A freguesia de Lagoaça foi palco, no passado 10 de Setembro, de acontecimento cultural invulgar: o lançamento de uma colectânea de autores transmontanos.Estiveram presentes Amadeu Ferreira, Fernando Castro Branco e Modesto Navarro, como apresentadores do volume. Maria Márcia Trigo não o pôde fazer por motivos de força maior. Contudo, a sua comunicação que abaixo se transcreve, foi lida no acto.
Estiveram presentes, Adilia Figueira, Pedro Verdelho, Pires Cabral, Carlos Abreu, António Júlio Andrade, Fernanda Guimarães, Bernardino Henriques Pimenta de Castro, Rui Carvalho, Inocêncio Pereira, Donzilia Martins, José Santos e Carlos Novais.
Maria Márcia Trigo (Professora Universitária) |
TRÁS-OS-MONTES e ALTO DOURO
MOSAICO DE CIÊNCA E CULTURA
Apresentação do Livro, em Lagoaça, dia 10/09/2011 (Maria (Márcia de Almeida Trigo, natural de Mourão de Vila-Flôr)
1. RECONHECER, AGRADECER, LOUVAR E FESTEJAR
Um imenso bem hajam para os Amigos e conterrâneos:
· António Neto, Presidente da Comissão de Festas da Senhora da Graça de Lagoaça que soube sonhar esta obra e convocar outros para que ela acontecesse;
· Armando Palavras, o animador, construtor e tecedor desta obra ímpar, nascida e tecida de «Laços de Amizade», cumplicidades e contribuições mil. Também pela «Rede» que alimenta, directamente e através do seu blogue «Tempo Caminhado» que nos vivifica, une e prende às nossas origens e ao universo-mundo, porque, parafraseando Torga, «O Global é o Local sem muros e fronteiras»;
· Gracinda Peixoto, a inspiradora e agregadora de pessoas e vontades, Vareadora da Cultura da Câmara Municipal de Vila-Flôr, que me associou a esta iniciativa, na nossa qualidade comum de Vilaflorenses, ainda que de diferentes gerações e histórias de vida;
· A todos os Lagoaceiros que nos acolhem hoje aqui e nos deram o motivo para nos reunirmos, à volta dos saberes a sabores de Trás-os-Montes e Alto-Douro, tudo alimentado e cimentado pela raízes e cultura comuns;
· Aos meus familiares, professores e muitos amigos transmontanos a quem devo a pessoa que mora dentro de mim, em especial ao meu Avô materno, Abel Augusto de Almeida, (que foi vogal, ou afim, da CM de Vila-Flôr, nos tempos idos da monarquia) e a quem devo o amor à terra e suas gentes e me abriu horizontes mil, alicerce de uma mente aberta ao novo, ao diferente e ao plural, não obstante a minha aldeia, Mourão, ficar escondida nos confins de 3 concelhos (Vila-Flôr, Moncorvo e Carrazeda de Ansiâes), num fechamento tal que, apenas as histórias cúmplices e desafiadoras - de vida, trabalho, viagens, parcerias e amizades - contadas pelo meu avô, com um brilho de encantar, me abriam ao mundo e ao outro. Bem hajas, Avô!
· E também à minha Amiga e Colega (desde os primeiros anos do Colégio, em Bragança) Maria de Jesus Martins Telo de Castro, de Brunhosinho/Mogadouro, um daqueles gritantes obrigada, de e para sempre, por me manter mais transmontana, mais humana e mais lúcida, ao longo de todos estes longos anos da minha peregrinação pelo mundo e, ainda, pela excelência da liderança desenvolvida no designado «Projecto de Desenvolvimento Integrado do Concelho de Mogadouro», que transbordando o concelho, se transformou em «Projecto Integrado de Desenvolvimento do Distrito de Bragança» envolvendo a maioria do território e cuja excelência pioneira e inovadora foi reconhecida e louvada pelo Conselho da Europa, em Relatório publicado por aquela instituição.
· E, por fim, ao meu filho, Rui Manuel Trigo Pereira Guedes, filho de dois transmontanos, mas que, desde a primeira estadia, em Mourão de Vila-Flôr e depois Mogadouro, se apaixonou por esta terra tão distante e diferente daquela em que nasceu, Lourenço Marques/Moçambique, mas na qual, desde menino, encontrou sempre razões e pessoas que o convocam uma e outra vez para vir até cá.
2. OLHARES SOBRE TRÁS-OS-MONTES: A OBRA E OS AUTORES
Para mim, este livro singular constituíu uma descoberta enorme e profunda, não obstante os muitos, bons, sábios e competentes transmontanos que cruzaram e enriqueceram a minha vida, dividida por dois Continentes (Europa e África/Moçambique) e vivida profissionalmente, por períodos e funções muito diferenciadas, por mais dois (América/EUA e Continente Australiano/Nova Zelândia).
São umas largas dezenas de autores (74 no total) que pensam e escrevem sobre 24 temáticas, todas interessantes, tanto no «em si», como no «para si», no conceito do filósofo J. P. Sartre:
· O País e o Mundo, com Adriano Moreira e Loureiro dos Santos, dois Mestres com quem todos muito aprendemos a pensar Portugal e o Mundo, e, muito em especial, no caso do Professor Adriano Moreira que conheci em Moçambique, como Ministro, esclarecido e esclarecedor, do então Ultramar, um Homem de certo maior e melhor que o seu tempo. Bem haja professor pela sua antevisão do futuro e pelo muito que então fez em tão pouco tempo e em tempos tão críticos! E pelo que contínua a fazer, alimentando-nos com o seu pensamento estratégico e a sua inteligência prospectivamente singular;
· Laços de Amizade, de Armando Palavras que assim justifica o nascimento deste livro, em que todos nos revemos, convivemos e nos superamos;
· Análises e Reflexões, com diversos autores e actores de que destacarei Hirondino Fernandes, com o seu «E não é que a luz se fez!...
· Por esse Douro Acima, de António Barreto, o esclarecido transmontano que permite a todos conhecer melhor Portugal, em especial com os projectos que desenvolve na Fundação Francisco Manuel dos Santos, a que preside;
· Por Terras do Riba Côa e, ainda, Por Terras Barrosãs, do estudioso, amante e divulgador da cultura destas terras, Barroso da Fonte;
· Por Terras de Miranda, com Amadeu Ferreira e a dupla Carlos Ferreira e Júlio Meirinhos, a quem aprendi a apreciar na obra e combates pelos quais se bate, combate, esclarece e congrega;
· De Outras Terras e ainda Personalidades Transmontanas, do amigo e reconhecido Director do Mensageiro de Bragança, durante longos anos, Inocêncio Pereira, Jornal que foi fundado por um irmão da minha mãe, o qual também foi o fundador e proprietário do Colégio S. João de Brito, quando no Distrito de Bragança não havia ainda um qualquer Colégio de Educação e de Ensino. Um pioneiro, como tantos outros transmontanos!
· Crítica Social, sobre a Ciência, a Arte (do consagrado Nadir Afonso, arquitecto e pintor), a Música, Museologia, o Mercado de Trabalho numa Economia Global e Competitiva, Narrativas diversas (uma das quais de Borges Coelho, com o qual muitos de nós aprendemos uma nova História e uma nova compreensão da formação de Portugal e suas interacções com os povos oriundos do sul, com outras culturas, valores e religiões), Monografias, Testemunhos, Costumes e Tradições, Gastronomia, Poemas de e sobre Trás-os-Montes (onde nos reencontramos com a vida e o cheiro do campo, no poema «Cesárica», do conhecido escritor Ernesto Rodrigo, com o qual já todos certamente nos cruzamos no «luxo de falarmos esta língua», como refere no jornal Expresso de 20/08/2011); e, ainda, Reminiscências, onde o encontro acontece com «O Relógio da Saudade», «Livros, uma Paixão» e «Pedaços de Memória», todos de Donzília Martins.
· Finalmente (e também aqui os últimos são os primeiros) o grande tema agregador, LAGOAÇA, com muitos Lagoaceiros a escrever sobre ela e dos quais destaco: i) Armando Palavras, com um texto sobre a religiosidade periférica, em que muitos nos revemos, como se ainda vivêssemos nos séculos XVII e XVIII e porque essa religiosidade, qual matriz fundadora, tem sido uma companheira de vida de muitos de nós; ii) Mandocas, com a belíssima e encantatória lenda sobre a origem de Lagoaça; iii) o casal Almeida Santos que conheço também de outras terras, tempos e problemáticas, Lourenço Marques, em Moçambique, com a belíssima mensagem de que terra nossa é também aquela que adoptamos por e com amôr; iv) Pedro Verdelho com o seu texto tão actual «De Lagoaça à aldeia global»; v) Otília Pereira Lages, com um texto sublime sobre «O Sapateiro de Lagoaça - Um Encontro Singular»; vi) Adelaide Neto com o seu poema rezado a Nossa Sª das Graças; vii) e, em jeito de conclusão, Adília Verdelho, com o desafiante texto «O Esforço chama-se Lagoaça», o qual, na minha leitura, podemos estender à maioria dos transmontanos e altodurienses, gritando, cantando e rezando:
O Esforço chama-se Lagoaça! O Esforço chama-se Trás-os-Montes!
3. EM JEITO DE CONCLUSÃO
A concluir, é reconfortante perceber e ficar com o sentimento de que este livro é, simultaneamente:
3.1. um aleluia dos transmontanos à vida, ao trabalho, à esperança, à amizade de proximidade ou qualquer outra, à confiança, ao futuro e à felicidade que, nas palavras de Telmo Verdelho, «A nossa terra faz-nos falta para falarmos de felicidade…porque a nossa sociabilidade era (é) feita pelo gosto de reconhecer o outro, de o nomear e de o referenciar com aquela afeição crítica que sabe dar sabor à diferença de cada um»;
3.2. uma oportunidades para aprendermos uns com os outros a viver, conviver, a trabalhar e a louvar juntos o facto de «sermos esta terra e não apenas desta terra». E, ainda e sempre, a sonhar, pensar e a projectar no futuro o nosso chão, de transmontanos empenhados, porque para cada um de nós, «o impossível é para já e o milagre é para amanhã», numa contaminação potencialmente virtuosa. Deixo-vos por isso, com o universal Saint-Exupery e o Princepezinho que sempre encantará, como quem embala, a criança transmontana que vive dentro de cada um de nós:
«Aqueles que passam por nós
Não vão sós, não nos deixam sós.
Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós».
Bem hajam todos e todas, por mais esta experiência vivenciada com amor comunitário e uma enorme cumplicidade transmontana, porque, parafraseando Vieira, «cada um é da cor do seu chão e de quantos o habitam e com os quais interagimos».
Aqui fica um daqueles enormes, sentidos e ruidosos abraços transmontanos,
Maria Márcia de Almeida Trigo
(Lagoaça,10 de Setembro, Festas de Nossa Senhora das Graças, de 2011)
A organização agradece a colaboração do Dr. Hirondino Isaías.
Sem comentários:
Enviar um comentário