Barroso da Fonte
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Os cidadãos pagam nas faturas da luz, as
taxas da rádio e dos canais de serviço público e, em vez de serem formados e informados,
como a deontologia obriga, são comidos por lorpas, nos canais generalistas e
nos temáticos. As televisões, todas elas, transformaram-se em comícios
permanentes de baixa política e de anti-desporto. Quem não liga importância ao
futebol e apenas tem os quatro canais
generalistas é obrigado a engolir, como guloseima, aquela vozearia infernal,
quer nos debates sobre políticos quer dos boleiros que fazem das suas
preferências clubísticas, tal como na política, algazarra selvática.
Esta algazarra que mais lembra o tempo da
barbárie, vem-se agudizando. E as consequências desta bandalheira têm de ser
reconhecidas como causa primeira do caos social, laboral e ético que, nestes
quarenta anos de democracia, transformaram o ambiente cívico numa verdadeira manta
de retalhos. Os assaltos, os crimes de sangue, a agressão familiar, a
desobediência nas escolas, o desemprego, as falências, a desorientação na
justiça, são efeitos crescentes da concorrência desleal desses meios
audiovisuais. É o exemplo da campanha para as presidências. Como não houve
acordo partidário para uma distribuição séria, coerente e civilizada dos tempos
de antena, entrou-se num caos. Esse caos
viu-se num debate radiofónico em que além dos dez candidatos, levaram, cada um,
um enxame de comissários, de apoiantes e de costureiros que mal cabiam no salão
especial preparado para esse fim. E esse cenário tem-se repetido diariamente
nos canais televisivos, mais parecendo o ofertório para o Bento da Porta Aberta
ou a distribuição da sopa nas cantinas da Santa Casa da Misericórdia.
Tal cenário já se vira
na entrega das assinaturas de cada um dos dez candidatos. Eles próprios fazem
questão em mostrar quem mais legos faz com as pastas, que comissões de apoio
têm e os pesos pesados em que se estriba cada um. Aquela que o Tino de Rans
mostrou ao pegar e transportar no cesto das vindimas, as folhas de papel com os
nomes dos seus apoiantes, ficará na retina de quem já não tem paciência para
tanta lata. A democracia, para ser um regime político decente, dispensa bem
estas gabarolices e máscaras carnavalescas.
O tipo de debates que temos vindo a visionar pela televisão é o espelho do
miserabilismo intelectual, moral e cívico que trespassa a sociedade portuguesa.
Este miserabilismo que a candidatura revela, contrasta com o aprumo, a
sumptuosidade e o prestígio virtual que o eleito, seja ele qual for, vai exibir
nos atos cerimoniosos das paradas militares, dos discursos patrióticos e das
posses formais dos titulares dos cargos nacionais e internacionais.
Escrevo esta crónica, imediatamente a seguir, ao debate na SIC entre Sampaio da Nóvoa e Rebelo de Sousa. Esperava ver, pela primeira vez, uma postura de Estado, um diálogo afável, uma conversa decente. Fiquei desiludido. São ambos catedráticos. Bastaria isso para dignificarem o estatuto mais elevado da carreira académica. Foi grande o meu desencanto. Ao Marcelo já conheço há 40 anos. Pretendia conhecer o ex-Reitor de uma das mais qualificadas universidades Portuguesas. O que vi? Um vulgaríssimo opositor ao «tempo velho» e um futurível Lenine do «tempo novo». Bastou-me o «argumentário» ressabiado do inexperiente político para decidir o meu voto. Talvez saísse por cima do opositor, se o debate incidisse sobre a gestão universitária. Disso saberá menos Rebelo se Sousa. Mas querer impor autoridade na legislação, no secretismo entre partidários (que nalguns casos é institucional), nas reuniões do Conselho de Estado, na elaboração das leis, nos acordos que se fizeram no tempo do PREC, em que Nóvoa mergulhara e, a custo, se foi afastando, é «argumentário» muito familiar desse candidato, mas muito desajustado da realidade política. Na política é recomendável que se comece pela colagem de cartazes, se passe pela junta de freguesia, pela Câmara, pelo governo e pelo Parlamento. É como na tropa. Não se entra como general, mas como soldado raso. Uma casa não se começa pelo telhado.
Estudei para Mestrado – e sei que ele tem a
tese que publiquei -Alberto Sampaio, autor das Vilas do Norte de Portugal.
Nasceu, bem como o irmão, José da Cunha Sampaio, no mesmo ano, nesta cidade em
que vivo. Com Antero de Quental, os três fundaram, em Coimbra, a Sociedade do
Raio, com o intuito de destituir o Reitor daquela Universidade. Foram todos
expulsos. Mais tarde voltaram e ficaram na História. Este candidato é seu
descendente e cheguei a pensar nele para meu candidato. Fiquei desiludido.
Talvez, por ser mais velho, sou pelo «tempo», do «antes» e do «depois». Sou do
país e do «tempo» em que Afonso Henriques, aqui, onde Sampaio da Nóvoa nasceu,
naquela «Primeira Tarde Portuguesa» de 24 de Junho de 1128 se travou a Batalha
de S. Mamede. Eu prefiro a companhia de quem ao longo de 41 anos defende essa
pátria cujo primeiro passo foi dado há 888 anos. Chama-se Portugal e tem uma
História rica e invejável. Espero que o novo Presidente da República reconheça
este país que tem 888 anos de um tempo velho e novo e por muitos anos.
Barroso da Fonte
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