José
António Saraiva – jornal Sol
O
acordo à esquerda não serviu os interesses do país: serviu os interesses de
António Costa e do Partido Socialista
Durante
muito tempo discutiu-se a ‘legitimidade’ desta solução de Governo apoiada pelo
PCP e pelo BE.
«É ou não é legítima?» – perguntava a
esquerda, irritada com as críticas da direita.
Ora
a questão não era a legitimidade: a questão era saber se seria uma solução boa
ou má.
Ou
seja, era saber se seria melhor o PS juntar-se às esquerdas ou aliar-se ao
PSD e fazer um bloco central.
Do
ponto de vista estrito do PS, essa solução era pior – pois António Costa não
seria primeiro-ministro, mas sim Passos Coelho.
Quando
se realizaram as eleições de 4 de Outubro, a situação era esta:
–
O PIB estava a crescer;
–
O investimento estava a crescer;
–
As exportações estavam a crescer;
–
O desemprego estava a diminuir;
Ora,
tendo isto em conta, qual seria a atitude certa?
Obviamente,
prosseguir no mesmo caminho.
«Em
equipa que ganha não se mexe», lá diz o adepto de futebol.
Mas,
para isso, era preciso António Costa aceitar ser vice de um Governo PSD/PS (ou
então, deixar passar o Governo minoritário PSD/CDS).
Assim,
seria garantida, no essencial, a continuidade das políticas que tinham começado
a dar frutos.
Seria
este o interesse do país.
Mas,
como desse modo não seria primeiro-ministro, António Costa fez exatamente o
contrário: celebrou uma aliança contranatura com as esquerdas, a qual obrigou o
Governo a reverter as medidas e as decisões tomadas pelo Executivo anterior e a
iniciar um caminho completamente diferente.
A
justificação era acelerar o crescimento económico.
Mas
o objetivo escondido era outro: permitir que António Costa fosse
primeiro-ministro.
– O PIB abrandou o crescimento;
–
O investimento caiu bastante;
–
O desemprego não caiu e até cresceu ligeiramente;
–
Os juros da dívida subiram.
António
Costa diz que as coisas estão a correr como previsto.
Então
ele previa que todos os indicadores piorassem em relação ao Governo PSD/CDS, ao
Governo da austeridade, ao Governo que a esquerda incensava como o pior desde o
25 de Abril?
Dir-se-á
que o consumo interno cresceu.
Mas
isso é bom – ou será um facto perverso?
É
que o aumento do consumo leva ao aumento das importações, à diminuição da
poupança e à consequente diminuição da liquidez dos bancos.
Os
países ricos são os que exportam muito e não os que importam muito.
Uma
coisa já não é possível esconder: a situação está bastante pior do que estaria
caso o país tivesse continuado no mesmo rumo.
Ou
seja, se o PS tivesse feito um acordo com o PSD ou tivesse viabilizado o
Governo PSD/CDS.
O
acordo à esquerda não serviu os interesses do país: serviu os interesses de
António Costa e do Partido Socialista.
Na
prática, António Costa usou o país para ter a vaidade de ser primeiro-ministro
e de o seu partido ser poder.
Esta
é a verdade nua e crua.
Sanções,
por que não?
Devo
ser o único português a defender esta posição, mas procuro sobretudo ser
coerente comigo próprio.
A
direita e a esquerda, o Presidente da República e o primeiro-ministro, estão
juntos no objetivo de rejeitar o pagamento de sanções pelo não cumprimento do
défice de 2015.
Compreende-se:
a direita foi responsável por ele e a esquerda teria de o pagar.
Mas,
para lá destas razões interesseiras, ainda não vi qualquer argumento racional
contra as sanções.
Basicamente,
diz-se que o Governo de Passos Coelho fez o que a troika mandou – e, se a
receita não deu resultado, a culpa é da troika e não de Portugal.
Depois
adianta-se que o pagamento de sanções seria «contraproducente» para os
interesses de Portugal e da própria União Europeia, na medida em que
prejudicaria o nosso crescimento.
Ora,
é preciso dizer que Portugal não fez bem o que a troika mandou: basta pensar
nos cortes chumbados pelo TC, que a terem sido feitos seriam mais eficazes na
redução da despesa e no controlo do défice. E isto para não falar nas reformas
estruturais, que ficaram muito aquém do acordado.
Em
segundo lugar, a responsabilidade das medidas é sempre dos governos nacionais e
não da troika.
A
troika pode sugerir medidas – mas a última palavra é do Governo, que tem a
possibilidade de aplicar receitas alternativas, desde que teoricamente
passíveis de obter os mesmos resultados.
Portanto,
a responsabilidade pelo incumprimento do défice é sempre de cada Estado.
Quanto
às sanções serem «contraproducentes», pergunto: elas não constam de um tratado
que todos assinaram?
E
só agora vêem isso?
Agora
é que passaram a ser contraproducentes? Antes não eram?
A
questão tem de ser posta ao contrário: para que serve o Tratado Orçamental se
as sanções continuarem a não ser aplicadas?
Se
as sanções forem constantemente adiadas ‘para melhor oportunidade’, todos os
países se sentirão à vontade para não cumprir o Tratado – e nunca mais será
possível aplicá-lo.
E
isto, a prazo, fará rebentar a UE, porque uns Estados não quererão
indefinidamente continuar a pagar os défices dos outros.
Portugal
não devia, pois, querer um tratamento de favor: Portugal deveria ter por
objetivo cumprir anualmente os défices, dispondo-se a pagar quando tal não
fosse possível.
E
deveria exigir para os outros países o mesmo tratamento.
Doutra
forma, a União Europeia não terá qualquer futuro.
E
nós também não.
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