Por baixo das vigarices do "sabes muito"
está sempre um desejo (precisamente) baixo.
Na expressão "sabes muito..." são as
reticências que mais falam. Porque em português não há elogios de borla. É verdade
que quando me dizes "sabes muito..." estás a confessar que ficaste
surpreendido com o muito que eu sabia e que isso produziu em ti um novo respeito
pelos meus conhecimentos.
Mas também estás a dizer que tu ainda sabes mais do
que eu e que é por isso que a minha tentativa de te ludibriar falhará sempre.
"Sabes muito...mas a mim não me enganas!"
O saber em questão é estritamente matreiro. É um saber
de golpes, fintas, encenações e aldrabices. São vinte seis volumes de manhas,
todos dedicados a métodos para enganar o próximo.
Este saber é muito valorizado - mais do que os outros
saberes. É por isso que tu sais-te melhor do "sabes muito..." do que
eu. Se o "sabes muito..." fosse colocado na primeira pessoa seria
"eu sei tudo o que há a saber sobre trapaças e fingimentos mas reconheço
que tu também não és nada mau nestas coisas".
O "sabes muito..." está relacionado com o
"perguntas bem" que em tempos já discuti. No "perguntas
bem" elogia-se a pertinência do perguntador, implicando que merecia uma
resposta à altura mas lamentando que o respondedor, infelizmente, não é capaz
de dá-la.
"A que horas abre o banco?" E responde-se
"perguntas bem. Não faço ideia".
Por baixo das vigarices do "sabes muito"
está sempre um desejo (precisamente) baixo. Enganas-me para me dar a volta,
para me seduzir, para disfarçar a tua preguiça ou ganância ou amor ao alheio.
E a inocência é saber pouco.
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