Vasco Pulido Valente |
Aviário de ministros
in jornal Público
in jornal Público
Pedro Passos Coelho teve uma
carreira típica. Entrou muito cedo na JSD, à força de trabalho e zelo conseguiu
chegar a presidente dessa inconcebível organização e, através dela, entrou no
Parlamento.
Quando saiu aos 35 anos, sem
outra qualificação que não fosse o liceu, foi obrigado a começar uma vida
normal: resolveu tirar um curso de Economia e, como entretanto se casara,
arranjar um emprego. Por essa altura, jantei com ele meia dúzia de vezes, por sugestão
de um amigo comum, Eduardo Azevedo Soares. Achei Passos Coelho um homem
agradável e sensato, mas transparentemente inseguro. Também se via que o
dinheiro não lhe sobrava e o futuro era para ele obscuro e, de maneira geral,
pouco prometedor. Não acredito que naquele tempo lhe passasse pela cabeça
chegar a primeiro-ministro.
Como ele, houve centenas de
pessoas que, por causa de uma educação perversa nas “juventudes partidárias”,
entraram na meia-idade (os 35 anos de que fala Dante) sem um passado profissional
e com uma visão do mundo distorcida pela incessante intriga a que se reduzia a
actividade interna do PS e do PSD e em que participavam de pleno direito e, às
vezes, como personagens maiores. Pior ainda, esta espécie de currículo dava uma
certa autoridade a gente a quem faltava qualquer outra. Não vale a pena falar
de António José Seguro. Mas basta lembrar que António Costa proclama por aí com
orgulho que se inscreveu no PS aos 14 anos, para se perceber a natureza da
aberração que os partidos promovem, julgando manifestar a sua perenidade e a
sua força. Como se a perenidade e a força consistissem em enganar inocentes,
abaixo da idade do consentimento político.
A condição dos membros das várias
“juventudes” dos partidos (que vão até aos 30 anos) acaba por ser uma condição
de relativa irresponsabilidade, sobretudo para aqueles que exercem cargos no
“aparelho”. Os deveres para com a sociedade e o Estado são obscurecidos pelas
pequenas lutas domésticas pelo poder e pela grande questão de saber se a seita
consegue ou não ocupar o governo e o Estado – fonte de favores, recompensas,
influência e dinheiro. Este mundo fechado sobre si próprio não se importa muito
com o mundo exterior e não exige um comportamento cívico exemplar. Pelo
contrário, tolera uma imensa quantidade de “erros”, por assim dizer, em nome do
interesse superior da facção. Do incidente fiscal de Pedro Passos Coelho só uma
coisa se deve concluir: as “juventudes partidárias” precisam de ser abolidas,
como primeiro acto para a regeneração do regime. Os jovens que se inscrevam
onde quiserem na idade de votar e que sejam tratados como o militante comum.
Que os partidos não sirvam mais de educadores da “classe política” e aviário de
ministros. Basta o que basta.
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