O escritor e médico vila-realense António Passos Coelho ...
Escritor/médico transmontano, António Passos Coelho |
A obra literária do escritor (e médico) transmontano (Vila Real)
António Passos Coelho, distribui-se por alguns volumes. Não tantos como se poderia
pensar, dada a sua idade (86 anos). É que o Dr. António Passos Coelho dedicou a
vida à medicina. Apenas nas horas vagas se dedicava à escrita. Mas são os
suficientes para neles se vislumbrar o encanto da palavra escrita. Juan Rulfo
apenas publicou 300 páginas e não deixou de ser o escritor que foi - divinizado
por Gabriel Garcia Marquez e Jorge Luís Borges. E com Jean-Arthur Rimbaud (a
quem brevemente dedicaremos escrito) sucedeu o mesmo; praticamente, apenas
escreveu Iluminações e Uma Cerveja no Inferno.
No conto, publicou quatro volumes: Histórias Selvagens, Gente
da Minha Terra, Mais Gente da Minha Terra e Eu e a Minha Vila.
Nos três primeiros volumes condensou uma série de contos que
retratam a realidade do quotidiano transmontano, e no quarto trás a lume uma
síntese biográfica dedicada à cidade de Vila Real.
São histórias (algumas inventadas) da vida real transmontana, onde
a descrição ímpar apalpa os tipos
humanos de outras épocas da ruralidade. Nelas desfilam personagens felizes (que
nos transportam a Bertrand Russell), homens bons, sensíveis às questões
ambientais, possuídos de amor profundo
para com os animais – mas também gente tocada pela tragédia humana (como Falk,
o herói de Conrad), com a qual o autor, na defesa dos direitos humanos, zurze
nos poderes públicos que desprezam o indivíduo, o homem simples, atencioso e
generoso a quem a vida maltratou.
Alguns
destes personagens bem poderiam ter surgido em narrativas de Vergilio Ferreira,
Miguel Torga ou de Ivan Turguénev.
Os
contos de António Passos Coelho são de uma simplicidade desconcertante;
cobertos de tristezas e amarguras, mas também de ternura; de Amor. De amor para
com a pessoa humana; um Amor Universal.
A
sua obra poética está condensada num pequeno volume – Material Humano.
Os
romances são quatro: Angola Amor Impossível, Zélia, Memórias
de Céu e Inferno e Caramulo.
O
primeiro trata da sua experiência como médico, colocado em Angola para dirigir
a luta contra a Tuberculose no distrito do Bié, sendo ainda nomeado director do
Sanatório de Luanda. Uma narrativa onde descreve a terra, as gentes, os
conflitos políticos que levaram ao período trágico da descolonização.
O
segundo desenvolve um tema que, durante muitos anos, foi um flagelo (que ainda
se mantém) no país – o aborto. Celeste, uma das personagens centrais,
pratica o aborto numa cidade nortenha – Viseu. No desenrolar da narrativa surge
Zélia, o ponto nevrálgico do romance. Sob o ponto de vista cientifico, o autor
é rigoroso, metódico, esclarecendo com simplicidade o leitor. Um livro que
devia ser obrigatório no Ensino Secundário. E lido pelas
raparigas (e rapazes) universitárias.
O
terceiro desenvolve-se em torno do destino do seu protagonista. Entregue ainda
de peito, por sua mãe que definhava da doença a uma sua tia, Silvestre passa na
pequena aldeia da Peneda, localizada
entre o Marão e o Alvão, uma infância de brutal pobreza. É entregue a um
casal de Lamego e, mais tarde, ruma para Chaves onde toda a narrativa se
desenvolve.
Caramulo, o quarto romance, desenvolve um tema similar ao
tratado por duas lendas da Literatura: Thomas Mann ( um dos últimos discípulos
de Goethe) que alerta, pela
primeira vez, para esse flagelo europeu que era a tuberculose (tal como o faz o
autor de Caramulo em Portugal, embora muitos anos mais tarde), e Hermann
Hesse em Aquista, para o tratamento de doentes com águas medicinais (as denominadas termas).
Ambos situam a acção na Suíça. Aquele no sanatório Berghof, em Davos, no remoto
mundo dos Alpes suíços e este nas termas de Baden, região designada pelo vulgo
por terra dos nabos.
Este
belo romance (Caramulo) foi agora reeditado pela editora Fronteira do Caos
em parceria com a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD),
numa homenagem prestada ao médico/ escritor (transmontano), no passado dia 24
de Junho, no auditório Geociências da UTAD.
Armando Palavras
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