Manuel Villaverde Cabral - OBSERVADOR
Também no Novo Banco o governo optou,
como de costume, por adiar os verdadeiros problemas que estão por resolver.
Prefere minimizar os custos no curto prazo enquanto espera por um milagre.
É certo que actual «geringonça» que nos
governa também é responsável pela crise bancária portuguesa mas não foi ela que
a criou. Essa crise vem de longe e é evidente que a crise financeira de 2007,
em que Portugal e boa parte da Europa do Sul continuam mergulhadas, apenas
revelou a dimensão abissal dos problemas em que os bancos portugueses já
estavam mergulhados. Foi o enorme conluio interno e externo fabricado pelo
governo Sócrates que criou a bolha de «imparidades» em que a chamada banca
nacional continua a dissolver-se praticou, infiltrando os bancos e as grandes
empresas rentistas com gente sua, aliando-se com o polvo em que se tornou o BES
e alargando os tentáculos da finança portuguesa a sócios estrangeiros tão
suspeitos como Angola, a China e o próprio Brasil.
Este último caso da entrega sem controle
do que restava do empório BES a um «fundo abutre» norte-americano que dá pelo
nome peculiar de «estrela solitária» arrisca-se, aliás, a não ser o último. É a
isso que leva a crer o silêncio mortal do governo do PS sobre o que se passa no
Montepio e que coisa boa não é de certeza. Quanto ao «Novo Banco», nem de venda
se trata propriamente, mas de entrega parcial e temporária que seja, mediante
uma prometida capitalização de mil milhões de euros coberta pela garantia de
mais 4 mil milhões eventuais pelo Estado português ou, o que vem a dar no
mesmo, pelo famoso Fundo de Resolução Bancária que reembolsará tal garantia nas
próximas décadas… Directa ou indirectamente, todas as perdas que venham a ser
registadas ficarão na prática entregues aos contribuintes portugueses, os quais
já têm de tapar os buracos que não cessam de surgir, incluindo o prometido
reembolso aos chamados «lesados» do BES…
É bem possível que o fundo
norte-americano só queira açambarcar o imobiliário das Amoreiras e do Marquês
de Pombal, como proclama Francisco Louçã, mas tudo foi efectivamente feito para
nos espantarmos com esta pseudo-venda, que o anterior governo tinha aliás
recusado. É certo que este último também não arranjou alternativa e, por isso,
o caso se arrastou de tal modo que as perdas absorvidas desde a resolução de
2014 foram tais que os 5 mil milhões de euros entregues então pelo Fundo – 4
mil dos quais emprestados pelo Estado a 30 anos – levaram sumiço desde então.
Nas explicações dadas pelo Banco de
Portugal na véspera da entrega do «Novo Banco» ao Lone Star,
ainda se acenou com a vaga promessa de o Estado vir a vendê-lo de novo, se e
quando o novo proprietário despachar o negócio entretanto.
Na realidade, o governo do PS continua
não só a omitir todos factos relativos a esta estranhíssima operação como
oculta a verdadeira razão que o obrigou a tal. Com efeito, já na primeira
tentativa de venda do ex-BES o anterior governo recusara as propostas de bancos
activos em Portugal, como o Santander e o BPI, com o pretexto de oferecerem
pouco dinheiro mas, na verdade, porque certa opinião pública veria nisso a
entrega da nossa banca aos rivais espanhóis… O governo de então viu-se assim
obrigado a desistir da venda a fim de não ceder o «maior banco privado
português» a um «fundo abutre»!
Com efeito, basta consultar o «site» desta «Estrela Solitária» para nos
darmos conta de que o Lone Star não é um banco. Esta palavra não figura aliás
no site: este menciona apenas os «activos de perto de 1.300 ‘bad banks’», pois
aquilo de que se trata é, na realidade, um conjunto de fundos que – cito – «procura
oportunidades em mercados desenvolvidos que sofreram crises económicas e/ou
bancárias». Alimenta-se pois de carne podre e, a seguir, explica o que faz com
os activos comprados: não esconde ao que vem…
Sendo assim, repito, por que razão se
apressaram António Costa e Mário Centeno, com o habitual beneplácito do
Presidente da República, a fechar um negócio destes? A verdadeira razão só pode
ser uma. O risco de, a breve prazo, visto ninguém querer comprar o ex-BES, a UE
obrigar o governo a liquidar o banco e isso teria muito maiores custos a curto
prazo. E são esses custos de curto prazo que o actual governo não pode pagar
sem aumento do défice e da dívida, cujos juros não baixarão enquanto o futuro
da UE não estabilizar – se estabilizar – depois das várias eleições nacionais
deste ano e da resolução do Brexit!
A própria nacionalização e a eventual
fusão com a Caixa Geral de Depósitos, que encantariam os aliados do PS e muitos
soberanistas iludidos, foram afastadas, desde logo por falta de dinheiro mas
também para não desagradar ainda mais às agências de rating. Em suma, o governo
optou, como de costume, por adiar os verdadeiros problemas que estão por
resolver. Em vez disso, continua a minimizar os custos no curto prazo do défice
e da dívida, enquanto espera por algum milagre! Mas fontes tão abalizadas e
insuspeitas como o antigo ministro das Finanças do PS, Teixeira dos Santos, que
acabou por fazer cair Sócrates, não tem dúvidas: vamos todos pagar a conta!
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