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“Quando vedes aparecer uma nuvem no poente, logo dizeis que vem chuva, e assim acontece. E quando vedes soprar o vento sul, dizeis que haverá calor, e assim acontece. Hipócritas, sabeis interpretar o aspecto da terra e do céu e, entretanto, não sabeis discernir esta época?” Lucas 12, 54-56.
João José Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador (Ref.)
13/04/19 |
Note-se que se conseguiu,
então, pelas medidas tomadas limitar os infectados a 320 casos, de que
resultaram 132 mortos.
Foi o notável médico,
investigador, higienista e Professor de Medicina, Ricardo Almeida Jorge (Porto,
9/5/1859 – Lisboa, 29/7/1930) que caracterizou a epidemia e recomendou as
medidas a tomar, não se livrando de ser apedrejado por portuenses, naturalmente
atingidos pela fome, devido à falência temporal do comércio.
Outro médico célebre
higienista, Professor e pioneiro da Bacteriologia, Luís da Camara Pestana
(Funchal, 28/10/1863 – Lisboa, 15/11/1899), que estudou a doença, acabou por
ser infectado e perder a vida após fazer a autópsia a um cadáver atingido pelo
bacilo.
O Rei D. Carlos, que
entre muitos outros atributos, era um homem destemido e nunca abandonou o seu
“posto de sentinela”, visitou-o no hospital.
Foi esta epidemia e suas
consequências que deram origem à primeira tentativa de organização de saúde
pública, em termos modernos, entre nós, até então praticamente entregue às
Misericórdias e Institutos Religiosos.
O cordão sanitário foi,
na altura, garantido por cerca de 2.500 homens (na altura não havia mulheres na
tropa, certamente para desgosto do actual Ministro da Defesa) dos Regimentos de
Infantaria 3 (Viana do Castelo); 20 (Guimarães), de Cavalaria 6 (Chaves) e 10
(Aveiro), e passava por Leça da Palmeira, Ermesinde, Valbom, Avintes, Valadares
e Gaia.
Nesse tempo a “tropa”
complementava ainda, as autoridades públicas, que distribuíam sopa, fornecendo
o “rancho”.
Porque estamos a referir
isto?
É simples: apenas para
ilustrar que o Exército Português não tem hoje, capacidade de fazer tal coisa!
Em primeiro lugar porque
as unidades referidas já não existem, e as que as podiam substituir no Norte,
ou seja os Regimentos de Infantaria de Chaves, Vila Real e Aveiro e Regimento
de Cavalaria de Braga, não devem ter por junto, mais de 600 efectivos (entre
oficiais, sargentos, praças e civis), nos dias bons…
Mas mesmo juntando o
pessoal de todo o Exército só com muito custo se conseguiria fazer tal cordão e
nunca por muito tempo!
Mas ainda, e mais
importante, porque não existe vontade política, antes pelo contrário, para o
fazer – o que carece de explicação alargada, que remonta ao “Estado Novo”; à
Constituição de 1976 e, sobretudo à sua revisão em 1982, e para a qual não há
agora espaço.
De facto aquando da
intenção do PR em declarar o Estado de Emergência terá havido oposição por
parte do Governo (e não terá sido só o Executivo), pois não queriam qualquer
envolvimento das Forças Armadas (FAs). O que também explica a abstenção do PCP
na votação da AR. A coisa lá se resolveu mas, até agora, a actuação da FAs tem
sido o mais discreta possível e a sua acção praticamente ignorada na
comunicação social.
O próprio PR (que anda
numa concorrência frenética com o PM, e vice versa, para verem quem tem mais protagonismo)
até se “esqueceu” de as referir numa das suas saídas precárias a uma exploração
agrícola, nos agradecimentos que vai fazendo a esmo.
O Ministro da Defesa, que
anda praticamente desaparecido, em combate, teve o cuidado de chamar a si toda
e qualquer informação pública sobre a acção das FAs. E até agora nem uma
palavra. Essa será a razão pela qual o Exército, por ex., tem revelado apenas
internamente a acção do Ramo, e o respectivo Chefe de Estado – Maior tenha
feito um comunicado interno, por sinal bem feito, no passado dia 3 de Abril.
O Conselho Superior de
Defesa Nacional, previsto reunir em permanência no Estado de Emergência ainda
não foi convocado uma única vez a (nem foi sequer referido no decreto
presidencial que impõe o estado de emergência).
Tudo complementado pela
desvalorização das FAs por parte de comentadores de serviço e, até, pelo
Comandante da GNR e Director Nacional da PSP (note-se que a PSP deixou de ter
“comandante” desde a saída do saudoso Tenente - General Gabriel Teixeira) no
programa “Prós e Contras”. E também pelo Sindicato Nacional de Oficiais de
Polícia - dos 16 existentes, sindicatos que, pelos vistos, se querem substituir
à hierarquia, ou serem uma espécie de hierarquia paralela.
Mas o cúmulo da
insensatez e do delírio – e fico por aqui para não me acusarem que carrego nos
adjectivos – veio, quando agentes policiais quiseram identificar elementos de
uma patrulha da Polícia do Exército, integrada numa equipa de outros militares
que efectuavam uma desinfestação num lar, em Vila Real, no pretérito dia 28 de
Março. Nomeadamente por estarem armados!
Mas em que país do mundo
é que isto seria possível? O que terá passado na cabeça destes “cívicos” ou de
quem os enviou, fazerem uma coisa destas?
A PSP identifica uma
subunidade militar uniformizada e devidamente enquadrada, no cumprimento de uma
missão? E os militares prestaram-se à infâmia, não os mandando dar um giro?
Isto é inaudito!
Por aqui se pode perceber
melhor a pouca vergonha que se passou (e passa) com o assalto aos paióis de
Tancos…
Na sequência diz-se no
“jornal da caserna” que o Director da PSP terá telefonado ao CEMGFA a pedir
desculpas… Mas não parece nada, primeiro porque nada foi tornado público,
depois porque logo a seguir, é emanada uma mensagem do Gabinete do CEMGFA, em
28 de Março, que ordena o seguinte: “Assunto: Covid 19 armamento – Forças
Militares e militares empenhados em apoio ANEPC – SNS no âmbito da pandemia
Covid 19 não envergam armas coletivas nem individuais.”
Convém alertar desde já,
que a mensagem especifica, que o conteúdo se aplica no âmbito do apoio à
Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil e ao Serviço Nacional de
Saúde. E não no âmbito do recente documento aprovado em 28 de Fevereiro de
2020, entre o CEMGFA e a Secretária – geral do Sistema de Segurança Interna,
intitulado “Orientações para a articulação operacional entre as Forças Armadas
e as Forças e Serviços de Segurança. Nomeadamente no que prescreve a sua parte
IV (Princípios Orientadores), alínea e), que me parece basicamente errado e
confuso[1].
Este documento que andou
a aboborar durante muito tempo e cujos princípios orientadores foram sempre
contrariados pelos anteriores Chefes de Estado-Maior (e ao que se sabe pelo
actual CEMGFA por alturas de 2018) visa estabelecer regras para a intervenção
dos militares, a pedido das Forças de segurança, face a um incidente grave de
“ameaças transnacionais” (leia-se terrorismo). Esperemos que nessa altura
deixem os militares deixem irem armados…
Ora a mensagem do
Gabinete do CEMGFA (que caiu na praça pública) é infeliz a vários títulos (e se
a ordem veio de cima ainda é mais grave). Em primeiro lugar por ter um erro que
se presta a “piadas”, já que utiliza o termo “envergam” em vez de “fazem uso
de”; as armas não são propriamente uniformes…
Em segundo lugar porque
envia a mensagem com conhecimento para os Comandos operacionais subordinados
(dos Ramos), o que causa engulhos hierárquicos; em terceiro lugar por não ser
liquido que na actual situação, uma ordem destas possa ser dada, dado que não estamos
em guerra, nem em estado de sítio e como tal o CEMGFA não tem as forças
militares debaixo do seu comando directo (como estão as Forças Nacionais
Destacadas, para o que foi feito a atempada transferência de autoridade).
Mas, sobretudo, por uma
questão de princípio - e muito menos a seguir ao incidente que lhe deu azo.
Parece que afinal, é o CEMGFA (e por arrasto os outros chefes militares), que
estão a pedir desculpa ao Director da PSP…
Por princípio porque é da
natureza das coisas (e da condição militar) que as Forças Militares nunca devem
actuar desarmadas (os polícias por acaso andam desarmados?), como se tem
insistido que aconteça, por ex., no apoio aos incêndios florestais - até porque
é seu dever protegerem-se e aos outros, bem como defender o armamento e
equipamento à sua guarda (que era o que o pessoal da Polícia do Exército estava
a fazer em Vila Real). Não se devem colocar nunca, os militares em condições de
poderem ser apanhados à mão…
Já basta as iníquas
disposições que os inibem de fazer segurança aos quartéis, trânsito de material
e munições, ou de fazer fogo em qualquer situação que o requeira. Para já não
falar de uma directiva ainda existente no Exército, do tempo do General Firmino
Miguel, imagine-se, que obriga, num rol extenso de situações, a que os
militares tenham os carregadores selados e, ou, com balas de salva antes das
munições reais. Um atestado de menoridade e de irresponsabilidade que os
militares se impuseram a si mesmo! Faz lembrar a “guerra do Solnado”…
E de tanto se baixarem…
Finalmente, a Instituição
Militar não está ao mesmo nível (nem deve estar) da GNR, da PSP ou de qualquer
outra entidade, nomeadamente o Serviço de Estrangeiros, a PJ ou a Protecção
Civil. E não está em face da sua antiguidade, missões, capacidades, pergaminhos
e especiais deveres e responsabilidades decorrentes da condição militar. O que
afirmo não envolve qualquer desprimor para os restantes órgãos do Estado. E
todo o mundo deve ser tratado com respeito e dar-se ao respeito. Nomeadamente
não querendo “invadir” áreas e competências de outrem.
Tudo o que se passou no
âmbito acima apontado, necessita ser profundamente reformulado, a não ser que
os militares sirvam apenas para carregar camas e caixotes! E nesse caso para
que necessitam sequer ir fardados?
Razão tem o evangelista
Lucas…
João José Brandão
Ferreira
Oficial Piloto Aviador
(Ref.)
NOTA de Tempocaminhado: o negrito é nosso. A bem da verdade, todo o texto deveria estar sublinhado a negrito!
NOTA de Tempocaminhado: o negrito é nosso. A bem da verdade, todo o texto deveria estar sublinhado a negrito!
[1]
“Actuação sob direcção operacional das
FSS: Os meios ou capacidades empregues pelas FFAA no apoio às FSS, sem prejuízo
da sua dependência hierárquica e da autonomia técnica e táctica, actuam sob a
direcção operacional do responsável da FSS competente (territorial ou funcionalmente)
que exerce o comando da operação ou do incidente de segurança. A direcção
operacional dos meios ou capacidades das FFAA é concretizada através do(s)
elementos(s) de ligação das FFAA.”
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