Por
Miguel Esteves Cardoso
Um
lote perfeito de cafés feito por um único príncipe: Claudio Corallo
Em
Abril recebi um mail que me encheu de esperança. Depois de tantos anos a
deliciar-me com o magnífico cacau e os maravilhosos chocolates de Claudio
Corallo, ia poder finalmente provar o café dele.
Há mais de 40 anos que Cláudio Corallo
trabalha com o café. Foi para o Zaire em 1974 como engenheiro agrónomo. Tinha
23 anos e depressa se tornou em produtor de café.
No princípio dos anos 1990, por causa da
instabilidade política naquele azarado país (hoje República Democrática do
Congo), mudou-se para São Tomé e Príncipe. O resto faz parte da história do
café e do cacau. No site claudiocorallo.com, que é o mesmo onde se vai comprar
o café, conta-se parte dessa história. Mas a modéstia de Corallo impede-o de
descrevê-lo como o paciente revolucionário que ele é.
O café dele “Selecção Especial Claudio” é uma
mistura muito judiciosa e inteligente das três variedades de café Arábica que
ele cultiva na plantação de Nova Moca, na ilha de são Tomé.
Lembre-se que o cacau e o chocolate que ele
produz vem da plantação Terreiro Velho, que fica na Ilha do Príncipe. Adiante
se falará na maneira espantosa de combinar as duas ilhas e os dois frutos que
Corallo arranjou: o Chocolate Três Loucuras de Café.
Num mail em francês e inglês que mandam aos
clientes explica-se, com mais pormenores do que no site, que o lote tem 92% das
três variedades de Arábica (Caturra, Bourbon e Novo Mundo) e 8% dum Café
Robusta “particularmente doce” que Corallo tinha cultivado no Zaire (hoje RDC).
Esta adição de uma pequena percentagem de
Robusta é considerada um ultraje por quem prefere que o café seja 100% Arábica,
como é o meu caso. Sobretudo para quem faz café de filtro.
A pequena percentagem de Robusta é uma
tradição italiana: a Robusta acrescenta crema ao café expresso.
Se eu soubesse que o lote de Corallo continha
Robusta jamais o teria encomendado, até porque já desisti há muitos anos de
fazer café expresso. Para que é que eu queria 8% de um Robusta do Zaire a
contaminar os Arábicas de São Tomé?
Aida bem que encomendei e provei o café antes
de saber. Senão teria ficado prisioneiro dos meus preconceitos e nunca
conheceria o enorme prazer de beber o lote feito por Corallo.
Fazer um lote de café é mais difícil do que
produzir uma só variedade de café. Tal como nos whiskies, o trabalho do blender
é mais delicado do que o trabalho de destilador de single malts.
As tabletes de chocolate Corallo são únicas no
mundo porque são feitas com cacau produzido pela mesma pessoa na mesma
plantação.
O blend de cafés de Claudio Corallo goza da
mesma, incrível unidade e identidade. O café foi cultivado, processado, torrado
e loteado por ele. Um só indivíduo tomou todas as decisões que resultam numa
transcendente chávena de café.
Em 2015 Tim Wendelboe — discutivelmente o
melhor cafezeiro do mundo — comprou uma plantação de café em Huila, na
Colômbia. Chama-se Finca El Suelo e só daqui a uns anos saberemos como será o
café. Como a plantação fazia parte da célebre Finca Tamana, teremos sempre um
termo (delicioso) de comparação.
Cláudio Corallo já está nessa posição há muito
tempo. Não vai em modas. O café dele coincide com o estilo actual do café — é
leve, doce e frutado — só porque o estilo actual favorece, acima de tudo, a
qualidade do café.
O café fica muito bom com a água a 96 graus
mas fica sublime com a água a 80 graus. A extracção que recomendo leva 16
gramas de café para 250 ml durante um máximo de dois minutos.
O café é muito caro (125 gramas custam 12
euros) mas vale a pena, não por ser muito raro, mas por ser muito bom. Fiz três
encomendas de nove pacotes de 125 gramas (108 euros) para beneficiar da oferta
dos portes. A transportadora é a excelente UPS.
Depois da terceira encomenda recebi, num
embrulho separado, um presente: uma caixa com 150 gramas de Chocolate Três
Loucuras de Café, que custa 17,20 euros. Cada grão das três variedades de
Arábica é coberto de chocolate a 55%.
Segui as sugestões de degustação de Corallo e
fiquei deslumbrado. Tive pena da percentagem de cacau não ser mais alta: o
chocolate é doce de mais.
O café de Corallo é bom de mais para
acompanhar até os chocolates de Corallo, que são os melhores do mundo.
Tem de ser bebido sozinho, em silêncio, para o
ar se poder encher dos suspiros que nos suscita.
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