domingo, 2 de dezembro de 2018

Os que trilharam o meu caminho … (5)



Para muitos, Teta Lando (uma lenda da música africana) não morreu, foi morto!

Ouçam isto e deliciem-se. Os acordes, a melodia … E a voz distinta. Até sempre, Teta Lando…

TETA LANDO - EU VOU VOLTAR

TETA LANDO - FUGUEI NA ESCOLA SO PARA JOGAR A BOLA !!!



A dimensão proverbial e política de Teta Lando – Jornal de Angola
Jomo Fortunato |
7 de Junho, 2010



Alberto Teta Lando foi uma figura emblemática do período da música de intervenção.
Alberto Teta Lando “encarna o querer que personifica o homem lutador, que percorre os caminhos da vida com espírito decisivo, contornando atropelos, rompendo incompreensões, destruindo invejas e acariciando males. Em miúdo, os vizinhos não compreendiam que um filho de pais ricos, da linhagem directa do Reino do Congo, preferisse o canto ao canudo de medicina, direito ou engenharia. A mãe, dolorosamente esmagada pela morte do pai, pelo sonho da independência, perplexa, reflectiu, e, finalmente entendeu, que o canto é a gota sagrada que dulcifica corações empedernidos...”, escreveu o saudoso Domingos Van-Dúnem, importante homem de cultura, num texto crítico do CD “Memórias”, uma colectânea referencial que reúne os principais sucessos do cantor e compositor, editados de 1968 a 1990.
Alberto Teta Lando nasceu no dia 12 de Julho de 1945, em Mbanza Congo, e iniciou a carreira musical em 1962, somando-se 46 anos, até a data da sua morte, de uma vida intensamente confinada à música. Teta Lando foi uma criança normal e dizia que nenhum motivo especial, nem propositado, o terá levado a trilhar os caminhos da música. “Mas, o lado musical da minha mãe foi decisivo”, recordava o cantor.
Contudo, dizia, nostálgico, que cantava, de forma natural, nas festas escolares de fim de ano, numa altura em que professores e amigos já haviam detectado, no futuro artista, uma certa propensão para a música. Musicalmente influenciado, na infância, pela mãe, uma mulher de fortes convicções culturais que tocava guitarra e acordeão, Teta Lando aprendeu, desde cedo, a respeitar a cultura de origem e a extrair sons audíveis numa harmónica, primeiro instrumento musical em que se afeiçoou, facto que agradava e encantava os familiares e amigos que o ouviam.

A canção política militante

Figura emblemática do período da música de intervenção, em 1974, pela qualidade textual e alcance estético da obra, Teta Lando gravou “Angolano segue em frente” e dizia sempre que valeu a pena escrever temas de índole política. A propósito, argumentava o seguinte: “não sou das pessoas que se arrepende daquilo que faz. Tudo quanto fiz, serviu-me de alguma coisa e teve sempre o seu lado positivo. Respeito e acho que valeu a pena porque senti e achei que devia participar, naquela altura, e participei. Não estou de forma nenhuma arrependido... muito pelo contrário”.
Teta Lando, nas suas reflexões sobre a canção política, distinguia o texto musical panfletário e propagandístico, da música de intervenção política, propriamente dita. Enquanto a primeira aplaudia, cegamente, os ditames de determinadas formações políticas, a segunda visava a mudança e, normalmente, contrapunha-se aos poderes em presença, facto que aconteceu, amiúde, de forma explícita em Angola, mesmo durante a vigência do sistema colonial.
Ao álbum “Independência” seguiu-se o “Reunir”, duas obras que, embora distantes no tempo, acusam uma certa unidade temática, consubstanciada no desejo de progresso e concórdia entre os angolanos. Em “Reunir”, Teta Lando regrava “Tata nkento” e desfilam os temas “Ntoyo”, “Eu vou voltar”, “Reunir” (funje de domingo), “Mufete” (canção de André Mingas), “Luauano” e “Dub”.
Teta Lando possuía um argumento à volta da sua propensão em escrever canções de pendor político e social: “Para quem faz música ou poemas que reflectem o dia-a-dia das massas, o dia-a-dia do nosso povo, dificilmente consegue escapar a essa influência política directa, chamemos-lhe assim, pois que, tudo na vida é política. Essa política engajada, essa política directa que a gente conhece”.
Mesmo durante o tempo colonial, Teta Lando foi escrevendo, de forma ousada, canções de teor político, embora a semântica textual de algumas das suas composições fossem habilmente encobertas. Teta Lando grava, em 1970, o tema “Deus tira os feiticeiros da minha terra”, uma canção que produziu um impacto político directo, contudo, só a partir de 1975 o engajamento político do compositor começou a ser mais directo e explícito.
Ainda no exílio, Teta Lando grava os temas “Reunir”, “Eu vou voltar” e “Semba de Angola”, embora as canções “Mamã grande”, “Tia Chica”, esposa do senhor Manuel que, depois de rico, abandona a mulher negra, gravada em plena época colonial, acusassem, igualmente, um cunho marcadamente político.

Cantar em línguas nacionais

Teta Lando é um artista que privilegiava os provérbios, a filosofia, e os costumes angolanos nas suas canções em línguas nacionais. Fluente conhecedor da língua e cultura kikongo, seu espaço linguístico de origem, Teta Lando reconhecia que a abrangência da sua música era muito mais vasta quando decidia compor em língua portuguesa. Nas composições de índole proverbial kikongo, a receptividade é mais imediata e espontânea, contudo é circunscrita aos membros da sua comunidade linguística. Em língua portuguesa, dizia o compositor, embora o esforço de criação fosse mais suplementar, a verdade é que atingia um universo de ouvintes mais heterogéneo.
Durante o período de exílio, em 1975, Teta Lando viveu no Congo Democrático, como taxista, e na Alemanha, em 1976, tendo fixado residência em Paris, em 1980. A sua passagem pela Europa alterou os contornos técnico e estilísticos da música que veio a produzir depois, “Não podemos considerar que tenha havido uma alteração de raiz, mas é justo referir que as harmonias passaram a ser mais ricas”, reconhecia o cantor, referindo-se, concretamente, ao CD “Esperanças idosas”.
Sobre a canção “Kimbemba”, uma composição rica, do ponto de vista harmónico, anterior à sua permanência na Europa, Teta Lando dizia o seguinte: “hoje quando oiço o “Kimbemba” tenho a tentação de mexer alguma coisa, em termos de harmonias, porque os conhecimentos que possuo permitem-me pensar que a melodia seria muito mais rica se lhe acrescentasse alguns acordes. Bom... mas isto são tentações que tenho. Todavia, nunca corrijo aquilo que está estabelecido como um facto, não gosto de corrigir, deixo ficar assim porque é um testemunho daquilo que fiz e configura uma época e contextos particulares”.

O produtor Teta Lando

Como produtor e personalidade musical ligada ao mercado do disco, Teta Lando analisava, comparativamente, a política editorial do disco no passado colonial e as produções da nova geração da música: “Não há comparação possível, pois que, naquela altura, já havia um mercado cultural aliado a um mercado do disco sólido. Neste momento, o que existe, não passa de um pequeno embrião. No tempo em que eu era exclusivamente artista, o produtor ficava com a maior parte do bolo e os artistas acabavam por ficar sem nada. Hoje, como produtor, vejo que não é bem assim. Nem tanto mar, nem tanta terra. Havia e há, efectivamente, produtores pouco honestos, mas devo confessar que esta é uma actividade de muito risco financeiro e que todas as precauções são poucas para preservarmos uma empresa de carácter cultural. Antigamente havia um mercado cultural, repito, hoje estamos numa fase incipiente. Estamos a lutar para isso, sou uma pessoa que apostou neste ramo e espero, num futuro mais ou menos breve, poder fazer alguma coisa pelo mercado cultural angolano”.

Discografia

Teta Lando grava, pela primeira vez, “Luginguluami” (minha vivência), em 1968, com 23 anos, depois de uma estadia de cinco anos em Portugal, onde chegou em 1963. Seguiram-se alguns singles que registaram êxitos como “Mumpiozo uami” (um assobio meu) e “Tata nkento”. Em 1973 grava o tema “Kimbemba”, canção de referência obrigatória na carreira artística de Teta Lando. Segue-se, em 1974, o álbum “Independência” (disco de ouro), a última obra gravada por Teta Lando antes da sua partida para o exílio, em 1975, em França, gravado com o agrupamento “Merengues” de Carlitos Vieira Dias, guitarrista que acompanhou Teta Lando nos principais momentos da carreira. O álbum “Independência” foi o primeiro lançamento da CDA (Companhia de Discos de Angola), de Sebastião Coelho, e marca a personalidade de um artista preocupado com os destinos de Angola, entendido como país emancipado do sistema colonial.
O álbum “Esperanças idosas” (1993), último trabalho de Teta Lando, atingiu o primeiro lugar no “top” do continente africano, durante dois meses, e foi escutado, durante três meses, nos voos da “Air France”. “Esperanças idosas” foi um trabalho que apareceu no mercado e que interessou, de imediato, as pessoas, justamente, pela sua qualidade melódica e harmónica, coisa que em termos de música angolana não se estava muito habituado. “Esperanças idosas” marcou a diferença, pelo desempenho dos músicos, a nível da execução instrumental.

Teta Lando na UNAC

Alberto Teta Lando foi eleito, no dia 12 de Maio de 2006, Presidente da União Nacional de Artistas e Compositores (UNAC), agremiação artística onde desenvolveu importantes projectos em defesa da dignidade social da classe artística angolana. Na altura da sua eleição o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, felicitou o cantor e disse estar certo que a nova direcção da UNAC “dará o melhor de si para que se concretizem os objectivos e metas definidas no programa de acção”. Alberto Tela Lando, cuja obra consagra-o, com letras de ouro, na história da Música Popular Angolana, morreu, em Paris, no dia 16 de Julho de 2008, vítima de cancro, na tarde de uma inesquecível e marcante quarta-feira.

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