JORGE LAGE
É um «Remanse an Mirandés», de Faustino
Antão, autor que tem dado contributo à divulgação da língua Mirandesa e foi
estimulado pelo já falecido Amadeu
Ferreira. O livro de Faustino Antão, em
formato de bolso, ilustrado por Susana Antão, tem 142 páginas, abrangendo 47
capítulos, que se lêem com gosto e paixão. Afinal, até à construção das
barragens no Douro superior, entaladas entre as arribas deste mítico rio, o Planalto
de Miranda foi uma realidade antropológica e linguística bem distinta do
rectângulo lusitano, iniciando-se, depois, o percurso inverso rumo à
globalização, que tritura e descaracteriza as nossas culturas locais, incluindo
a linguística. Esta variante
linguística, que julgo assentar no muito antigo falar ibérico fortemente romanizado,
recebendo influências do castelhano, do leonês e do português arcaico. Aliado
desta minha convicção está o facto de ainda encontrar pessoas de idade
avançada, nos concelhos de Chaves, Vinhais, Mirandela e Macedo de Cavaleiros
que conservam muitos vocábulos do Mirandês. Este facto senti-o aquando da
pesquisa e recolha no terreno para o livro, «Mirandela Outros Falares» e ainda
dos livros «Memórias da Maria Castanha» e «Maria Castanha Outras Memórias». Seja
como for, a existência do Mirandês como língua minoritária, ao contrário do que
possam pensar e escrever alguns «donos da língua» de Camões e Pessoa, a
diversidade linguística de região para região, de tema para tema, bem como a
língua minoritária Mirandesa, devem tornar-se como generosas fontes de
enriquecimento. Voltando ao «Remanse an Mirandés», «La Galhega», apresenta-se
de uma roupagem vocabular riquíssima, com um enredo e acção que nos estimula
para lermos mais e mais, fazendo-me lembrar a alegoria do burro e da cenoura. O
«romanço» tem como centralidade Miranda e o Planalto Mirandês e a construção da
barragem entalada na garganta das arribas, gerando desenvolvimento local e
atraindo as mais variadas gentes, como a Galhega (Ourora), refugiada das turbulências
libertadoras sul-americanas e a Herculana, zorra atirada para a roda da vida.
Vale a pena ler este livro que, também, é uma grande lição critica a muito do
farisaísmo cristão e para que não restem dúvidas, até o padre vai visitar aquela
que vende o corpo para criar o filho e sobreviver. Os meus parabéns ao Faustino
Antão, natural de «Zenízio», pelo belo livro em «Mirandés» que nos dá e que honra
Miranda do Douro e a sua língua, mas merecia um tipo de caracteres um pouco
maior e ter saído com ISBN.
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