Todos aqueles que identificam a classe dos professores
com a sua representação sindical metem o odioso de tudo o que sentem pelos
sindicatos à frente da tentativa de perceber realmente se os professores têm
direitos ou não.
O debate em torno da célebre progressão automática dos
professores na carreira e da inexistência de recursos financeiros para pagar o
dinheiro que estes profissionais perderam ao longo de uma década tem primado
pelo tiro ao alvo. O mais fácil é bater nos professores. Todos aqueles que
identificam a classe dos professores com a sua representação sindical ficam-se
pelo óbvio: metem o odioso de tudo o que sentem pela pura lógica sindical à
frente da tentativa de perceber realmente se os professores têm ali direitos ou
não.
Antes de entrarmos pela questão da carreira ou da
questão financeira convém lembrar duas ou três evidências sobre esta matéria.
Pessoalmente, prefiro que os meus impostos paguem aos professores, paguem a
educação a que todos temos direito, financiem o sistema de educação do que
todos os desperdícios que a má gestão do erário público, a corrupção, o tráfico
de influências e o nepotismo têm gerado. Não falo só da banca e do regabofe a
que temos assistido. Falo da economia rentista criada na saúde, nas infra
-estruturas rodoviárias e outras, na pornografia da substituição de serviços
públicos de excelência por negociatas com os grandes escritórios de advogados.
Poderia falar também no crime que foi o código da contratação pública,
preparado, pelo menos entre 2008 e 2012, para enquadrar as relações milionárias
do Estado com as construtoras nos grandes contratos de empreitada sempre com o
primeiro a perder. Seja no contrato inicial, seja na omissão ou erro – coisa
que ninguém sabia interpretar – que se gerava por dá-cá -aquela-palha.
Sim, prefiro pagar o que esta sociedade deve aos
professores e a muitos outros profissionais do Estado, como polícias,
enfermeiros, magistrados e tantos outros, que estão na primeira e na última
linha do serviço à comunidade. Pode faltar perfeição, brio ou lá o que for em
alguns deles, mas esse não é o traço identitário que retenho da função pública
portuguesa. O que retenho, no debate político sobre o sector público, há muitos
anos, é que mesmo os discursos mais liberais necessitam de um Estado gordo, não
em funcionários mas em poder de concessão e adjudicação, para poderem continuar
a vampirizá-lo. Foi assim nas maiorias do PSD sozinho ou com o CDS, mas também
na do PS. Essa é a maioria política do chamado Bloco Central dos Interesses que
aparece, ao mesmo tempo, a diabolizar as reivindicações dos professores nas
televisões, através dos seus representantes no comentariado político.
Uma coisa é certa: tanto na questão da carreira, da
avaliação, ou do dinheiro, nenhum professor ou sindicato apontou armas aos
decisores políticos. Todos os problemas, do congelamento à incapacidade de
descongelar, foram criados por governos que não souberam ou não quiseram
renegociar com seriedade. Pelo contrário, reforçaram expectativas legais que já
existiam e decorrem da mera aplicação das leis próprias de um Estado de
direito. Transformá-las num labirinto que resulta da ideia de que não há
dinheiro é uma desonestidade política que tenta enganar-nos a todos,
professores e eleitores. Não é para isso que a política serve. Os professores
têm as costas muito largas quando se trata de sacudir a água do capote
governamental.
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