JORGE LAGE |
Depois,
passados longos e longos minutos ouvia-se a contra-senha: - Já bou!... Era o
sinal de esperança e de certeza de uma noite dormida debaixo de telha.
Mais
uns minutos lobrigou um vulto do lado de lá do rio que desentupia os bofes com
umas tossidelas e os passos a estremunhavam a terra batida. Por fim rangiam os
cadeados a ser atirados contra as travessas do casco da barca. A barca mexia-se,
o ferrão do bareiro chapeava a cada bareirada para a frente e um gemido
esforçado do Bnadito, e mais outro e estava no ancoradouro de lá: - Deus nos dê
boa noute! – Boa noute nos dêa Deus!, E fizeram a viagem de regresso.
Tenho
saudades da Casinha era residência do barqueiro a travessia estava sempre
garantida. O Ti Bnadito ou o Ti João Pedro, sem resmungarem, davam a barca a
qualquer hora do dia ou da noute, algum retardatário da «Bila», a não ser que o
Tuela se enfurecesse e fosse de monte a monte, em que eram precisos dois ou 4
barqueiros, de bareiros bem retesados.
A
Casinha era um pequeno e exíguo casebre onde dormia o barqueiro. Sucedeu aos
dois últimos barqueiros, com barco próprio, o Acácio da M.ª Rosa e depois, da
(companheira) Estrela.
Ainda
tenho algumas saudades da Taberna do Policarpo e da filha Gracinda, nunca os vi
de mau humor, sempre agradáveis, para a gente da minha aldeia.
Tenho
saudades de ver os carros de bois carregados entrarem na barca passando por
cima de duas grandes pranchas movediças e depois ser alavancada rumo à outra
margem. Dos rebanhos de gado a atravessar na Barca grande, bem enterrada na
água, carregada de canhonas e cordeiros que iam para a feira (dos 3, 14 ou 25).
Chelas
era um pequeno porto de fluvial, que antes da construção da Ponte da Formigosa
e das camionetas de mercadorias entrarem em Mirandela. Por ali se escoava
grande parte dos carretos que vinham da corda de Cabanelas até Vinhais.
Chelas
tinha uma estação de carretagem e escoamento dos produtos agrícolas.
Hoje
o que me dói mais é a memória de legado carregado de história local ser
ignorado. A toponímia da ponte foi infeliz, como deixa muito a desejar a que
assinala a maioria das ruas e largos. A toponímia é uma janela luminosa da
história local.
Jorge
Lage – jorgelage@portugalmail.com– 24NOV2016
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