27/05/2016
Não é a administração
pública. É a decadência pública. PSD, CDS e PS transformaram a Cresap numa
agência de emprego.
Isto já começa a ser
embaraçoso. Espantoso. Para não dizer vergonhoso. Quem tem razão é Manuela
Ferreira Leite: “A Cresap é uma fantochada.” Dia sim, dia não, o Governo
anuncia a anulação de um concurso público feito pelo anterior Governo para
cargos de chefia na administração pública. No dia "sim" manda embora
um dirigente que lá foi posto pelo Governo anterior, e no dia "não"
mete lá um boy do PS. Manuela Ferreira Leite tem razão: "A Cresap é uma
fantochada.” E os dirigentes públicos, que nem fantoches, entram nos organismos
e nas repartições públicas com um cartão de militante numa mão e saem quando
muda o Governo com as duas a abanarem.
Esta terça-feira foi dia
"sim". Vieira da Silva correu com a direcção do Instituto de Segurança
Social (ISS) que estava a ser assegurada por Ana Clara Birrento desde Julho do
ano passado. Birrento e a sua equipa tinham participado num concurso da Cresap
e foram escolhidos pelo anterior Governo para um mandato de cinco anos. Nem
sequer completaram um.
O ministério de Vieira da
Silva justifica o afastamento dos dirigentes com a “necessidade de imprimir
nova orientação à gestão”, argumento esse aliás que tem sido repetido até há
exaustão nos últimos meses para afastar dezenas de outros dirigentes públicos
dos lugares de chefia. Que novas orientações são essas que Ana Clara Birrento e
a sua equipa são incapazes de cumprir? O Ministério da Segurança Social explica
em comunicado as novas orientações: “Mais coesão, menos desigualdade, reduzir a
pobreza, bem como promover a natalidade.” É fácil depreender daqui que Ana
Clara Birrento e a sua equipa são defensoras de orientação diversa, ou seja, de
menos coesão, maior desigualdade, mais pobreza para todos e de uma política de
travão à natalidade sabe-se lá com que métodos contraceptivos. Tanto disparate
junto.
Não é de hoje e não é de
agora esta espécie de saneamento na administração pública. Em Dezembro, o
ministério de Vieira da Silva, que mais parece uma agência de trabalho
temporário, anunciou a demissão do conselho directivo do IEFP, que era liderado
por Jorge Gaspar e por dois vogais. De caminho, fez também cessar as comissões
de serviço dos delegados e subdelegados regionais e de dois dirigentes dos
serviços centrais do instituto. Nesta brincadeira, mais de 80 dirigentes
intermédios e regionais foram afastados. A justificação foi a de sempre: “A
necessidade de imprimir uma nova orientação estratégica aos serviços.”
Tanto o Governo imprime
que mais parece uma máquina fotocopiadora. Em meados de Abril, também para
“imprimir uma nova orientação à gestão dos serviços”, Mafalda Lopes dos Santos
acabou por ser afastada do INA. Em Março, o Governo decidiu igualmente exonerar
a equipa de gestão do Programa de Desenvolvimento Rural 2020, responsável por
gerir os fundos comunitários na área da agricultura e, mais tarde, também
correu com o responsável do Compete. O caricato, no caso do Compete, é que
Vinhas da Silva soube do seu afastamento pelos jornais e recusou abandonar o
cargo. Chegámos ao ponto decadente e degradante de durante uns dias terem
coabitado nos escritórios do Compete dois presidentes, cada um no seu gabinete.
Isto não é a
administração pública. Isto é a decadência pública. A Cresap foi criada pelo
Governo anterior e tinha um propósito nobre de despartidarizar a máquina do
Estado, criando concurso público para evitar que o Estado fosse inundado pelos
boys dos partidos. Todos são livres de concorrer e a Cresap analisa os
currículos, faz entrevistas e escolhe três candidatos para uma shortlist em
função do mérito. Cabe à tutela escolher um de entre os três. O que acabava por
acontecer é que a possibilidade de escolher um em três não tirava completamente
da equação o perigo de continuar a haver escolhas em função da cor partidária.
No ano passado, ainda com o anterior Governo de coligação de direita, houve 14
concursos para directores regionais da Segurança Social, e dos escolhidos 11
tinham ligações ao PSD e os restantes três ao CDS. É obra.
E não foi só isso que
desvirtuou a Cresap e a transformou numa fantochada. A direita usou e abusou
dos regimes de substituição (que permitia aos escolhidos ganhar experiência
para depois participarem nos concursos oficiais), banalizou os chamados
"vetos de gaveta" (quando nenhum dos três escolhidos pela Cresap
agradavam ou convinham) e não poucas vezes fez concursos à medida com
exigências e especificações que à partida sabia que só seriam cumpridas por
aqueles que eles queriam que lá fossem parar.
Na altura, na oposição,
os socialistas chegaram a fazer uma proposta no Parlamento para mudar as regras
de forma a obrigar os governos a escolher o candidato indicado pela Cresap com
a melhor nota, eliminando a possibilidade de escolha de um entre os três
candidatos mais bem classificados. O melhor ganhava. Nesse caso, o cartão de
militante deixaria de servir como factor de desempate. O PS defendia que só
assim é que se evitaria que os concursos da Cresap se transformassem “num
modelo de nomeação política, dissimulado de concurso público”.
Assim que chegaram ao
Governo, o que fizeram? Esqueceram-se da proposta que fizeram quando estavam na
oposição — porque agora é a vez de eles dissimularem — e fizeram uma outra mais
pífia de reduzir de três para dois o número de candidatos seleccionados pela
Cresap para escolha do ministro. Correram com muitos dos dirigentes que tinham
sido escolhidos pelo anterior Governo para mandatos de cinco anos. Substituíram
dirigentes e chefias de topo, do Inatel à Santa Casa da Misericórdia. Colocaram
centenas de chefes com ligações ao PS em regime de substituição. Anularam
concursos que estavam em curso e que não convinham, como o do Instituto de
Informática.
Isto não é escolher
dirigentes com base no mérito como manda a lei. Isto é transformar a
administração pública numa agência de emprego para amigos, conhecidos,
companheiros de partidos e outros que tais.
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