(Pink Floyd – Breathe – Dark Side of The Moon)
ANTÓNIO MAGALHÃES
Faltam três dias para as tão desejadas e tão esperadas férias na Turquia.
Poderíamos metê-lo num tubo de ensaio, agitá-lo bem agitado, deixá-lo
fluir pelo tubo das experimentações, em ziguezague, e sairia do outro lado tal
e qual como qualquer outro comum dos mortais, quase sem entender muito bem o
seu propósito no mundo, e na vida.
Nem por isso o poderíamos considerar uma espécie de inhenho porque, como
qualquer outro comum, vai desbravando passos na caminhada à medida das suas
ilusões.
Faltam três dias para as férias na Turquia e, apesar da grande
ansiedade com que os tem vivido, tem
aproveitado o ensejo para imaginar um cem número de cenários, como quem prevê
com antecedência as férias ideais para as quais tem valido todo o seu esforço
nas horas de trabalho extras que, apesar do sacrifício feito para ter uns cobres
a mais, irão dar imenso jeito nos dez dias que irá ataviar de acordo com os
seus sonhos acordado.
Se lhe perguntassem neste preciso momento algo tão estúpido como
desnecessário, como, estás excitado com as férias que se avizinham, ele
responderia sem qualquer hesitação que sim, que ia ser assim e assado e isto e
aquilo.
Foram custosos os três dias que faltavam para as tão desejadas férias.
Bem mais custosos do que o resto dos dias que o separaram de quase um ano
passado entre estas e as últimas férias.
Custou, mas chegou a sexta feira onde quase não cabia em si de
contentamento, excitação e até uma certa ansiedade, sentimentos que bem
amalgamados se foram manifestar num certo formigueiro que sentiu em volta do
umbigo. E entre essa sexta feira e a segunda-feira com os dez dias de férias já
consumados, foi como um piscar de olhos.
Se lhe perguntassem, provavelmente os mesmos que lhe perguntaram se
estava excitado acerca das férias, se se divertiu no seu tão merecido descanso,
diria quase desiludido, com o mesmo grau de intensidade com que as idealizou
naqueles três dias que as antecederam, que…bem…não foram más… (mau maria, não
foram más quer dizer que também não foram boas, não foram à altura das
expectativas).
Depois, nos desabafos sobressaíram os desalentos esboroados numa espécie
de lamúria, onde aqui e ali se ficou a saber que afinal um tipo que nasce num
país onde o sol mesmo sendo para todos, raras vezes aparece, e uma pele
esbranquiçada exposta ao sol escaldante da Turquia, depois de transformar o
corpo num bife acabado de ser fatiado pelo talheiro, o próximo passo é um
escaldão que arruína as férias de qualquer um.
E depois de o espremer bem espremido sabe-se também que foram mais as
desilusões do que os encantos.
Falta um ano para as próximas férias…
Vá, cava lá esse buraco, esquece o sol, e quando o trabalho estiver
feito não te sentes, é tempo de cavar outro…
“Tens razão, estive a gracejar. Mas ainda não acabei, falta o último
gracejo. Aos vinte e sete anos formei-me. Era médico, enfim, realizara o meu
ideal mais alto, o meu sonho mais belo, mas foi justamente nesse momento que
apareceu o tal último problema; o espetáculo das vidas que definham, das febres
que devoram, dos males que desfiguram, das lágrimas e dos gritos dos que não
querem morrer. O espetáculo da grande vida que acaba miseravelmente num
suspiro, depois de se ter enchido de alegrias e de tristezas, de triunfos e
desastres!”
“José Saramago, Terra do Pecado”
Vida, ilusões, expetativas… Cava um buraco, mas não te sentes, é tempo
de cavar outro.
Quem te disse a ti que tinhas todo o tempo do mundo…?
(Retalhos do Quotidiano, páginas 13 e 14)
António Magalhães
Tal e qual, a vida neste momento... Quantos exemplos neste texto...
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