JORGE LAGE |
Eram três irmãos que ficavam no
caminho da minha aldeia e de muitas aldeias. Mais ainda, nunca ouvi em minha
casa uma palavra em seu desabono dos meus pais. Eram pessoas trabalhadoras e
empreendedoras que honravam o nome da sua família e Mirandela. Um deles andou,
muito novo, na minha aldeia a fazer pela vida e cruzou-se com a minha avó Rosa
e daimosa. Já assim, generoso, era o meu bisavô materno, Ti João Aleixo. Era,
também, o meu bisavô, exímio jogador do pau, que varria o toural da feira da
Torre se havia uma zaragata. Era, ainda, um campeão em pesos. Um dia (Século
XIX) aparece-lhe à porta, em Chelas, um desafiador dos Cortiços (?) para se
bater com ele e levar o «título de campeão da região em pesos». O Ti João
Aleixo concorda e convida-o por cortesia a beber. Então, pega na tanha de barro
cheia de vinho, ergue-a com as duas mãos e leva-a à boca e bebe. Pousa-a e
convida o forasteiro a beber, mas ele disse-lhe que não conseguia erguer a
tanha e beber. O meu avô despediu-o, porque se não é capaz de erguer pela tanha
e beber, não era digno de se bater com um campeão. A tanha era a
pré-eliminatória. Mas, voltando aos irmãos Cruz foram sempre vistos como
empreendedores, sendo o mais popular o Adolfo com a serralharia acima do Tanque
e para lá da linha do comboio. O Manuel com o comércio um pouco abaixo do
Tanque e do lado de lá do largo. O Joaquim tinha a serração na Quinta Branca e
um comércio a seguir à casa do Capitão Ilídio Esteves. Foi numa ida duma minha
irmã ao comércio que o próprio Joaquim Cruz lhe contou quanto estava agradecido
à minha avó Rosa, que à sua merenda acrescentava um agrado. Puxei este assunto
ao teclado do computador, para dizer, a quem possa ter dúvidas, que procuro
sempre ser rigoroso no que escrevo, não para amesquinhar ninguém e muito menos
os que partem, mas para mostrar um bom caminho, uma boa acção ou um exemplo de
vida. Por exemplo, a mim, não me incomoda o meu passado humilde de filho de
agricultores remediados e trabalhadores. Incluí, com orgulho, esse dado no meu
currículo e repito-o dezenas de vezes. Ainda hoje, em cada dia que passa, fico
agradecido a quem me ajuda e sem os amigos e a generosidade de muita gente por
esse Portugal abaixo não conseguiria fazer o pouco que fiz. Pena é que
Mirandela e o país não tenham muitos «Irmãos Cruz», como os que havia em
Mirandela, gente empreendedora e trabalhadora. A sua memória e de muitos outros
mirandelenses, trabalhadores e empreendedores, enchem-nos de orgulho, são bons
exemplos e ajudaram a engrandecer a Mirandela do segundo e terceiro quartel do
século XX.
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