Vasco Pulido Valente in: jornal Público |
Segundo
A. J. P Taylor, o problema da Alemanha é ser grande demais para a Europa. No
século XX, isto levou a duas guerras que acabaram por envolver o mundo inteiro.
Partindo do poder que tinham - e que, aliás, sobrestimavam - tanto Guilherme II
como Hitler quiseram primeiro afirmar a sua supremacia na Europa e, depois,
submeter o mundo. Os dois, como se sabe, falharam. Mas convém perceber por que
razão. Em 1914, nenhuma potência podia em princípio resistir à Alemanha. O
exército inglês, voluntário e minúsculo, não contava; o exército russo mal
armado, desorganizado e sem vias de comunicação estratégica não valia muito; e
a França, já derrotada em 1870 e agora enfraquecida por um constante conflito
político, parecia eminentemente vulnerável.
Pior
ainda, em 1914 a Alemanha era, tirando a América, o país com maior produção
industrial do tempo. Esta quase ilimitada força inspirou ideias de conquista
militar. E também de hegemonia económica. Na Europa central e, a seguir, na
periferia. Com a derrota de 1918 e a de 1945, ficou só a segunda hipótese, a
que Mitterrand eventualmente ofereceu a arma e a camuflagem do euro. Até ao
colapso da União Soviética, a Alemanha (dividida) não interferiu com os
vizinhos, bem guardada a leste e dependente da América a oeste. Mas no momento
em que readquiriu a sua velha liberdade de acção voltou à velha política que a
perdera duas vezes. Claro que desta vez a sua supremacia, na impossibilidade de
ser militar, tomou a forma alternativa de domínio económico.
Nada
impedia este exercício. A Rússia continuava na miséria; a América estava
endividada e enfraquecida; e a França e a Inglaterra, apesar da retórica
oficial, sem verdadeira influência externa. A Alemanha miraculosamente acordou
como em 1914 dona da Europa e passou logo a impor a sua vontade à gente bárbara
da periferia. Hoje manda, embora com boas maneiras, da Roménia a Lisboa,
enquanto vai enredando as suas vítimas com tratados supostamente benéficos para
a Europa, mas que realmente se destinam a consolidar a sua posição. O Orçamento
para 2015 indignou por aí muito português. Quase ninguém percebeu que o
“servilismo” perante a Alemanha é um facto da vida, não é nem um erro
económico, nem a falta do “murro na mesa” que António Costa anda por aí a
prometer. As coisas são como são.
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