Foto de Jorge Lage – Festival dos Jardins Nómadas - 24MAI2012 |
As celebrações de Maio entroncam nas festas pagãs após a
quarentena do equinócio da Primavera e a sua origem esfuma-se na bruma dos
tempos. As tradições de Maio existem desde os tempos em que o homem teve
consciência das suas fragilidades, criando os seus «deuses protectores».
A continuada repressão do cristianismo para extinguir esta
celebração deixam um rasto notável de resistência das populações, cujo expoente
máximo se encontra na Galiza e um pouco em vários pontos de Portugal, incluindo
Trás-os-Montes e Alto Douro e o seu coração geográfico Mirandela.
Em Mirandela, na primeira metade do século XX e no primeiro
de Maio, eram enfeitadas as janelas, portas e varandas das casas, os carros,
outras alfaias e os animais com flores amarelas de giestas negrais, celebrando
o renascer da vida, da fertilidade, do culto da Terra e da Natureza e afastar
as doenças, a fome e outros males naturais e para que houvesse um bom ano
agrícola. As raparigas enfeitavam-se com grandes cordões, colares, pulseiras e
grinaldas de malmequeres, maiando o Maio com cenas do quotidiano.
Dentro da celebração da Primavera e das Maias ou Maios, o
Município de Mirandela, no coração da Terra Quente, promove anualmente, pelo
«dia da cidade» - 25 de Maio, o «Festival dos Jardins Nómadas» das carretas ou
das Maias, onde o visitante poderá, ainda, conhecer a boa gastronomia, a óptima
alheira (fumeiro) e o excelente azeite.
Jorge Lage
Nota : Texto escrito com deliberada inobservância do Acordo
(?) Ortográfico.
Foto de Jorge Lage – Festival dos Jardins Nómadas - 24MAI2012 |
Nota2: Texto de cerca de 1.000 caracteres escrito para
representar o Município de Mirandela, em Ourense – Galiza, Capital da Cultura
do Eixo Atlântico, pretendendo-se destacar o «Festival dos Jardins Nómadas» ou
das carretas como lhe chamam os alunos mais novos. Quer sejam os belíssimos
desfiles e cortejo das maiolas em A-dos-Negros, concelho de Óbidos; quer sejam
as acaloradas batalhas das flores nas Festas das Cruzes de Barcelos; ou os
imponentes Festivais das Flores no Funchal; ou, ainda, as mais variadas
florálias; todos fazem parte da celebração das Maias, após a quarentena do
equinócio da Primavera, em que um bom mês de Maio era e é determinante para um
bom ano agrícola. Entendemos que a criatividade das Maias ou Maios pode ir mais
longe e assumir, através de quadras populares (coplas na Galiza) e poemas, uma
forte intervenção e crítica social, como se faz no Algarve e na Ilha Terceira
e, muito mais, na Galiza.
Ainda hoje se fala
nesse dia*
Ainda hoje se fala nesse dia. Que
surgiu como bola de fogo
na sulfurosa montanha.
Dies irae, dies illa. Distante, mas
não tanto que se tenha apagado da raiva.
Sobretudo os mais novos são os primeiros
a recordar. Um hálito forte
de primavera excitava o húmido
corpo da noite e alguns cravos
trocavam na varanda suas palavras
recentemente proibidas.
À boca de muitos túneis, o mesmo corpo
surgia lentamente inundado de tons
claros. E passos musicais, firmes,
falavam cada vez mais alto
pela incrível madrugada.
Quem decidiu tão feroz descontentamento
e encheu de alecrim as urnas
da memória? Até o ouro tinha um sabor
a enxofre. Velhas ideias
ardiam. Quão doce espectáculo! As culpas
reentravam no buraco dos olhos,
coisas insalubres, enquanto as lendas
vinham para a rua em cabelo.
Quando rompeu a manhã, um clarão
íntimo começou a jorrar
dos armários da luz, acumulação
de muitos anos, subiu de novo
às varandas, floriu no púbis.
Escancarou as coisas interditas.
Os jornais e as fábricas, a alcova
secreta, a rua e os campos anilados,
a escola da luz, tudo isso comoveu
o frágil coração do poeta que
pôs olhos atentos na cotovia:
do morro o coração, emerso no nevoeiro,
cintilava. Ainda hoje
se fala desse dia.
Mas sobretudo os mais novos continuam a recordar
.
*António Cabral (sobre o 25 de Abril) (1931-2007), natural de
Castedo – Alijó, talentoso na cultura e na escrita, a quem apelidei de «Poeta
do Douro» (tão bem o cantou e às suas terras e suas gentes). Miguel Torga, de
quem era amigo, diz-me um amigo comum que o «Poeta da Montanha» tinha alguns
ciúmes de António Cabral. Ciúmes pela facilidade com que o «Poeta do Douro
lavrava o campo de letras ou burilava os poemas. A escrita saía-lhe como a água
das generosas fontes. Sem o estímulo do meu Mestre e amigo, António Cabral,
acho que nunca me abalançaria no campo da escrita.
Sem comentários:
Enviar um comentário