quinta-feira, 19 de junho de 2014

BARROSO da FONTE - Quem torto nasce algumas vezes endireita e dá que falar



Barroso da Fonte
BARROSO da
FONTE
José Maria Espírito Santo Silva
A história da humanidade está cheia de muitos e nobres exemplos de pessoas que nascem em circunstâncias muito estranhas e que, quando abrem os olhos, fazem-no em condições, surpreendentemente, vencedoras.
Eça de Queirós (1845-1900) é um esclarecedor exemplo. Alfredo Pimenta (1882-1950), foi «exposto na roda» e acolhido por um tio padre. Escreveu quase duzentas obras, sobre matérias muito diversas. E tem o nome na praça. Em Lisboa, em Guimarães,  em Penouços e, certamente, noutros grandes meios do país. Haveria tantíssimos outros exemplos a referir. Mas fixo-me no «caso» do fundador do Banco Espírito Santo que o Suplemento do Dinheiro Vivo, do JN de 24 de Maio, insere em 3 páginas (08-09 e 10). Uma biografia apaixonante sobre José Maria Espírito Santo Silva. «Recebe o nome de Maria, Mãe de Deus, sua Madrinha de baptismo, do Espírito Santo, quando se crisma; e Silva, talvez, como seu pai», lê-se nesta fonte. Curioso é o relato que se descreve no assento que foi escrito em 1850: «Aos vinte dias do mês de Maio de 1850 baptizei – José – que nasceu a 13 do corrente, filho de pais incógnitos, apresentado nesta Igreja pela parteira Hipólita Joanna» dita o padre Joaquim, coadjutor na igreja da Encarnação.
Carlos Damas, do arquivo histórico do BESCL, segue a pista do conde de Rendufe, intendente-geral da Polícia. Atribui-lhe a paternidade da criança nascida nos Fiéis de Deus. Tem até um retrato do fidalgo pendurado numa das salas da Rua do Comércio. O conde era padrinho de Maria Angelina que criou o rapaz, a quem nunca fez passar as privações comuns a estas crianças na Lisboa dickensiana do século XIX. «Mas factos só com provas». Adiantou o arquivista. A verdade é que, aos 19 anos quando casa pela primeira vez, José Maria já é dado como cambista estabelecido na Calçada do Combro. Começa por distribuir cautelas da lotaria espanhola. Aproveita a enchente de carlistas que, na década de 70, procuram abrigo em Lisboa.
Eça de Queirós
José Maria atravessa anos difíceis. O negócio envolve riscos que as crises financeiras de 1875-76 vêm aprofundar. À febre bancária, seguem-se insolvências das casas de crédito.
  Nessa fase difícil, trabalhando até às 2 h da madrugada para retomar o trabalho da escrita às 5 ou 6 da manhã, escreverá: «Mais vale perder pouco e cedo do que muito e tarde. Descontente com o negócio dos cupões espanhóis, dedica-se à compra e venda de títulos nacionais e estrangeiros. Passa todas as tardes pela Bolsa de Lisboa para acompanhar a evolução das cotações. Passa a negociar lotes no Passeio Público, mesmo sabendo que será arrasado para a abertura da Avenida da Liberdade. Conhece o Campo de Ourique, como zona de construção. E ali arrenda a exploração de uma pedreira, passando a vender lotes construídos. Em apenas dez anos consegue amealhar um milhão. O Ultimato Inglês cria novas dificuldades. Apesar de tudo passa a comprar prédios por toda a cidade de Lisboa. Nessa altura casa pela segunda vez com Rita Ribeiro de quem tem quatro filhos.
Alfredo Pimenta
Maria, José, Ricardo e Manuel Por motivos de saúde vai viver para os Alpes suíços. Recomenda à mulher que mande estudar os filhos preparando-os para os grandes desafios do império que ele originou. Morre em 1915. No testamento declara distribuir 30 contos por asilos e albergues de infância desvalida. Aos 19 anos o mais velho dos três filhos assume a gestão da herança. Mas as convulsões políticas fazem com que entre 1914 e 1920 o custo de vida suba 14 vezes.
Mesmo assim, em 9 de Abril de 1920, era lançado o Banco Espírito Santo. Mudanças profundas nos quadros, envolvimento transversal a instituições comerciais e industriais, junção do Grupo Espírito Santo à poderosa Casa dos Espíritos, proveniente  do casamento de Ricardo, com Mary Cohen, filha do um conhecido financeiro de Gibraltar. O irmão mais velho apaixona-se pela cunhada, Vera Cohen. Mas a irmã de ambos, de nome Maria, reprova o segundo casamento e acaba por fazer com que o José case com Maria José Borges Coutinho, de quem tem 3 filhos. A Vera Cohen também casa mas não tem filhos.
 Em 1932 o José combina com a Vera e fogem, de comboio, para Paris, onde casam. Esse escândalo provoca a passagem  da Presidência do banco para a influência do irmão Ricardo. Foi estratégica para a reviravolta gerada pelo escândalo do José que  devolveu ao irmão todo o poderio financeiro de um dos mais importantes bancos Portugueses. O Estado Novo beneficiou da abundância e sucessos financeiros dessa Instituição. Foi assim nas duas primeiras gerações e tem continuado na terceira.
O que me inspirou nesta crónica foi o desprezo social  com que José Maria Espírito Santo Silva «filho de pais incógnitos» veio ao mundo. Citei Eça de Queirós e Alfredo Pimenta, como exemplos semelhantes. Três figuras Portuguesas que provieram do nada e ascenderam aos píncaros do prestígio pelas mais nobres razões. Uma lição de vida para quem nasce em condições de pouquidade material e humana, mas que demonstra na vida real a superação dessas barreiras, desde que faça do trabalho, da honradez e da dignidade os três valores supremos.

                                                                                                                      Barroso da Fonte

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