domingo, 29 de outubro de 2017

A Catalunha e o reino de Aragão


A moderna Catalunha ou Catalunya tem a forma de um triângulo. A parte superior do mesmo segue a fronteira dos Pirinéus e dá para o antigo condado francês de Foix. O lado costeiro vai até Valência, passando por Barcelona e pela Costa Dourada. O lado interior liga a parte mais a sul do litoral ao ponto mais ocidental, nas montanhas.
São vários os vizinhos deste antigo condado, e revelam complexidades geográficas, históricas e linguísticas.  A oeste de Pallars localizam-se Sobrabe e Ribagorza (língua espanhola); a norte, situa-se Vall d’Aran, apenas acessível por túnel, e embora situado no lado francês, pertence a Espanha. Aí se fala uma língua peculiar que combina elementos bascos e neolatinos. A Leste situa-se o Principado de Andorra, um dos estados mais antigos da Europa. Desde 1278.
A sul do Perpinhão é o melhor local para compreender essa região geográfica – na fronteira fraco-espanhola. O mediterrâneo ilumina-nos o rosto, à direita surge a cordilheira para Andorra e para os Pirinéus Centrais. O Rossilhão e a Cerdanha ficam atrás de quem observa, seguindo-se o Languedoc. E à frente as íngremes montanhas da Catalunha. Barcelona não é visível.
Tanto Paris como Madrid, à altura da formação destas regiões, estavam longe. E os habitantes de ambos os lados dos Pireneus tornaram-se súbditos de um único rei, e beneficiários de uma única comunidade politica.
O nome desse reino deve-se à existência do pequeno rio de Aragão. Foi ali, nos finais do primeiro milénio, que os senhores cristãos, iniciaram a Reconquista contra os Mouros. Esse conjunto de senhorios cristãos (grandes e pequenos), nasceu quando os Franccos atravessaram os Pireneus para travar o avanço do Islão. A campanha de Carlos Magno, em 778, ficou registada num poema épico escrito em francês antigo, a Canção de Rolando.
A retirada de Carlos Magno de Saragoça culminou no combate heróico do desfiladeiro de Roncesvales, que imortalizou Rolando e Oliver.
O perigo do avanço do Islão, obrigou o rei dos Francos a criar quatro zonas-tampão militares: a Marca de Gasconha, a Marca de Toulouse (que incluía Andorra), a Marca de Gótia, e a Marca Hispânica, constituída por 16 condados, controlados por comissários militares (comitatus). O primeiro foi Rossilhão, em 760, e o último foi Barcelona, em 801. O elemento visigótico era bem visível nas gentes destes condados. Foi nesta mescla de culturas franca, ibérica e gótica, que a Catalunha derivou a sua língua e o seu carácter.
Os Francos acabaram por retirar dando inteira liberdade aos senhores cristãos dos Pirenéus. Uma das senhorias mais importantes da antiga Marca hispânica centrava-se no Condado de Barcelona, que deixou de estar subordinado ao império dos Francos, depois de os Carolíngios darem lugar aos Capetos. Outra, era o domínio de Sancho, o Grande, de Navarra (m. 1035), que governava um extenso território de ambos os lados dos Pirenéus. A sua capital era Pamplona, localizada no coração basco, que nunca se tinha submetido ao domínio estrangeiro. Sancho teve cinco filhos, e assumiu o titulo de “Rei de todas as Espanhas”, tornando-se, de seguida, “Imperador de Espanha”. Após a sua morte, seu filho Ramiro apoderou-se de Sobrabe e Ribagorza, unindo-os a Aragão, sendo proclamado rei. O reino de Aragão não sofreu contestação durante um século. A cidade de Jaca, antiga base carolíngia, foi adoptada, em 1063, como sede do primeiro bispado aragonês.
No inicio, o jovem Reino de Aragão tinha poucas hipóteses de sobrevivência, entalado que estava entre dois reinos poderosos como Castela e Leão, o forte emirato de Saragoça e, para além de Ribagorza, o flanco oriental da antiga Marca, dominado pelos condes de Barcelona. Este sentimento de insegurança, levou-o a unir forças com os seus vizinhos. Primeiro com Navarra, depois com Castela e finalmente com Barcelona.
Os aspectos históricos e culturais iniciais de Aragão foram muito específicos. Começou como pátria da tribo celtibérica pré-romana dos hergertes, nunca pertenceu à região basca e nunca foi sujeito a um povoamento mouro considerável ou às influências francas evidentes na Catalunha. No conjunto dos idiomas da Península, a sua língua era distinta. Mas não possuía o potencial comercial da Catalunha.
Aragão teve um papel muito importante na Reconquista e, em alguns casos, como em 1064, aliado à Catalunha.
Depois da morte de Afonso I, o Batalhador, que por casamento estava ligado a Castela, Aragão (num processo complicado que agora não interessa explorar) teve uma herdeira, Peyronella, filha do irmão monge de Afonso. Em 1137, em Saragoça, com um ano de idade foi prometida a Berengário IV de Barcelona, de 24 anos de idade. A menina permaneceu rainha e o marido adoptou o título de “príncipe de Aragão”. Num segundo tratado estipulou-se que Aragão e Barcelona mantivessem os costumes, instituições e títulos e que na eventualidade da morte de um dos titulares, ambos os Estados seriam transferidos para o outro. O filho de Petronilha e Berengário, Raimundo, ao subir ao trono, descartou o seu nome catalão e assumiu o titulo de “Afonso III de Aragão e I de Catalunha”.
Esta união do reino e do condado teve consequências. Ao mesmo tempo que o recém-emergente reino de Portugal, Aragão-Barcelona constituiu um contrapeso significativo a Castela. Não foi por acaso que a filha mais velha do principe Raimundo e da rainha Petronilha foi dada em casamento a Dom Sancho I, o Povoador (r. 1185-1211), o segundo rei de Portugal. Contudo, o reino e o condado continuaram a ser parceiros estranhos. Ambos preservaram as suas próprias leis, cortes e língua. O aragonês não era muito diferente do castelhano, já o catalão se parecia com o occitano do Languedoc, região onde foram perseguidos os Cátaros. Barcelona fundada pelo irmão de Aníbal no século III a. C. e libertada dos mouros por Carlos Magno, era muito mais venerável do que Saragoça. A Casa Berengário, sucessora de uma linhagem de 24 condes de Barcelona desde o principio do século IX, era mais importante do que a de Ramiro. Desde a época do primeiro conde, Bera (r. 801-820), filho de um seguidor de Carlos Magno, Guilherme de Toulouse, que o seu território era sólido de terras. Ou seja, a parte catalã do reino conjunto era maior, mais antiga e mais rica.
Esta monarquia complexa, surgiu na cena europeia na época dos trovadores e o culto do “amor cortês”. Situava-se no coração de uma região formada pela Aquitânia, o Languedoc e a Provença, onde floresceram os trovadores.
Posto isto, conclui-se que a Catalunha em si, nunca foi um estado soberano – independente. Mas manteve sempre as suas características com autonomia.
Mas isso é assunto para ser resolvido pelos Espanhóis.
Contudo, advertimos para o seguinte: O que será da Europa se os antigos condados e reinos formados depois da desagregação do Império Romano, resolverem agora pedir a independência?


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