O
Dr. Carlos Carvalhas deve explicar aos portugueses o que fará no caso de o
crédito externo ser cortado à República Portuguesa, às empresas portuguesas e
aos portugueses em geral.
O
PÚBLICO pediu ao Dr. Carlos Carvalhas para desenvolver a sua ideia de pagar a dívida
portuguesa em escudos
em vez de euros. A tentativa de explicação
encheu duas páginas do jornal mas, infelizmente, muito pouco foi
explicado e o que o Dr. Carlos Carvalhas escreveu foram grandes generalidades
com que até eu estou de acordo. De facto, é fácil de concordar que a “União
Europeia só formalmente é uma união de iguais”, que “Portugal é um país
formalmente independente, mas cada vez mais dependente”, ou que o “esforço
financeiro que a dívida exige é colossal e vai continuar”. Até facilmente
concordo que o nível de investimento “foi tão baixo que nem sequer deu para
repor a capacidade produtiva”.
Acontece
é que nada disto tem a ver com pagar a dívida em escudos, que é uma moeda que
não existe e, por isso, será bom que antes de avançar com a ideia se pergunte
aos portugueses, que recebem os salários e têm as suas contas no banco em
euros, se estão disponíveis para os trocar e a que valor. Será também útil que
o Dr. Carvalhas explique aos portugueses o que quer dizer com a reestruturação
da dívida, ou com quem pretende levar à prática “a redução dos contratos da
dívida externa não titulados em direito português”, como sugere. Suspeitando
que os credores não aceitarão perder o dinheiro que nos emprestaram, a pergunta
óbvia é o que fará este ou outro Governo nessas circunstâncias.
Ainda
quanto à reestruturação da dívida, que é um raio de uma palavra que pode querer
dizer muitas coisas diferentes, se é entendida como negociar melhores condições
de juro e de prazo é fácil estar de acordo. Mas se for para não pagar, então o
Dr. Carvalhas deve explicar aos portugueses o que fará no caso, bastante
provável, de o crédito externo ser cortado à República Portuguesa, às empresas
portuguesas e aos portugueses em geral. Ou, já agora, se acredita ser possível
pagar em escudos a energia que importamos, os medicamentos de que necessitamos
e as máquinas, as peças e os materiais que fazem funcionar as empresas. Não
falo da alimentação, porque depois de alguma probabilidade de escassez acabaríamos
por produzir o suficiente para não morrer de fome, a menos que o Estado tomasse
conta do assunto, a exemplo da “grande revolução de Outubro”.
Segue-se
que culpar a União Europeia (UE) e o euro por todos os problemas nacionais não
é sério e é frequentemente um incentivo à irresponsabilidade dos partidos
políticos e dos governos que tem dominado o panorama político nacional do
último quarto de século. Não é sério culpar a UE pelos desmandos provocados no
nosso sistema financeiro, público e privado, pela destruição da PT, pelas
parcerias público/privadas, pela corrupção resultante da promiscuidade entre a
política e os negócios e pela ausência de uma estratégia e de um modelo
económico para o país. Suspeito, por isso, que mesmo sem a dívida e com os
partidos ao serviço das suas diferentes clientelas e servindo-se do Estado à
custa da economia e de conjunto dos portugueses, voltaremos ao endividamento
excessivo pela quarta vez em democracia. Ou seja, o principal problema nacional
é de governação e de uma falsa democracia capturada pelos interesses e culpar a
UE é apenas uma escapatória para não enfrentar os problemas reais do país e
evitar as reformas necessárias.
Entretanto,
é verdade que o sistema financeiro global constitui um perigo enorme para as
democracias e que, pessoalmente, há muito que defendo uma estratégia nacional
para reduzir a dependência da UE e da dívida. O problema é que não sei com que
alianças é possível realizar essa libertação de forma rápida e suspeito que o
Dr. Carlos Carvalhas também não. Acredita que Portugal o poderá fazer
isoladamente, ou com que alianças? Coreia do Norte? Cuba? Venezuela? Grécia? E
se não, pode o Dr. Carlos Carvalhas contabilizar os custos previsíveis para o
isolamento e a albanização do nosso país? Pessoalmente, não estou disponível
para fazer os portugueses correr esse risco.
Finalmente,
duas questões: (1) sugiro que a manter o desejo de saída da UE e do euro avise
solenemente os portugueses que andam a investir em Bilhetes de Tesouro para
terem cuidado; (2) finalmente, é curiosa a referência do Dr. Carlos Carvalhas
ao desejo de alguns de provocarem a queda do rating da República com o
objectivo de colocar “a pressão máxima sobre a coligação à esquerda e não é
seguro que esta lhe sobrevirá”, como terá sido dito pelo referido Dr. Brás
Teixeira. Suponho que, quanto a isso, não considerou a possibilidade de as posições
políticas do PCP irem objectivamente no mesmo sentido, já que será isso mesmo o
que acontecerá se o Governo levar à prática a saída do euro e a adopção do
escudo.
Empresário
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