Henrique Neto – Diário de Noticias
Reconfiguração da banca em Portugal. Foi a política que conduziu Portugal para mais de uma década de crise, fruto de um enorme desperdício dos recursos naturais, como foi a política que permitiu destroçar o nosso sistema financeiro.
Reconfiguração da banca em Portugal. Foi a política que conduziu Portugal para mais de uma década de crise, fruto de um enorme desperdício dos recursos naturais, como foi a política que permitiu destroçar o nosso sistema financeiro.
Em economia há matérias que por serem
demasiado evidentes deveriam gerar um consenso nacional. Enumero algumas dessas
matérias elegendo o crescimento da economia como o mais óbvio desafio da actual
conjuntura económica portuguesa, sem o que dificilmente resolveremos os outros
desafios, como o investimento, a dívida, a sustentabilidade da Segurança Social
ou a eliminação da pobreza. Resta pois saber o que poderemos fazer para
melhorar substancialmente o crescimento da economia portuguesa.
Em primeiro lugar é essencial consensualizar
uma estratégia nacional clara e um modelo económico consistente, de forma a
evitar que caminhemos em círculos como tem acontecido. Relativamente à
estratégia, adoptaria a síntese contida na carta magna da competitividade de
2003 da AIP, "Estratégia euro-atlântica", cujos objectivos passam por
reduzir a nossa dependência da União Europeia e compatibilizar essa condição
com a nossa tradição e experiência de nação atlântica e global. Quanto ao
modelo económico, as principais características do que proponho são a
prioridade absoluta a um modelo exportador de bens e de serviços, a preferência
pelo que sabemos fazer bem e acrescentar maior valor ao que produzimos e
exportamos. Por último, devotar particular atenção e competência na atracção do
investimento, nomeadamente estrangeiro, de empresas integradoras dos
componentes e dos sistema da produção nacional, empresas que, paralelamente ao
investimento, nos tragam mercados. Ou seja, aumentar a exportação de produtos
dirigidos aos consumidores, com maior integração nacional e mais valorizados.
Um exemplo: se exportarmos um molde para produzir um para-choques de automóvel
recebemos 500 000 euros por isso, se exportarmos os para-choques receberemos
3000 000 de euros por ano e durante dez anos, aumentando as exportações seis
vezes em cada ano.
Neste tema das exportações Portugal é
uma verdadeira anomalia, porque exporta apenas 40% do PIB, o que está em linha
com as exportações das grandes economias europeias com grandes mercados
internos, como é o caso da Alemanha, da França e da Itália. Os outros países
europeus da nossa dimensão exportam entre os 52% da Dinamarca e os mais de 100%
da Irlanda. Isto é, uma empresa portuguesa que apenas venda no mercado interno
e pretenda comprar um equipamento altamente produtivo, que é caro mas produz
mais barato, não o pode fazer, ou fazendo-o para um mercado de apenas dez
milhões de clientes potenciais irá rapidamente à falência. Esta anomalia,
essencialmente portuguesa, resulta de que em valor exportamos aproximadamente
metade da Dinamarca e da República Checa, 1/4 da Irlanda e 1/5 da Bélgica.
Defender, nestas condições, o crescimento do consumo nacional para sair da
crise é absurdo e só pode dar asneira.
De que fica escrito o menos óbvio é o
que fazer para atrair o investimento de empresas integradoras, empresas
semelhantes à Autoeuropa. Para o nosso bem, acontece que Portugal é o país
europeu com melhores condições para o conseguir e por razões logísticas, porque
nas economias modernas as empresas integradoras importam ferramentas,
componentes e sistemas de todo o mundo e enviam depois os seus produtos para
todos os continentes pela mesma via. Isto é, a logística tem uma grande
importância e nenhum outro país europeu está, como Portugal, no centro das
rotas marítimas do Atlântico e basta que alguns dos grandes navios de
contentores que cruzam a nossa costa parem com frequência em Sines. Objectivo
esse que está ao nosso alcance através da oferta de serviços de transhipment
rápidos e a preços competitivos, sendo todavia claro que sem esta função de
transhipment, a pequena dimensão da economia portuguesa não justificaria a
paragem frequente desses navios. Ou seja, Sines está no centro do modelo
económico que Portugal deve adoptar e daí a sua importância no contexto da
estratégia euro-atlântica.
Este modelo aconselha ainda uma forte
diversidade económica em todos os planos. Diversidade entre diferentes sectores
da economia - agricultura, indústria, pescas, turismo e serviços - mas também
entre as diferentes concepções do que se acredita venha a ser a economia do
futuro. Por exemplo, é preciso compatibilizar as prioridades entre a nova
economia digital com a integração de mais e melhor tecnologia nos chamados
sectores tradicionais, evitando vanguardismos inúteis.
Finalmente, existe a questão política. Recordo que foi a política que
conduziu Portugal para mais de uma década de crise, fruto de um enorme
desperdício dos recursos nacionais, como foi a política que permitiu destroçar
o nosso sistema financeiro. Sem esquecer a política das contradições, como seja
desejar mais e melhor crescimento económico e mais investimento em estado de
negação das normais condições de funcionamento das empresas privadas e dos
mercados, além de alguma frequente animosidade em relação aos empresários.
O crescimento da economia portuguesa
acima dos três a quatro por cento necessários para vencer a crise, pagar a
dívida e promover a justiça social não é uma miragem e é possível, reconhecendo
contudo que não há justiça social sem eficiência económica. Mas para que isso
seja credível precisamos de ideias claras, de devoção ao interesse nacional
acima de todos os outros interesses particulares e não desperdiçar nenhum dos
recursos nacionais. Entre os quais avultam o factor trabalho e a localização de
Portugal no centro do Ocidente e das rotas de mercadorias entre os continentes.
O crescimento da economia portuguesa
através do aumento das exportações é não apenas desejável e possível, é também
a normalidade de um país aberto ao mundo global e localizado no centro do Ocidente.
O que não é normal é a estagnação económica em que vivemos há quase duas
décadas.
Empresário
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