domingo, 18 de outubro de 2020

O dr. Costa foi o pior que podia ter acontecido a Portugal

 Alberto Gonçalves -  Observador (17/10/2020)


Há tempos que o regime de arbitrariedade que o dr. Costa inaugurou se encontra em rédea solta, e de agora em diante é lícito esperar mais delírios, e delírios mais ilícitos e mais delirantes.


Há exactamente cinco anos, enquanto a esquerda celebrava e parte da “direita” lhe chamava “príncipe da política”, previ, porque era fácil prever, que o dr. Costa arrastaria o país para uma ditadura. Há exactamente uma semana, constatei, porque os sinais não deixavam dúvidas, que a ditadura do dr. Costa se consumara de vez. Anteontem, parte da “direita” começou a desconfiar de haver a possibilidade, vaga, rebatível e provisória, de o dr. Costa possuir uma ligeira, ligeiríssima, vocação autoritária. Como diria uma criança de dez anos, a sério? Parte da “direita” parece composta por crianças de cinco. Ou por oportunistas de quarenta.
Dado não me interessar pela dimensão caipira da política, desconheço as proezas do dr. Costa na fase de autarca (dizem-me coisas lindas). Desde que usurpou as “legislativas” de 2015, com uma aliança cozinhada às escondidas com dois partidos leninistas, a aversão do homem à democracia é notória, e o seu recurso à dita meramente instrumental. A tirania está na natureza do dr. Costa, e não há verniz que a cubra ou engane. Excepto os tontos, que adoram ser enganados.


Os tontos, que em cinco anos não repararam na voraz conquista do Estado e da vida privada pelo PS, desataram a duvidar dos méritos democráticos do dr. Costa esta semana, a propósito da obrigatoriedade da máscara e de uma “aplicação” que visa detectar a Covid e afinal só detecta os devotos que a instalam. Pelos vistos, a tomada da PGR, do Banco de Portugal, do Tribunal de Contas, da Assembleia da República, da Presidência da República, da Justiça, do ensino, dos “media” e de tudo, tudo, tudo, tudo não os inquietou nem um pedacinho. Grave é a máscara e grave é a “aplicação”. Aliás, grave é a “aplicação”, já que aparentemente meio mundo não reparou no truque e está disposto a usar a máscara 24 ou 25 horas por dia logo que não tenha de usar a “aplicação”. O truque é eficaz.
E o truque é principalmente eficaz perante uma população disposta a engoli-lo. O dr. Costa explicou isto por diferentes palavras: “As medidas só são autoritárias se as pessoas não as fizerem [sic] já espontaneamente”. Ou seja, ele, coitado, nem gosta de mandar: apenas manda quando não obedecemos, castiga quando não cumprimos, enfurece-se quando não rastejamos, dóceis, a seus pés. Para felicidade do dr. Costa, e em prol do bem-comum, o português médio é obediente, cumpridor e tendente a rastejar. Por isso a ditadura em vigor não apresenta as marcas extremas de outras ditaduras. Temos saneamentos. Temos espancamentos (quase consumados pelo Burgesso Supremo em plena rua). Não temos, por exemplo, fuzilamentos. Fuzilar quem, se 99% da população aplaude a experiência de engenharia social em que a enfiaram a pretexto da Covid?
Para o dr. Costa, a Covid, um vírus que mata tanto quanto a gripe num ano em que os portugueses decidiram não morrer de gripe, é de facto um pretexto. Primeiro, um pretexto para entreter as pessoas com histeria sanitária e consumar a fase final do assalto socialista à máquina pública e aos dinheiros de “Bruxelas”. Depois, um pretexto para testar aquilo que nenhuma ditadura dispensa: a vassalagem das pessoas a imposições estapafúrdias e crescentemente humilhantes. Em “Bananas”, de Woody Allen, a proclamação inicial do novo ditador é estabelecer o sueco como língua oficial. Nestes meses do vírus, com o beneplácito das marionetas na DGS, no parlamento, nas televisões ou em Belém, o dr. Costa bombardeia regularmente os portugueses com incontáveis “medidas”, tão grotescas que fazem a obrigação do sueco parecer razoável. Se uma ditadura pode passar sem fuzilamentos, não passa sem enxovalhar as massas. E as massas daqui são óptimas no enxovalho.
É evidente que, ao contrário do que sugerem os tontinhos, a história da “aplicação” e das máscaras permanentes não indicia que possamos cair numa ditadura: é o tipo de delírios de quem já caiu. Há tempos que o regime de arbitrariedade que o dr. Costa inaugurou se encontra em rédea solta, e de agora em diante é lícito esperar mais delírios, e delírios mais ilícitos e mais delirantes. As ditaduras não vivem exclusivamente de sombras e opressão: as macacadas são indispensáveis. Não basta pisar os cidadãos, é fundamental pisá-los com gozo. Por sorte, a vasta maioria de cidadãos também se diverte ao ser pisada.
Por azar, a ínfima minoria que não aprecia o dr. Costa e a medonha arrogância do dr. Costa alimenta a esperança de sair disto através da acção redentora de um partido. Esquecem-se que em ditadura os partidos existem na medida em que servem, de alguma maneira, o poder vigente. Do PSD, ávido pelas migalhas da mesa socialista,  ao Chega, ávido pelas migalhas do PSD e enamorado das polícias que o dr. Costa lança aos prevaricadores, estas simpáticas agremiações não contam. Não perguntem aos partidos o que podem fazer por vocês, perguntem o que vocês podem fazer para não necessitar dos partidos.
Ocorre-me uma resposta: desrespeitar. Ceder a um poder ilegítimo é colaborar na respectiva legitimação. Perante a prepotência, sobra a resistência, resistência a sério. Não é mandar uns piropos no Twitter. Não é aplaudir o senhor de Famalicão que poupou os filhos dele ao mofo da “cidadania” e em simultâneo manter os próprios filhos na dita “disciplina”. Não é protestar o uso de máscara na rua e colocá-la com receio da multa. Não é pagar a multa. Não é evitar chatices. É resistir, resistir mesmo, individualmente e até às últimas consequências, que no regime actual são imprevisíveis e previsivelmente desagradáveis. Pelos meus cálculos, cerca de 215 portugueses estarão dispostos a trocar a segurança de um vexame pelos riscos da liberdade. Sou um optimista, eu sei.
“Senti muito claramente que era preciso haver um abanão na sociedade”, disse o dr. Costa há dias, a rir de um povo submisso. Um abanão era útil, sim. Mas isso implicaria gente com vergonha na cara, e não uma máscara. António Costa, o Grande Tiranete, foi o pior que podia ter acontecido a Portugal, logo a seguir aos portugueses.

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