18 de Janeiro de 2022
por Santana Castilho*
"Sabemos que nos mentem. Eles sabem que nos mentem. Eles sabem que nós sabemos que nos mentem. Nós sabemos que eles sabem que nós sabemos que eles nos mentem. E, mesmo assim, eles continuam a mentir."
Alexander Solzhenitsyn
1. A inesperada maioria absoluta do
PS trouxe à governação o cheiro da decadência. Na Educação, a descolagem da
realidade tornou a área nauseabunda. Para quem já viveu a implosão do
guterrismo e do socratismo, a situação presente prenuncia fim idêntico.
Infelizmente, o debate sobre as
questões da Educação só ocorre sob ondas de alarme e de urgência, quando as
coisas começam a descambar gravemente e a paz podre fica ameaçada. É nessa
altura que os políticos habilidosos acordam.
Considerando que os pré-avisos das greves em curso foram enviados
com a antecedência legalmente prevista, a haver algumas objecções ou dúvidas,
era nessa altura que deveriam ter sido levantadas. Porquê só agora o Governo
pede pareceres sobre a sua legalidade? O que podiam e deveriam ter feito os
habilidosos António e João Costa, durante sete anos, tantos quantos levam de
governo, para, com tempo, e não agora, que os professores se levantaram do
chão, evitar os prejuízos aos alunos e às famílias, que hoje invocam para, uma
vez mais, tentar virar a sociedade contra os professores?
2. Na intervenção de abertura de uma
audição na Comissão Parlamentar da Educação, João Costa afirmou que “o Governo
nunca propôs qualquer processo de municipalização do recrutamento de
professores”. Tem razão o manipulador. O que o habilidoso propôs foi que,
depois de recrutados os professores e colocados em “mapas intermunicipais”,
seriam conselhos locais de directores, funcionando sob tutela de Comissões
Intermunicipais e substituindo a graduação profissional e as preferências
legitimamente manifestadas pelos candidatos por “perfis de competências” por
eles concebidos, que definiriam os locais de trabalho dos novos escravos. Ou
seja, o artista escolheu um trilho bem mais sinuoso, para chegar ao mesmo
resultado, isto é, desvirtuar completamente o actual modelo de concursos. Este
ministro é o cérebro duma pedagogia que substituiu ciência por crenças, que
excluiu em nome da inclusão, que trocou rigor por facilitismo e que transformou
um edifício sério num bazar de bugigangas. Este ministro é um criador de
burocracia doentiamente controladora, que há sete anos vem,
laboriosamente, escravizando os docentes portugueses.
O aceno patético aos manifestantes,
em Coimbra, o discurso fantasioso aos directores, na Maia, ou a réplica ao que
Sampaio da Nóvoa escreveu, certificaram um ministro definitivamente imprestável
para gerir o caos que criou e incapaz de perceber que os protestos actuais são
geneticamente diferentes dos anteriores.
3. O primeiro-ministro disse que os
protestos resultam de “muito erro de percepção”, porventura de “uma
contra-informação grande através da rede WhatsApp, dizendo que os presidentes
de câmara é que passavam a contratar os professores, o que é absolutamente
mentira”. “Quanto ao pessoal docente não há nenhuma competência a transferir
para as câmaras. Isso é uma falsidade total”, também disse.
O erro é de percepção ou do que está
escrito na Resolução do Conselho de Ministros n.º 123/2022, de 14 de Dezembro?
Se lá está atribuída às CCDR (que resultam da vontade dos presidentes das
câmaras) a incumbência de “acompanhar, coordenar e apoiar a organização e
funcionamento das escolas e a gestão dos respetivos recursos humanos e
materiais, promovendo o desenvolvimento e consolidação da sua autonomia “, a
que devemos dar crédito? Ao que escreveu ou ao que disse António Costa?
E disse, ainda, ser essencial mudar um modelo de concurso que faz com que os professores andem “anos e anos com a casa às costas” até se vincularem. Que cara dura! Se assim pensa, por que nada fez durante os últimos sete anos?
4. A nota enviada à comunicação
social pela Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), apelando ao
Governo para que decrete, “com urgência, serviços mínimos e adequados a que os
alunos possam permanecer no interior da escola em condições de segurança e com
o direito à refeição”, merece um esclarecimento.
Não existem serviços mínimos em Educação. Já uma vez foram ilegalmente decretados, mas o Tribunal da Relação reconheceu o abuso.
*Professor do ensino superior
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