BARROSO da FONTE |
Por laços de
fraternidade humana, geográfica e política, a Câmara de Mirandela aprovou, em
reunião de 15 de Fevereiro de 2008, a geminação entre «a Coimbra Transmontana»
e a cidade Guineense de Bafatá, a
segunda maior da Guiné.
Quando em
fins de Janeiro do ano em curso assinei, nos diversos órgãos onde colaboro, um
crónica intitulada: «Era Transmontana a mulher de Amílcar Cabral». Nessa
crónica pude esclarecer que na Zona Agrária de Trás-os-Montes e Alto Douro,
ainda na vigência do Estado Novo, trabalhou, embora por pouco tempo, nesta
instituição pública voltada para a agricultura, o Guineense Amílcar Lopes Cabral. Formara-se em
Agronomia, no Instituto Superior de Agronomia, na área da grande Lisboa, onde
conheceu, como colega de curso, Maria Helena de Ataíde Vilhena Rodrigues que
nasceu em Casas Novas, do concelho de Chaves. Ela era filha de um conhecido
militar de carreira e prima direita do pintor Flaviense, Nadir Afonso. Cabral
nascera, exactamente, em Bafatá, em 1924. Casaram em 20 de Dezembro de 1951 e
fixaram residência na Av. Barbosa du Bocage, 90, em Lisboa. Cabral negou o
convite para Assistente naquele Instituto, mas aceitou trabalhar, como adjunto,
dos serviços agrícolas e florestais do Ministério do Ultramar. Foi nessa
condição e por essa altura que procurou conhecer a realidade do país,
possivelmente já a pensar no projecto autonómico que viria a desencadear e que
seria o primeiro movimento de libertação, de entre outros que, de imediato, se
formaram em Angola, Moçambique, Timor etc.
Em 20 de Setembro de 1952 o casal
luso-guineense, chega a Bissau e passa a residir na casa do director da Granja
Experimental, onde se lhe junta sua Mulher. É colocado no Posto Agrícola de
Pessubé (Bissau), como director. Em 1953 nasce a 1ª filha, de nome Iva Maria.
Em 1955 funda o Movimento para a independência Nacional da Guiné. Em 1956 funda
o PAI (Partido Africano da Independência) que se alarga a Cabo Verde, como
PAIGC. Entre 1956/57 funda, com outros líderes angolanos, o MPLA. Passou a
caixeiro viajante entre Portugal, Angola, Cabo Verde e Guiné. Dessa sementeira
brotam os primeiros conflitos p'rá libertação. Em 1960 corta definitivamente
com Portugal e envolve-se a tempo inteiro nessas causas libertadoras dos povos
africanos. Em 16/7/1967 iniciou, na Rádio Libertação, uma série de emissões, a
partir do Conakry. Em 1968 ataca o
aeroporto de Bissalanca (a 10 km de Bissau). Em 3 de Fevereiro de 1969 é
assassinado Eduardo Mondlane, presidente da Frelimo. A. Cabral move-se perfeitamente
na cena internacional, incuindo na ONU que toma a Resolução 275 contra a
ocupação indevida dos territórios ocupados por Portugal. Em Janeiro de 1961
inicia-se a luta armada em Angola e, já no ano anterior o PAIGC, dominava dois
terços da Guiné e de Cabo Verde. Os movimentos de libertação estenderam-se a
Timor. Amílcar Cabral fora dos principais activistas nessa odisseia libertária,
contra o domínio português. Mas tamanho empenhamento desse carismático líder,
custar-lhe-ia o assassinato, em 20 de Janeiro de 1973, por homens do próprio PAIGC
e em Conakry. A mulher e as duas filhas
desertaram e correram dezenas de países em busca de abrigo.
Durante
treze anos o país anfitrião canalizou todos os meios financeiros, humanos e
logísticos para assegurar a supremacia nas antigas províncias ultramarinas.
Amílcar Cabral ainda teve uma segunda filha da Mulher com quem casou. Essa
filha mais nova nasceu em 14 de Agosto de 1962 e recebeu o nome de Ana Luísa. A
primeira pertenceu, desde sempre, aos quadros do MPLA. A mais nova licenciou-se
em medicina e trabalha no distrito de Braga.
Ana Luísa visita regularmente a aldeia da Mãe, quase à entrada de
Chaves. Sabemos que, ao contrário da irmã, não se envolve em política
partidária.
Em 14 de Junho último o vice-presidente da
Câmara de Mirandela, Dr. Rui Magalhães, apresentou o seu mais recente livro
sobre a caracterização das freguesias de
Portugal, na sede da Casa de Trás-os-Montes e Alto-Douro do Porto. Acompanhou-o
o Presidente da Junta de Mirandela, Prof. José Eduardo Almeida que pessoalmente
não conhecíamos. Soubemos que nasceu na Guiné, mas com origem em
Trás-os-Montes. Para completar a trindade perfeita, o Dr. José Manuel Pavão,
Mirandelense dos mais ilustres e Presidente da Assembleia Municipal de
Mirandela. No diálogo que travámos veio à baila o binómio Guiné-Mirandela. Já tínhamos lido que as duas
cidades se haviam geminado, por afinidades emigratórias, telúricas e humanas.
Confirmámos que foi na presidência do
médico José Manuel Pavão que, em 15 de Fevereiro de 2008, se celebrou essa
fraternidade política, social e cultural.
Talvez os
Mirandelenses, mesmo os mais idosos, não se lembrem da passagem de Amílcar
Cabral por Mirandela. Mas meu pai trabalhava no Posto Experimental de
Montalegre, quando eu nasci. Essa extensão da Zona Agrária de Mirandela,
algumas vezes recebeu lá, esse técnico mestiço. Meu Pai conheceu-o. E, quando
fui mobilizado para o Ultramar, disse-me em tom carinhoso – vê se encontras,
por lá, o meu patrão, Engº Amílcar Cabral. Pode ser que ele te valha....
Barroso da Fonte
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