BARROSO da FONTE |
1.
Na edição do Diário de Notícias, de 7/10, mas com base na Lusa, escreve-se, em
manchete, que «O ministério Público já
abriu um inquérito ao caso da suspeita e fraude eleitoral em Montalegre, onde,
nas últimas eleições autárquicas, centenas de emigrantes foram recebidos por um
autarca no aeroporto Sá Carneiro e transportados para as autarquias onde
votaram», regressando, de imediato aos países de onde vieram com transporte
e refeições pagas. Segundo se lê na mesma fonte «o caso foi revelado pelo programa “Sexta às 9” da RTP que indicava
que esses emigrantes tinham à sua espera, no aeroporto, o presidente da junta
de freguesia de Meixedo e Padornelos, Ricardo Moura, recandidato nas listas do
PS, no concelho de Montalegre. O programa mostrava que a entrada dos emigrantes
nos autocarros que os aguardavam, era coordenada pelo autarca» que viajava no “lugar do crime” pelo facto de enjoar».
Continua a ler-se no DN que «no domingo
seguinte, dia da votação, logo à abertura das urnas, os mesmos emigrantes foram
encontrados, pelo “Sexta-Feira às 9”, a votar na freguesia, onde o presidente
de junta acabou por ser reeleito: a União de Freguesias de Meixedo e de
Padornelos». Estes acontecimentos foram filmados, editados e
tele-visionados por milhões de cidadãos, nesses dias. E ainda circulam, e vão
perdurar, online, assim como vai acontecer, com o debate radiofónico
pré-eleitoral, entre os três candidatos, emitido pela rádio Montalegre e
coordenado por um locutor flaviense que, sendo um antigo radiologista e
repórter, sediado em Vila Real, não teve tarefa fácil nessa noite infeliz para
todos os intervenientes. Foi mau de mais para a região de Barroso, para quem o
viu e ouviu e até para as futuras gerações que hão-de lembrá-lo, para além
delas. Uma pobreza franciscana, a todos os níveis, quer na linguagem, quer nos
gestos, quer na chusma de palavrões, de infâmias, de jaculatórias, mais
próprias das sextas-feiras 13, do que de representantes do povo ordeiro,
sensato, prudente e calmo. Foram feitas nesse fórum afirmações de quem devia
dar exemplos de civismo, de tolerância, de respeito e de democracia, através de
palavras e de gestos que ofenderam, mais do que reconfortaram, os
destinatários. Algumas dessas afirmações foram graves, por falsas, maliciosas e
descontextualizadas. E não só para os presentes, como para com os ausentes,
como a seu tempo se verá.
2.
Depois dessa tragicomédia mais apropriada para a bruxaria da «Sexta-Feira 13»,
que esteve bem mas que não apagou a memória desse debate, da excursão eleitoral
e das evidências reveladas pela RTP, no dia 6 de Outubro, que já estão a ser
alvo de averiguação judicial, esperava-se que no ato de posse dos eleitos
locais, os excessos linguísticos, as injúrias, as mentiras e as dislexias
mentais, dessem lugar a palavras apaziguadoras, toleráveis, civilizadas e
coerentes, para uma convivência serena nos quatro anos seguintes. Aconteceu o
pior. Um discurso escrito, lido e apresentado em tom que agradou, naturalmente,
aos bem-intencionados, que batem palmas de boa fé, mas que desagradou a muitos
convidados, aos neutros e até às crianças que perguntaram pelo significado dos
foguetes, em semana e dia de luto nacional, pelas vítimas dos incêndios. E
desagradaram, sobretudo, aos vereadores e deputados municipais que deveriam
ouvir uma mensagem serena, pacificadora e propícia a preparar um ambiente de
fraternidade telúrica e convivencial para os quatro anos de mandato. As tomadas
de posse dos políticos deverão primar pela serenidade, pela prudência, pela sã
convivência social. Não pode ser um ajuste de contas, pelo que se deveria ter
dito e ficou por dizer, ora no debate a três, ora nas 48 horas de reflexão
obrigatória. Foram seis páginas penosas, provocatórias e indiciárias de que o
reeleito edil se robusteceu nesta segunda vitória para incentivar os
adversários, para inviabilizar acordos e para unir os barrosões. Impossível e
inédito!
3.
Orlando Alves, mesmo que tente regenerar-se dos maus fígados que mostra perante
quem não vá com ele à missa, dificilmente o conseguirá. Teve alguns mestres, mesmo
no seu partido, que poderia seguir, depois das campanhas eleitorais. Um
qualquer presidente da Câmara, de Assembleia Municipal, de Governo, pelo facto
de ter garantidos os votos da sua bancada, deve saber que não está livre de
precisar do apoio da oposição para obviar projetos comuns. O Alto Tâmega é
epicentro de seis outros concelhos que nas últimas duas décadas concretizaram
empresas comuns que precisam, entre si, da oposição. Orlando Alves sabe disso
melhor que ninguém, porque é um político profissional. Está enganado se há
situações como este flagelo dos incêndios que obrigam a classe política a
unir-se em nome do bem comum. Nas decisões municipais que se tomam nas reuniões
mensais ou quinzenais e que são obrigatórias, tanto peso tem o voto da oposição
como do grupo que gere a Câmara. Cada um dos sete vereadores teve o mesmo
número de eleitores. O PS teve cinco eleitos e a coligação apenas teve dois. Já
antes fora o contrário. Mas todos foram eleitos. E, a partir da instalação da
Câmara, até final desse mandato, são todos vereadores, merecendo o mesmo
respeito democrático. Perante palavrões de «boca
suja», «aldrabão», «cale-se seu reles», «seja educado seu reles», etc, qual será
a predisposição do vereador Carvalho de Moura para manter em público, como em
privado, a decência e cortesia que são atributos indispensáveis à cidadania
mais elementar?
4.
Para quem não ouviu, nem tem acesso ao site da Câmara, onde estão gravadas, em
papel timbrado da autarquia, as seis páginas do discurso de Orlando Alves, vale
a pena obtê-lo e guardá-lo. Talvez esse estilo seja útil ao Ministério Público
quando elaborar o relatório acerca do tom, do ambiente linguístico e da riqueza
verbal e ética do grande beneficiado da eventual fraude eleitoral que mereceu
caixa alta no programa da televisão pública «Sexta às 9». Pelas piores razões
Montalegre correu mundo, como exemplo a não seguir, numa democracia plena. Esta
mensagem que deveria ser uma espécie de água-benta para purificar, mais lembra
lixívia que se usa, por engano, nos esgotos ou em roupa manchada. Mas foi o
contrário, como iremos ver em crónicas posteriores. E mais do que isso: talvez
o reeleito Presidente da Câmara de Montalegre venha a ser vítima do grito de
vitória, quando afirma que os «ajustes
diretos são instrumentos legais de que dispomos para que o dinheiro fique na
nossa terra». Assim têm feito e «assim
iremos continuar». Pela boca morre o peixe. Talvez esta bicada pretenda
justificar «o polvo» que o jornal
Notícias de Barroso levantou na edição 523. A resposta a essa decisão, que
propõe para ser prática corrente, foi condenada no último «Sexta às 9» quando
se soube que, através de um contrato desses, pagámos todos 1 milhão e 460 mil
euros a uma empresa de aviões que nem chegaram a levantar voo por causa da chuva.
Os ajustes diretos apenas são legítimos em situações excecionais e até
montantes condicionados. As leis europeias existem para serem cumpridas como as
nacionais. O uso dos ajustes diretos apenas está previsto para casos raros e em
situações muito especiais. Incitar à sua generalização, num concelho e numa
cerimónia deste cariz, é estranho que o presidente reeleito fatigue os
convidados com pormenores técnicos que só visam desviar as atenções para
eventuais casos de consciência política. Em dia de luto nacional deitar
foguetes de artifício, para anunciar a festa da provocação, de que estas seis
páginas são prova clara de insofismável revivalismo, é um ultraje e uma afronta
à maioria dos Barrosões: aqueles que não votaram e àqueles que perderam. Logo
no 4º paragrafo, Orlando Alves ofende essa maioria que não teve direito a
defender-se. Eis o epitáfio do presunçoso Presidente: «Passada a hora dos festejos e manifestações de júbilo com que os
barrosões tributaram os vencedores enquanto os vencidos afogavam a mágoa
na promoção de danças eróticas de algum mau gosto e dose farta de insanidade...»
Este autarca Barrosão, nem depois desta prova anti-democrática a que terá de
responder perante o Ministério Público, teve a sensatez de evitar a calúnia que
as palavras sublinhadas encerram, as tais «danças
eróticas de algum mau gosto e dose farta de insanidade». Ao que chegámos!
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