A
endogamia do Governo de António Costa compete com a casa dos Habsburgo. Mais
parece uma seita.
Ferreira
Fernandes escreveu uma crónica no Diário de Notícias onde classificava como
“chicana política” andar por aí a criticar a nomeação de Rosa Zorrinho como
secretária de Estado da Saúde somente por ela ser mulher de Carlos Zorrinho.
Disse ele: “Está aí talvez a pior das consequências da chicana política:
insinuando, sem provas e contra factos, que uma pessoa com currículo bastante
foi escolhida indevidamente só desvaloriza a crítica necessária e urgente à
prática demasiado comum do PS e do PSD de darem cargos por compadrio.”
Permitam,
então, que me dedique à chicana política, para tentar demonstrar que ter
“currículo bastante” não pode de forma alguma ser o único critério para nomear
alguém, e que a nomeação por compadrio é perfeitamente compatível com um
excelente currículo. É certo — aí estou de acordo com Ferreira Fernandes — que
existe uma espécie de grau zero da nomeação política, que consiste em escolher
um boy semianalfabeto que se distinguiu a colar cartazes a quatro metros de
altura para dirigir a segurança social de Freixo de Espada à Cinta. Essa é, sem
dúvida, a forma mais tenebrosa e imbecil de compadrio. No entanto, como o país
tem felizmente evoluído em termos de literacia, hoje em dia qualquer alminha
consegue exibir uma licenciatura pomposa e citar três frases eruditas, o que
lhe confere automaticamente “currículo bastante” para ocupar qualquer lugar na
função pública.
Só
que o alfabetismo funcional não deve ser o único critério de nomeação. Mandam
as boas práticas republicanas que um Estado, ou um governo, deva ser preenchido
pelos mais competentes de entre todos os competentes disponíveis, e não pelos
mais amigos com “currículo bastante”. Ora, o que vemos nós quando olhamos para
o actual Governo? Permitam-me actualizar a lista que aqui elaborei há coisa de
dois meses: Eduardo Cabrita (ministro da Administração Interna), Pedro Siza
Vieira (ministro adjunto) e José Apolinário (secretário de Estado das Pescas)
foram colegas de António Costa na Faculdade de Direito de Lisboa. Tal como
Diogo Lacerda Machado, um dos nomes favoritos para suceder a Eduardo Catroga
como chairman da EDP. Ana Paula Vitorino, ministra do Mar, é mulher de Eduardo
Cabrita. Vieira da Silva, ministro da Segurança Social, é companheiro de Sónia
Fertuzinhos, deputada do PS. E a sua filha, Mariana Vieira da Silva, secretária
de Estado adjunta de António Costa. António Mendonça Mendes, secretário de Estado
dos Assuntos Fiscais, é irmão de Ana Catarina Mendes, secretária-geral adjunta
do PS. E a sua mulher, Patrícia Mendes, adjunta no gabinete do
primeiro-ministro.
Passo
por cima de Carlos César e respectivo agregado familiar. O ministro do
Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, é filho do antigo secretário de Estado da
Justiça José Matos Fernandes. Guilherme W. d’Oliveira Martins, secretário de
Estado das Infraestruturas, é filho do ex-ministro Guilherme d’Oliveira
Martins. A ministra da Presidência Maria Manuel Leitão Marques é mulher do
ex-eurodeputado socialista Vital Moreira. E a nova secretária de Estado da
Saúde Rosa Zorrinho é mulher do eurodeputado socialista Carlos Zorrinho.
A
endogamia do Governo de António Costa compete com a casa dos Habsburgo. Mais
parece uma seita, em que todos se conhecem desde a infância e se casam entre
eles. Isto não é saudável. Nem aqui nem na Áustria. Eu sou republicano. Não
aprecio habitar na Monarquia Socialista Portuguesa. Num país sério, ter
“currículo bastante” não basta.
Jornalista
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