sábado, 24 de dezembro de 2016

A saga portuguesa no Índico seiscentista analisada e avaliada por Roger Crowley


“Conquistadores” é um daqueles livros que se lê de uma penada. Escrito por Roger Crowley, historiador inglês, tem o mérito de nos contar trinta anos dessa história, como se fosse uma ficção. Mas não é, o académico inglês fundamenta-se nas observações in loco dos “cronistas” que acompanharam as descobertas, assim como em fontes como João de Barros, Damião de Góis, Pêro Vaz de Caminha, Fernão Lopes, Damião Peres, entre outros. Para além dos autores modernos estrangeiros e, sobretudo, em fontes primárias. Como não poderia deixar de ser por parte de um académico. E ao mesmo tempo, como vem transcrito no Daily Telegraph “… recupera o papel de Portugal como pioneiro do primeiro império colonial”, dando “vida aos exploradores portugueses” (Publishers Weekly).
Em Agosto de 1483, Diogo Cão e os seus marinheiros, fustigados pelos ventos, levantavam na costa actual de Angola, um padrão de pedra que assinalava a sua passagem por aquelas terras. Foi um momento que exigiu décadas de esforço. Esta e as expedições que se seguiram até atravessar o Cabo Bojador, eram modestas. Dois ou três barcos, comandados por um fidalgo da casa do Infante Dom Henrique. As caravelas de vela latina transportavam um reduzido número de soldados, com limitação de alimentos, dificultando as viagens marítimas prolongadas.
Portugal era um país pequeno e empobrecido, periférico aos assuntos europeus, e isolado por Castela, mas em Ceuta, os conquistadores portugueses tinham vislumbrado um mundo novo. Um mundo que lhes abria as perspectivas anunciadas por mapas medievais criados em Maiorca por cartógrafos judeus que representavam rios reluzentes, que permitiam o acesso ao reino do lendário Mansa Musa (rei dos reis).
Subjacente ao interesse africano, juntava-se o sonho antigo de uma cristandade militante: flanquear o Islão, que bloqueava o acesso a Jerusalém e às riquezas do Oriente.
Dom João II nomeia então Bartolomeu Dias comandante de uma próxima expedição. E ao mesmo tempo coloca em terra espiões com instruções especificas de se dirigirem ao oceano Índico por terra: Pêro da Covilhã e Diogo de Paiva. Roger Crowley descreve-nos a cena como se estivéssemos a apreciar um filme de espionagem. Entretanto Colombo começava a dar nas vistas.
Explorada a costa africana, Dom Manuel I que havia subido ao trono com a morte de Dom João II, incumbe Vasco de Gama, que se havia dedicado a assuntos de corsário e pirataria no mediterrâneo, de dobrar o Cabo das Tormentas.
A forma como os portugueses aproveitaram os ventos para dobrar o Cabo, as vicissitudes da viagem, as doenças (escorbuto), as mortes, os naufrágios e os primeiros dias já no Índico, são narrados pelo académico inglês, como se de um filme de acção se tratasse.
O Índico fora, ao longo de milénios, a encruzilhada do comércio mundial. Nele se passearam em paz os barcos enormes do imperador chinês, Yongle, da dinastia Ming. Os portugueses, porém, viriam com uma nova visão e uma nova postura. Com uma artilharia poderosa fabricada por engenheiros alemães, e o conhecimento marítimo adquirido pelos sábios que rodeavam o rei português, impuseram uma nova forma de estar e uma nova táctica de guerra. Arrasaram cidades e povos, mas lutavam com honra e eram generosos para quem lhes era leal.
No meio da inveja e da corrupção, os portugueses conseguiram conquistar e manter (durante séculos) o primeiro império global porque os seus principais capitães e homens como Vasco da Gama, Cabral, Francisco de Almeida e Afonso de Albuquerque eram incorruptíveis. Nunca prejudicaram os seus homens e companheiros, e dedicaram-se inteiramente à causa do Estado (da coroa).
Roger Crowley diz-nos no final da narrativa: “Tal como em todas as iniciativas imperiais, a História julgou as descobertas e as conquistas portuguesas de forma parcial. Albuquerque, apesar da sua ferocidade, aderiu a um ideal de justiça robusto” (p.356). Remata que os portugueses “com os seus canhões de bronze e frotas capazes”, uniram o mundo, foram os mensageiros da globalização e da idade cientifica dos descobrimentos. E conclui no epílogo (memorável): “nunca param quietos num sitio”. Faz, finalmente, uma referência aos pasteis de Belém, polvilhados com canela.  Armando Palavras

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