não imaginam
a pena que tenho em não ser jovem. Nem doido varrido.
O
BOM
Incentivos
Desculpem
o paroquialismo, mas em Matosinhos, onde vivo, a autarquia decidiu fazer uma
"ciclovia" que percorre cada rua e beco do município. A ideia é feliz
(incentivo ao exercício). As vantagens adicionais são o caos no trânsito
(incentivo à ecologia), a abolição do estacionamento (incentivo à mobilidade),
os passeios para peões com 20 cm de largura (incentivo à dieta), a falência do
escasso comércio (incentivo à poupança) e a confirmação de que o poder local
rivaliza com o central em prepotência e idiotia (incentivo à emigração).
O
MAU
O
gato de Barcelos
Lembram-se
da criancinha portuguesa que, simbólica e pura, confortou um francês na final
do Euro? Lembro-me também da comoção colectiva que o episódio decretou, embora
fosse evidente que havia ali encenação ou, no mínimo, gato. Entretanto, o
adepto em causa ganhou umas férias em Portugal pagas pelo contribuinte e a
família da criancinha exige 50 mil euros para perpetuar a brincadeira. É um
golpe no amor-próprio de todos nós, convencidos de que, mesmo falsa, a
inocência do "pequeno Mathis" também nos contagiava.
O
VILÃO
Direito
ao silêncio
Na
televisão, um psicólogo produz afirmações genéricas sobre os ciganos, aliás
próximas da vox populi. Resultado? Catorze associações chamam-lhe perigoso
racista. Tudo estaria bem se a coisa se ficasse pela discórdia e pelo insulto.
Mas não fica: a ideia é acusar o homem de um crime e, claro, expulsá-lo do
programa em que participa. Sempre que o "argumento" de um dos lados
se resume ao esforço para calar o adversário, não custa perceber quem venceu o
"debate". E que o perigo real são os defensores dos direitos que não
toleram nenhum.
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