Jornal público
Como o resto do país, não sei nem me cabe saber se o
prenderam justa e justificadamente. Sei – e, para mim, chega – que o homem é um
fingidor.
Nunca gostei da personagem política “José Sócrates”, desde a
campanha para secretário-geral do PS (em que ele prometeu não aumentar impostos
que, de facto, aumentou) até à sua ascensão a primeiro-ministro, muito ajudado
por Pedro Santana Lopes e pela reputação de autoritário que entretanto
adquirira.
Não tranquiliza particularmente ser governado por um
indivíduo que se descreve a si mesmo como um “animal feroz”, nem por um
indivíduo que prefere a força política e legal à persuasão e ao compromisso. Se
o tratam mal a ele agora, seria bom pensar na gente que ele tratou mal quando
podia: adversários, serventes, jornalistas, toda a gente que tinha de o aturar
por necessidade ou convicção. Sócrates florescia no meio do que foi a sufocação
do seu mandato.
O dr. António Costa quer hoje separar os sarilhos de um
alegado caso criminal do seu antigo mentor da política do Partido Socialista e
do seu plano para salvar a Pátria. O que seria razoável, se José Sócrates não
encarnasse em toda a sua pessoa o pior do PS: o ressentimento social, o
narcisismo, a mediocridade, o prazer de mandar. Claro que, como qualquer
arrivista, Sócrates se enganou sempre. Começou pelos brilhantíssimos fatos que
ostentava em público, sem jamais lhe ocorrer se as pessoas que se vestiam “bem”
se vestiam assim. Veio a seguir a “licenciatura” da Universidade Independente,
como se aquele papel valesse alguma coisa para alguém. E a casa da Rua
Braamcamp, que é o exacto contrário da discrição e do conforto e último sítio em
que um político transitoriamente reformado se iria meter.
Depois de sair do Governo e do partido, Sócrates mostrava a
cada passo a sua falsidade, não a dos negócios, que não interessam aqui, mas da
notabilidade pública, por que desejava que o tomassem. Resolveu estudar em
Paris, para se vingar da humilhação do Instituto de Engenharia e da
Universidade Independente, e resolveu fazer um mestrado em “Sciences Po”, sem
perceber que o mestrado é uma prova escolar de um estatuto irrisório. Em Paris,
viveu no “seizième”, o bairro “fino”, como ele achava que lhe competia, e, de
volta a Lisboa, correu para a RTP, onde perorava semanalmente para não o
esquecerem: duas decisões ridículas que só serviram para o prejudicar, embora
estivessem no seu carácter. Como o resto do país, não sei nem me cabe saber se
o prenderam justa e justificadamente. Sei – e, para mim, chega – que o homem é
um fingidor.
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