quarta-feira, 28 de maio de 2014

BARROSO da FONTE - Vencer sem convencer não leva a bom porto


Barroso da Fonte
BARROSO da
FONTE
Retive do discurso mais empertigado da noite eleitoral uma frase que iludiu muitos incautos: «só prometemos aquilo que temos a certeza que podemos cumprir». Eu que fui votar às dez horas da manhã já esperava ouvir às 20 h essa frase bombástica que  faz parte do glossário das maiores crises políticas que o país viveu em 40 anos de democracia. Votei cedo porque ando amargurado com aquilo que o governo actual me «roubou» e a tantos milhares que cumprimos, pelo menos, 36 anos de função pública e que descontámos tudo o que nos era imposto, para podermos assegurar a velhice. Puro engano! Eu – e esses meus pares da terceira idade –sabíamos que não estava em causa o «roubo» de que fomos vítimas. Mas sim a eleição dos nossos representantes no Parlamento europeu. Como quem prometeu a reposição dos vencimentos nunca falou dos problemas da Europa e como os cortes têm que ser repostos pelo governo de Portugal, deixei-me iludir durante a campanha, ansiando pela chegada dos telejornais para ver se o partido que anunciava uma hecatombe, teria a coragem de se penitenciar da ruína que provocou na sociedade portuguesa. Nem assumiu os erros desse desastre, nem foi prudente quando os primeiros resultados  foram conhecidos. É certo que  por um voto se ganha e por um voto se perde. Mas quem, desde há três anos, tendo obrigação moral e política de colaborar para  a recuperação do equilíbrio financeiro, tem feito o contrário daquilo que dele se esperaria,  não teve  a humildade de reconhecer que 31,5% não é resultado que dê força política para triunfalismos tão exacerbados. 
 A vitória que resultou das eleições do último sábado, longe de dar alento aos eleitores para acreditarem nas promessas que diariamente lhes foram  feitas, mais entristeceram quem aguardava uma vitória retumbante que permitisse alterações políticas a nível nacional. Muitos cidadãos bem intencionados já esfregavam as mãos de contentes, a contarem com a reposições dos «roubos» a que o actual governo teve de recorrer para pagar os calotes.  Nenhum partido político pode cantar vitória folgada porque quem ganhou foi a abstenção. Nunca fora tão elevada. 66,1% dos eleitores nem sequer foram às urnas, estando um dia aprazível. Somando os votos brancos e nulos, conclui-se que apenas 30% cumpriram o «dever cívico». Ora o partido vencedor, se a maioria da população, tivesse confiança nele, teria recolhido votação suficiente para uma vitória credível, necessária e oportuna. Nunca, em democracia, um partido teve tantas facilidades para ganhar folgadamente.
 Não é de estranhar que a CDU tenha subido na votação. A sua coerência é património que se respeita. E também a sua elegância verbal.
Marinho Pinto foi o herói da noite. Uma demonstração clara do papel das televisões. Augura-se a este político um futuro risonho, ainda que tenha de esgueirar-se às manhas de quem muda quando se entra na porta do poder.
O Bloco de Esquerda, mais uma vez, foi vítima da arrogância. Não chega falar alto e arrogantemente. Semedo e Catarina Martins têm boa presença física e movem-se bem no terreno escorregadio. Mas desde que Louçã saiu, o BE ficou sem alma. É um partido de intelectuais, de tribunos, de bem-falantes. Mas o povo quer provas. E quem desse grupo já deu provas concretas de trabalho, de lisura e de coerência social?
Foram dezasseis forças políticas a concorrer. Partidos a mais para população a menos. Os eleitores olham para os 40 anos desde a revolução dos cravos e reparam que a democracia é uma palavra  que rima com: bonomia, simpatia, alegria, capazes de convencer os mais resistentes. Mas também repara que há hoje mais desemprego, menos dinheiro, menos tranquilidade social, mais crimes, mais insegurança, menos justiça e, pior saúde...
Os portugueses estão cansados de políticos e de políticas. Apreciam mais a prática do que a teoria. Desconfiam das promessas quando elas cheiram a falso e gostam mais de apalpar do que de ver e ouvir. As cadeias  e os tribunais estão cheios de processos bicudos e sombrios. Uma boa parte de quem prometeu mundos e fundos e saiu chamuscado, chamuscando quem neles acreditou.
O povo acredita mais em quem já mostrou ser competente, sério e cumpridor. Quem  fala muito  - e, às vezes bem – mas ainda não calejou as mãos, nem conhece a dureza do trabalho, não engana quem gastou vidas inteiras a comer o pão que o diabo amassou. A democracia é uma palavra harmoniosa, suculenta e fácil de pronunciar. Mas também é ardilosa, perigosa e traiçoeira.
As eleições europeias já passaram. Os 21 deputados Portugueses já têm palco para, durante quatro anos, esfregarem a barriga ao sol, viajando, dormindo, comendo, bebendo, gozando os 4 milhões e meio de euros por ano. Em tempo de crise o seu estatuto é uma provocação a quem trabalhou uma vida inteira, vendo os seus direitos subtraídos, enquanto o pai deste descalabro, usa e abusa do tempo de antena para nos martirizar a cabeça. 
                                                                                 
    Barroso da Fonte

Sem comentários:

Enviar um comentário

O atraso português - sintomas e doença...