Alberto Gonçalves - OBSERVADOR
Do que os “democratas”
não gostam muito é da democracia. Gostam menos da democracia do que de Mário
Machado, que usam para fingir o contrário e para servir de medida das coisas
que divergem deles.
A entrevista
televisiva de um ex-presidiário com currículo racista continua a inspirar
alertas alusivos ao avanço do fascismo. Quem chegou a Portugal durante a semana
convenceu-se de que o país está praticamente nas mãos de “skinheads”, restando
apenas bolsas de heróicos resistentes na clandestinidade. Quem já andava por
cá, porém, hesita se deve confiar na histeria ou nos factos. Se escolher os
factos, estes garantem que a ideologia (?) do sr. Machado não possui
representação parlamentar e que o próprio PNR entusiasmou nas legislativas 27
mil eleitores, ou meio por cento dos votos. Não são números avassaladores.
Significa isto que a
nossa querida pátria está salva de extremismos perigosos? Pelo contrário. Um
sexto da AR, correspondente à vontade de um milhão de cidadãos, é composto por
comunistas de duas igrejas. Por sua vez, os comunistas aliaram-se ao segundo
partido mais votado, que aproveitou o arranjo, superior a 50% da AR, para
formar governo e mandar nisto. Entretanto, o partido mais votado em 2015
decidiu passar o último ano a implodir-se e, à “direita”, sobra o CDS, para os
que acham que o CDS é de direita e merece sobrar. Recear extremismos em
Portugal é o mesmo que Stevie Wonder recear a progressão da miopia. No fim de
contas, se as contas não forem feitas por sociólogos ou “activistas”, Portugal
encontra-se entregue à esquerda e, por inerência, à extrema-esquerda, ou, no
jargão em voga, os “democratas”.
Os “democratas”
influenciam a política, os costumes, os negócios que interessam e boa parte dos
“media”. Ainda assim, comportam-se como se fossem vítimas de forças opressoras,
as quais, embora imaginárias, não deixam de denunciar com valentia. Por um
lado, é um tique nervoso, herdado por contágio, tradição e décadas de “luta”
contra ditaduras que não viveram. Por outro lado, é uma estratégia também velha,
que consiste em disfarçar com horrores hipotéticos o horror autêntico que os
“democratas” defendem.
Em seu abono, é verdade que os “democratas” não discriminam todos os alvos do referido convidado da TVI: preferem concentrar-se no anti-semitismo, que elevam à respeitabilidade social mediante o gentil epíteto de “anti-sionismo”. É verdade que os “democratas” não embarcam no incitamento ao ódio e à violência, excepto sempre que incitam ao ódio e à violência sobre os blasfemos que não concordam com eles. É verdade que os “democratas” não abominam imigrantes, a não ser os avessos ao cliché manipulável, reaccionários que deviam regressar às pocilgas de onde vieram. É verdade que os “democratas” não maltratam homossexuais e mulheres, optando por delegar o trabalho e exaltar as culturas que, do islão ao abençoado “povo romani”, colocam aquelas subespécies nos respectivos lugares. É verdade que os “democratas” não toleram o sr. Trump ou o sr. Bolsonaro, nomes que invariavelmente surgem associados ao monstro extremista que aí vem, mas, se descontarmos chefes de cartel do gabarito do sr. Lula, quando é que os “democratas” toleraram estadistas eleitos? E sobretudo é verdade que os “democratas” detestam Salazar: em matéria de ditadores, gostam de psicopatas completos.
Do que os “democratas”
não gostam muito é da democracia. Aliás, gostam menos da democracia do que do
fascista Mário Machado, que usam para fingir o contrário e para servir de
medida de todas as coisas que divergem deles. Uma pessoa estima o mercado? É fascista.
Uma pessoa respeita a autonomia alheia? Fascista. Uma pessoa permite a
discórdia? Fascista. Uma pessoa preza a liberdade? Fascista, fascista,
fascista. No meio do berreiro, talvez passe despercebido o pormenor de que quem
não aceita a liberdade, a discórdia, a autonomia e etc. são os “democratas”. Os
“democratas” e os fascistas a sério, se é que vale a pena teimar nas
diferenças.
Notas de rodapé
Não me meto nos
distúrbios do PSD, mas tudo o que indignar o filatélico da Marmeleira, o jazigo
de Ângelo Correia e a irmã daquele comentador do Sporting deve ser devidamente
louvado.
O dr. Costa anuncia
“investimentos” de biliões na presunção de que o eleitor médio tem sete anos de
idade mental. Está enganado: tem cinco.
Do aeroporto Humberto
Delgado, em Lisboa, ao aeroporto António Guterres, em Faro, passando pelo
aeroporto Camilo Mortágua, em Beja, e pelo futuro aeroporto Mário Soares, no
Montijo, a metade sul do país será um imenso terminal. E terminal é a palavra.
Não me incomoda que o
prof. Marcelo telefone para programas de variedades, cartórios notariais ou
transexuais em negação. Só me incomodaria se o prof. Marcelo me telefonasse a
mim.
Uma senhora que
conviveu anos com um popular larápio sem nunca desconfiar da origem do
respectivo dinheiro quer agora saber quem pagou quatro ou cinco cartazes da
Iniciativa Liberal, liderada pelo meu amigo Carlos Guimarães Pinto. Por graça,
a dita senhora julga-se jornalista. Por sorte, escreve num epitáfio que se
julga um jornal.
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