JOÃO MIGUEL TAVARES
Uma notícia de ontem do Jornal de
Negócios, apoiada no barómetro da Aximagem de Março, afirmava que o Partido
Socialista estava a cair nas sondagens pelo sexto mês consecutivo. A queda
acumulada atinge já os quatro pontos percentuais: o PS está agora com 36,1% das
intenções de voto e a soma dos votos de PSD e CDS colocam os dois partidos a
apenas 1,1% dos socialistas, bem dentro da margem de erro. Pior do que isso:
embora a sondagem da Aximagem tenha já sido realizada após as notícias das
desventuras de Passos Coelho com a Segurança Social, a verdade é que António
Costa dá um trambolhão no índice de popularidade superior ao do
primeiro-ministro. Ou seja, tudo indica que elogiar os progressos do país num
casino cheio de chineses tenha prejudicado mais Costa do que os atrasos de
pagamento à Segurança Social prejudicaram Passos Coelho.
Mas isso não explica tudo. No final
do mês passado, quando se completaram os primeiros 100 dias de Costa à frente
do PS, o Observador fez uma pequena entrevista de balanço a Ferro Rodrigues,
que admitiu as dificuldades que o partido estava a ter em passar a sua
mensagem. E justificou-as de duas formas. Primeiro: “Quando três comentadores
das televisões em canal aberto são dois ex-líderes do PSD — só o Morais
Sarmento é que não foi — estamos numa situação um pouco estranha do ponto de
vista da comunicação.” É a velha estratégia de culpar os mensageiros pela falta
de qualidade da mensagem — um argumento absurdo tendo em conta a boa imprensa
(que começa agora a passar) de António Costa.
O segundo argumento é, contudo, bem
mais interessante, e é curioso ter sido proferido tão claramente por Ferro
Rodrigues, quando ainda há cinco meses ele estava a tecer loas a José Sócrates
em plena Assembleia da República, garantindo nessa altura à comunicação social
que o PS “não é o Partido Comunista da União Soviética, que eliminava pessoas
das fotografias”. Hoje, o discurso rodou 180 graus, e Ferro Rodrigues daria
tudo para rasgar o álbum 2005-2011 de uma ponta à outra. Palavras do actual
líder parlamentar do PS ao Observador: “O PS tem uma situação bastante infeliz
com o facto de o antigo primeiro-ministro estar em prisão preventiva, uma
situação que causa evidentemente grandes dificuldades.”
Ai causa, causa. E é bom que alguém
do topo da hierarquia do PS tenha a lucidez de afirmar isso de forma tão
explícita, após tanta romaria a Évora. Aliás, a declaração de Ferro Rodrigues
tem certamente uma dupla intenção: justificar o presente mas também prevenir o
futuro. Daqui até ao Outono há mais do que tempo para surgirem notícias que
comprometam o PS muito para além de Sócrates. A ser verdade o que anda a ser
publicado, não é possível que a manipulação de concursos estatais e o forrobodó
das obras públicas possam ter sido realizados sem uma razoável teia de
cumplicidades. E se mais suspeitas caírem em cima dos socialistas até às eleições,
tudo pode vir a ser posto em causa.
Parte do que se passa com António
Costa tem, pois, a ver com a dificuldade de renovação do PS e com uma maior
proximidade aos socráticos do que aquela que António José Seguro tinha. Com
Costa vieram demasiadas caras antigas, demasiados assessores antigos, demasiada
tralha socrática — e o que seria um trunfo em Outubro transformou-se num
pesadelo a partir da noite de 21 de Novembro de 2014. O que se passa com
António Costa é isto: o peso do passado está a comprometer o seu futuro. E a
procissão ainda vai no adro.
Actualizado a 13 de Março de 2015
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