BARROSO da FONTE |
«Nasceu fidalgo abastado e tornou-se «filho adotivo do
proletariado». Chamou-se Júlio de Melo Fogaça. Rivalizou com Álvaro Cunhal na
liderança dos comunistas, mas perdeu a luta no verão de 1960, quando passeava
com o seu amante e a PIDE o prendeu. O PCP transformou esse caso num tabu - que
agora se desfaz quase por completo»
Este é o lead
da recensão de oito páginas da revista Visão, nº 1337 de 24/10/2018,
largamente documentada e ilustrada. Na capa da revista, com a foto de Júlio
Fogaça, em fundo, lê-se: Os Segredos do líder-Tabu que o PCP apagou da sua
história. Dirigiu o partido e disputou com Cunhal a liderança, mas a sua
homossexualidade foi pretexto para a expulsão, num processo escondido até hoje.
Os detalhes, os documentos e as cartas inéditas».
Sempre alimentei o sonho de biografar, em livro, o 1º
Secretário-geral do Partido Comunista Português, Bento Gonçalves que nasceu em
Fiães do Rio e morreu, na década de quarenta, do século XX, no campo de
concentração do Tarrafal.
Como é que um
jovem de uma minúscula povoação das margens do Rio Cávado, se aventura a ir
para Lisboa, se envolve numa rara profissão, no Alfeite, aderindo às ideias
marxistas, tão raras nas gentes de Barroso?
Que
coincidências para que, por essa mesma altura, outro ilustre Barrosão: Piteira
Santos, tenha aderido às mesmas ideias marxistas?
E, ainda, Maria Eugénia Neto, nascida em 1934 na vila
de Montalegre. Casou com Agostinho Neto que, já depois de licenciado em
medicina, em Portugal, o acompanhou e aos filhos até à morte dele.
E, finalmente, mais um exemplo carismático, o de Maria
Helena Ataíde Vilhena Pereira, natural de Casas Novas. Casou com o seu colega de
curso, Engº Agrícola, Luís Amílcar Cabral, igualmente líder do PAIGC da
Guiné-Bissau.
Alertado pela recensão daquela Revista, consegui
adquirir o livro de Adelino Cunha sobre «o líder de origem burguesa que
desafiou Álvaro Cunhal e foi apagado da história do PCP».
Quatro filhos de Barroso e Alto Tâmega que se fizeram
ao mundo da Lusofonia, devolvendo mundos ao mundo, quando tinha chegado o tempo
de reconhecer a emancipação desses povos. Se a Visão me alertou
positivamente pela síntese crítica de J. Plácido Júnior, o livro de Adelino
Cunha, nas suas 318 páginas faz revelações fantásticas para quem gosta de
conhecer as mentalidades. A revolução Russa de 1917 foi um dos acontecimentos
mais importantes do século XX. Em1921 nasce o PCP que irá atrair centenas de
jovens dispostos a lutar por uma sociedade nova. Júlio Fogaça (pseudónimo da
clandestinidade de Fernando Ramos), e Américo Gonçalves encontraram-se pela
primeira vez. Aquele tinha 53 anos. Este apenas 25. «A destreza sedutora
daquele homem elegante, cinquentão, resultou ao aproximar-se do soldado
Gonçalves. Estávamos em Cascais, em Março de 1957. «Pela hora do jantar, já iam
os dois na direção da estrada do Guincho».
Seduzido pela
ideia de politizar os operários urbanos, o jovem fidalgo rural torna-se comunista.
Aos 28 anos é preso junto com Bento Gonçalves.
Estes três momentos-chave leem-se na Revista Visão.
Ao fim de cinco anos desterrado no Tarrafal, Fogaça, nomeada da Família que é
proprietária da Quinta do Porto Nogueira, em Alguber, Cadaval. Em 1941, sendo
discípulo de Bento Gonçalves, assume o cargo de Secretário que era ocupado por
BG. Em 1942 Fogaça volta a ser preso. E Cunhal sucede-lhe no cargo. Nas décadas
de 40 e de 50, Álvaro Cunhal e Júlio Fogaça alternam na liderança, sempre em
ambiente de rivalidade. Em 1960 Cunhal foge da Cadeia de Peniche e Fogaça é
expulso do PCP em 1961. Nessa altura o Transmontano de Montalegre, Bento
Gonçalves já tinha falecido. Mas essas três figuras foram relevantes na
instalação do PCP em Portugal. E já Edmundo Pedro nos seus três volumes de
Memórias, explicaram muitas das dúvidas que Domingos Abrantes, Carlos Brito,
Edmundo Pedro e vários outros esclareceram em livros, jornais, revistas e
canais televisivos.
Pessoalmente
conheci, bem de perto, Edmundo Pedro, através do Editor da Âncora, Batista
Lopes, ao longo dos seus últimos sete anos. Um Homem encantador. Um comunista
solidário que mais tarde aderiu ao PS. Visitei, com ele e outros autores, o
obelisco a Bento Gonçalves, em Fiães. Peregrinei com ele por Vila Pouca, Chaves
e Montalegre. Sempre me contou os primórdios do PCP. Deu-me as mais gratas
informações sobre quem mais me interessava: Bento Gonçalves. Nessa altura e
enquanto mantive viva essa memória, muitas vezes me apeteceu escrever sobre ele
e sobre aquelas duas distintas Transmontanas. Começo a duvidar que volte a ter
condições físicas para cumprir esse meu
desejo. E é por isso que mal vi anunciado este livro de Adelino Cunha, docente
universitário (1971), fui a correr à FNAC, adquirir esta obra que irá ser um
sucesso em leituras.
Sem comentários:
Enviar um comentário