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O que tem de ser…
Vasco Pulido Valente
28/02/2015 - 06:44
Quem ler, ou reler, hoje As Farpas de Eça de
Queiroz, publicadas depois com o título de Uma Campanha Alegre, nota
imediatamente que ele quase só trata dos grandes problemas da política
portuguesa: a questão da Fazenda (das Finanças, como se diria agora), ou seja,
da dívida e do défice, e a questão dos partidos, da sua legitimidade, vacuidade
e semelhança.
A “questão da Fazenda” passa de Governo para
Governo e de legislatura para legislatura, sem nunca se resolver e piorando
sempre. Os partidos têm ostensivamente os mesmos princípios, mas dizem e fazem
uma coisa na oposição e outra no poder. Nós rimos, mas vamos percebendo que a
“questão da Fazenda” está para ficar e determina tudo; e que os partidos se
confundem e repetem exactamente por causa da sua irremediável impotência.
Isto em 1871-2. Em 2015, entrámos no mesmo
caminho, que de certeza irá durar umas dezenas de anos. Basta olhar para o caso
exemplar do supostamente brilhante António Costa. Aclamado há três meses como
salvador da Pátria, já anda, pobre homem, pelas notórias ruas da amargura.
Porquê? Primeiro, porque se recusou a prometer fosse o que fosse de preciso e
concreto, com o argumento que Portugal dependia dos credores e que não valia a
pena decidir nada sem o acordo prévio dos credores (o Syriza acabava de lhe dar
uma lição ardente). E, segundo, porque explicou a um grupo de investidores
chineses que Portugal melhorara de 2011 para cá, compreendendo a tempo que, no
essencial, será obrigado a copiar Passos Coelho. Ainda na véspera, a Comissão Europeia,
embora com um elogio prévio à obediência indígena, anunciara que Portugal
continuava com “desequilíbrios macroeconómicos” que impunham uma “vigilância”
apertada.
Claro que, nestas circunstâncias, o PS de
António Costa não subiu nas sondagens muito mais do que o PS de Seguro; e que
não conseguiu abrir entre si e a coligação Portas-Passos Coelho uma distância
significativa. O bom do eleitor, não sendo tão admiravelmente estúpido como os
radicais da esquerda, não voltará a acreditar em parlapatices. Nem é de esperar
que se deixe comover pela indignação “moral” da classe “dirigente” (que não
vive mal) com as várias manifestações da sua miséria. Pelo contrário, é de
esperar que lhe repugnem as dores desavergonhadamente teatrais que por ele
tomam comentadores políticos de vária pena e espécie. Quando as coisas se
complicam, a discrição paga.
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