Os comentários sobre a
Grécia atingem o limiar da cretinice. Os que nada sabem chegam a alvitrar que
os Gregos são uns malfeitores. Não são. Os governos recentes cometeram erros ao
não executar reformas, mas os erros corrigem-se. Ninguém, por errar, pode ser
considerado um malfeitor.
A Grécia moderna viveu
séculos sobre o domínio Otomano, um sistema despótico e corrupto. Quando no
século XIX se tornou independente (com a ajuda da Europa, mais concretamente da
Inglaterra, a grande potencia à época) não se livrou do sistema corrupto.
Formou um Estado que não era Estado, mas sim a coutada de alguns. Para piorar a
situação, ao não formar um Estado moderno com instituições credíveis, permitiu,
nestes últimos 50 anos, que os corruptos mandassem no país como numa quinta
sua. E quando entraram para a Comunidade Europeia, as instituições europeias
permitiram que o regabofe continuasse, com os escândalos políticos do PASOK
instalado no poder. Poderiam ter travado a tragédia, mas não o fizeram. E ao
não o fazerem contribuíram para toda esta miséria.
Poderemos enganar-nos,
mas é a primeira vez que estamos com o Doutor Varoufákis. Não com as ideias do
seu partido, mas com o sentido político do referendo. Apresentou três razões
credíveis para não assinar o acordo, sendo a primeira a que mais ressalta aos
espíritos humanistas: As medidas que o governo grego tinha de implementar
imediatamente eram recessivas e afectavam os gregos com menores rendimentos.
E a Europa devia ter a
vergonha que não tem. Não apenas em relação aos Gregos, mas a todos os povos
obrigados aos programas de profunda austeridade. Uma coisa é pagar-se o que se
pode, outra é ser obrigado a pagar o que se não tem. Sobretudo porque o sistema
legal criado pelos países europeus (como Portugal), na última década, é
manifestamente defeituoso (em certos casos corrupto). Não serve o bem comum,
mas apenas alguns. Os exemplos são conhecidos de todos. Banqueiros que
arruinaram economias de nações, e andam por aí; administradores que arruinaram
empresas públicas e ainda receberam indeminizações de milhões; crápulas que
prestam um serviço público de favoritismo, usando as estruturas públicas de
forma autoritária, promovendo a corrupção, prejudicando profissionais de mérito
e, portanto, o próprio Estado; as multinacionais fogem aos impostos
impunemente, ao criar empresas-fantoche em paraísos fiscais, deixando a carga
fiscal a cargo dos cidadãos dos países onde foram buscar os seus lucros. O
mesmo acontece com os muito ricos.
O Governo grego ao
propor ao povo que o elegeu um referendo, sobre o acordo, merece o nosso
respeito. Como há 2500 anos, os Gregos manifestam a sua originalidade. À política
o que é da política, à economia o que é da economia (ao dinheiro o que é do
dinheiro). Demócrito (456-370? a. C.), dizia com propriedade: “Ganhar dinheiro
não é coisa inútil, mas se se alcança com injustiça é o pior dos males”. E a
Tales de Mileto (640-548 a. C.), atribui-se o seguinte aforismo: “Evita
enriquecer por vias desonestas”. Ora esta Segunda-feira à custa da miséria
grega fizeram-se fortunas colossais.
Não sabemos no que vai
dar o referendo grego. Poderão escolher assinar o acordo (que é o desejável se
reformulado e como as recentes sondagens indicam), mas poderão optar pelo
contrário. Se optarem pelo contrário sairão da Comunidade. Ficarão isolados?
Talvez não. Mas tornam-se livres para reger o seu destino e quiçá os promotores
de uma nova ordem mundial económica. Fizeram-no no Verão do ano de 480 a.C.,
nas Termópilas, perante o poderoso exército persa de Xerxes.
É que esta economia
global que tem sido vendida ao comum dos mortais, parece ter os dias contados
na visão de muitos especialistas na matéria. Todos os grandes motores da
economia mundial estão com problemas: a China, Angola, Brasil …
Dir-nos-ão alguns que
estamos contra corrente. Bem o sabemos. Sabemos do exemplo da Argentina, que
não é exemplo nenhum. Hoje sabe-se, ou julga saber-se da origem das grandes fortunas
argentinas, incluindo a da sua presidente. E os grandes acontecimentos que
formaram o Mundo foram todos contra corrente porque tinham como objectivo a
liberdade. Pelo contrário, é facilmente verificável que aqueles que se deslocam
a favor da corrente, em determinadas ocasiões, navegam em águas pantanosas e
lúgubres.
Armando Palavras
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