"Com este
crescimento eu teria, no mínimo, um défice zero"
Daniel Bessa diz que o país não largou a
austeridade e se os resultados da economia o surpreendem, explica-os não pela estratégia
do Governo mas pela dinâmica das exportações. O que mais o incomoda é a dívida.
Tanto que, se mandasse, aplicaria toda a folga orçamental na conquista de um
défice zero
13 de
Outubro
Daniel Bessa escreveu uma carta a Pedro Passos Coelho agradecendo-lhe o seu
mandato no Governo. “Ninguém na minha vida governou numa situação tão difícil”,
explica. Sobre o futuro do PSD, elogia Rio, mas diz que “a caricatura maior que
tem de combater é a de que quer ser o número dois de António Costa”. Para isso,
diz, “já há Catarina Martins e Jerónimo e Sousa”.
O que espera da nova liderança do PSD? A herança mais liberal de Pedro
Passos Coelho parece estar comprometida?
Eu não sei quem vai ganhar, não faço ideia. Há no PSD muita gente que não
quer Rui Rio. Fiquei surpreendido, mas a vida é o que é. É preciso alguém que
se lhe oponha, quase que não interessa quem – Luis Montenegro, Paulo Rangel.
Zero de programa, nesta discussão.
Mas não conhecemos ainda o programa de Rui Rio
Talvez fizesse algum sentido que as pessoas antes de estarem com essa
preocupação esperassem um bocado. O que vejo é uma recusa da pessoa, não sei
bem porquê. Acho isso um bocadinho primário.
Não será porque, pelo que se conhece de Rui Rio, haja receios de que ele
coloque o PSD mais ao centro?
Há uma questão que acho muito importante e esse é um grande tema político
que é a ideia que se criou de uma relação privilegiada com António Costa.
Ou seja, a iminência de um Bloco Central?
Eu penso que em determinados momentos o Bloco Central pode ser necessário.
Portugal teve um Bloco Central quando se apresentou perante a troika. Fomos lá
dizer que estávamos todos de acordo, com excepção do Bloco e do PCP. Em certos
momentos isso é necessário. Em condições mais normais, como as actuais, não me
parece que isso seja positivo. O facto de Rui Rio ter uma boa relação com
António Costa pode querer dizer que ele está mais disponível para os ditos
acordos de regime. A caricatura maior que Rui Rio tem de combater é a de que
quer ser o número dois de António Costa. Para isso já há Catarina Martins e
Jerónimo e Sousa. É um espaço já muito ocupado.
Portanto está convencido que uma vitória de Rui Rio será bom para o futuro
da política portuguesa?
Sabe, isso parece que estou aqui já a pôr uma ficha qualquer num futuro
qualquer.
Não era essa a intenção…
Eu sei, eu sei. Eu não disse nada a Passos Coelho quando ele chegou lá. E
senti-me na obrigação de lhe dizer alguma coisa na semana passada, quando se
foi embora.
O que lhe disse?
Disse-lhe, enfim, não vou dizer tudo, até porque há elementos pessoais, mas
disse-lhe que estava agradecido. Ninguém na minha vida governou numa situação
tão difícil. Vi-o na televisão, a dizer que era o fim de um ciclo, ninguém me
obrigava a isso, ele não estaria à espera de coisa nenhuma e eu senti-me na
obrigação de dizer àquele senhor que lhe estava agradecido. Houve muita gente a
dizê-lo e alguns ainda não dizem mas dizem que um dia destes vai ser dito. Eu
acho é que Pedro Passos Coelho em alguns momentos falou de mais.
Quando disse por exemplo que queria ir além da troika?
Esse é o momento fatal. É ingénuo. Ou jactante.
"Intervenção externa não
foi um falhanço"
Mas é só isso ou não havia ali uma vontade de acreditar na destruição
criativa ou nas teorias da austeridade expansionista?
Seria ele um neoliberal? Por exemplo, o tema dos feriados. Eu acho que
Portugal tem feriados a mais. Acho tão normal partilhar os lucros como factor
de mobilização como trabalhar ao sábado sem suplemento de remuneração como, em
caso de necessidade, trabalhar mais quatro dias por ano. Mas há mais. O não a
Ricardo Salgado foi Passos Coelho que disse e estou agradecido por isso, acho
que foi preciso uma coragem enorme. A forma como geriu a crise Paulo Portas é
uma coisa admirável. Isso nós devemos-lhe. Acho que, no essencial das medidas
que tomou, houve uma preocupação de não agredir muito os mais pobres. O salário
mínimo não foi mexido. Os impostos sobre as classes mais baixas não subiram.
Houve uma preocupação de os tentar defender. Vi aumentar os impostos sobre os
ricos. Se Passos é neoliberal o que vou dizer de Trump, que vai descer os
impostos sobre os ricos? Vi, isso sim, o que hoje se consideraria uma enorme
falta de habilidade porque há gente a fazer o mesmo dizendo outra coisa. E
portanto desse ponto de vista, esse pecado ele tem.
Rio, Rangel ou Montenegro seriam uma boa solução. Mas não mencionou Santana
Lopes. Será um lapso?
Não, Santana Lopes tem uma experiência de governo que eu acho que não
correu bem. É por isso que não o refiro. Acho que Jorge Sampaio fez muito bem
no momento em que o nomeou primeiro-ministro e também fez muito bem no momento
em que acabou com aquela solução governativa.
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