sexta-feira, 24 de junho de 2016

Credibilizar a Caixa Geral de Depósitos



Maria Luís Albuquerque  | Jornal de Negócios

O PSD avançou com uma comissão parlamentar de inquérito ao processo, em preparação, de recapitalização da CGD, depois de não obter o acordo dos restantes grupos parlamentares.

Questionámos repetidamente o Governo face ao que veio a público: se estaria em curso um processo de negociação com a Direção-geral de Concorrência da Comissão Europeia para injetar no banco público uma verba de 4 mil milhões de euros. Tal montante seria exigência da nova equipa de gestão da CGD.
Muito se escreve e diz sobre a iniciativa do PSD, e muitas das críticas alegam que o PSD não pode desconhecer o que se passava na CGD. É verdade. E é precisamente por o PSD não desconhecer o que se passava até ao final de novembro de 2015, que queremos saber porque é pedido aos portugueses um esforço tão significativo - 4 mil milhões de euros - para a recapitalização do banco público?
Há quem receie que um escrutínio parlamentar fragilize a CGD, opinião expressa entre outros pelo PCP, que até hoje nunca demonstrou qualquer pejo no escrutínio a instituições financeiras, bem pelo contrário. O PCP receia mais uma demonstração de que a qualidade da gestão é uma qualidade em si mesma: não depende de ser pública ou privada. Sendo que a gestão pública é claramente um tema a escrutinar pelos cidadãos a quem, em última análise, tal gestão deve prestar contas.
Quanto ao óbvio desconforto do Governo com a iniciativa do PSD, não serão certamente razões ideológicas que o explicam. O Governo tenta lançar outras supostas auditorias, avaliações, relatórios de análises passadas, como alternativas - preferíveis, segundo defende - à realização da CPI. O que tenta o Governo esconder que, nas palavras do próprio primeiro-ministro, só pode ser revelado quando for um facto consumado?
Por cá e em Bruxelas comenta-se que o Governo tenciona integrar o Novo Banco na CGD. E há rumores de que uma recusa de Bruxelas poderia fazer cair o Executivo. A questão a colocar é saber porque estariam os portugueses dispostos agora a pagar para suportar a geringonça, depois da fraude eleitoral.
Não sabemos a verdade sobre este dossiê "integração", mas normalmente não há fumo sem fogo… E, a confirmar-se, em que termos tal seria feito? O Novo Banco não é público, não pertence ao mesmo dono que a CGD. Seria comprado? A que preço? Seria nacionalizado? Com ou sem indemnização? Será que é intenção do Governo fazer recair o custo da resolução do BES sobre os contribuintes, quando a forma como o processo foi conduzido se destinou precisamente a protegê-los? São questões que precisam de resposta.
E uma tal solução, seria aceite pelas autoridades que zelam pela concorrência, nacional ou europeia? Os dois bancos em conjunto ficariam com uma posição de mercado excessiva. A menos que o plano de restruturação fosse de tal modo agressivo que resultasse, na prática, no desaparecimento do equivalente ao Novo Banco, ou perto disso. Quantas pessoas perderiam o emprego? São questões que precisam de resposta.
É público, há anos, que a CGD concedeu créditos avultados no passado, sem garantias adequadas e com práticas dificilmente justificáveis com o interesse público. Discutir será um exercício muito útil de escrutínio que, não apagando os erros do passado, e as suas consequências, diminui a probabilidade de se repetirem. Estranho é o argumento que a exposição de tais práticas prejudica a credibilidade da CGD. Mas o que é que não se sabe já? Que capitais privados fugiriam da CGD (não tem capitais privados)? Que cotação da CGD cairia em bolsa, se não está cotada? Ou seriam os depositantes a retirar os seus depósitos? Para colocar onde, quando a CGD tem sido o principal beneficiário com as preocupações que surgiram no passado relativamente a outros bancos? E, sobretudo, como é que a especulação e a falta de transparência podem contribuir mais para a solidez e reputação de um banco do que o seu escrutínio sério e democrático?
Ouve-se também dizer que é preciso "limpar" a CGD dos créditos malparados e dos ativos sobrevalorizados no seu balanço. Muito bem. Mas em que termos? Uma vez registada uma perda a 100%, vai a gestão da CGD perdoar essas dívidas, no todo ou em grande parte? Vão os contribuintes portugueses pagar para que grandes devedores possam pagar as dívidas junto dos outros bancos? Temos o direito de saber. Os devedores que estão aqui em causa não são os cidadãos comuns que por terem perdido o emprego ou serem vítimas de uma doença grave deixaram de ser capazes de pagar. São grandes empresas e empresários que muito ganharam no passado com a proximidade ao poder político.
Há muito para apurar numa comissão de inquérito parlamentar à CGD. Antes das decisões tomadas e dos factos consumados. As comissões de inquérito não servem apenas para fazer autópsias ao que correu mal: podem e devem servir para evitar o mal.

Vice-presidente e deputada do PSD

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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