Barroso da Fonte |
Tive a sorte de conhecer
pessoalmente este médico Duriense. Trocámos correspondência e com ele aprendi
muito do pouco que sei. Conservo dele e de vários outros escritores
Transmontanos, correspondência inédita de : Guedes de Amorim, do filho Camilo
de Araújo Correia, de Miguel Torga, de Mário Gonçalves Carneiro, de Alberto
Miranda, de Gonçalinho de Oliveira, de António Cabral. Trás-os-Montes e Alto
Douro sempre foi berço de muitos e notáveis escritores. E esse estatuto
prossegue com nomes que honram os seus antecessores: Adriano Moreira, Hirondino Fernandes, A. M. Pires Cabral,
Amadeu Ferreira, Ernesto José Rodrigues, Armando Palavras, Jorge Lage, Jorge
Golias, Henrique Pedro, Luís Oliveira, Francisco Gouveia, Barros Ferreira,
Ribeiro Aires, Caseiro Marques, Bento da Cruz, Lourenço Fontes, Dias Vieira e
tantos quantos justificam a fundação da Academia de Letras de Trás-os-Montes, o
Grémio Literário e outros organismos culturais. Na senda desses renomados
criativos vão surgindo, um pouco pela antiga Província que as Comunidades
intermunicipais vieram perturbar, num processo administrativo condenável por
vários motivos. A identidade cultural é um desses malefícios.
O ilustre Advogado Manuel Joaquim Martins de Freitas, sediado na Régua
sempre manifestou propensão para as letras. Tem colaboração dispersa por
diversos jornais e revistas, fez palestras, editou opúsculos e, após um quarto
de século como jurista e como delegado concelhio da Ordem dos Advogados
entendeu regressar à vida académica para frequentar na UTAD, um Mestrado na
área da Cultura Portuguesa. Após a parte lectiva é obrigatório desenvolver um
tema original sob a coordenação de um orientado que com mais dois doutorados
constituem o júri dessa defesa pública.
Fernando Moreira foi seu
professor e Orientador. Mário Pinto, outro docente da mesma área científica foi
arguente. E, trabalhando e vivendo na
Régua que foi berço de João de Araújo Correia, que «foi mestre na crónica», e
figura incontestada da literatura
Portuguesa, nenhum outro tema seria mais apropriado para uma dissertação que há
muito se esperava.
Memória e Património Cultural nas
Crónicas Durienses de João de Araújo Correia, foi o tema desse grau académico
registado em 2010 nos Serviços
científicos da UTAD. Em 264 páginas,
com dezenas de fotos, a preto e branco e
a cores, Martins Freitas, reuniu vivências de uma vida complexa, rica e
diversificada. Dessa pesquisa resultou
uma obra em que nada escapa à observação do investigador e que o obrigou a
rebuscar aspectos inéditos e originais, porque essa é a essência de uma tese.
Já bastante se escreveu sobre a
fecundidade deste Autor Duriense. Mas muitos aspectos dessa exuberância
gravitacional ainda se encontrava nas catacumbas da memória mais empedernida.
Faltava-lhe o zigoto da fecundação literária. Dessa descoberta se incumbiu
Martins de Freitas que cedo se habituara ao «fascínio que João de Araújo sentia
pela Região do Douro que amiúde, a tratava por «o meu país vinhateiro» ou «o
meu pátio Doiro». Na introdução o investigador esclarece o leitor de que «o
corpus deste ensaio se circunscreve às crónicas relativas à memória, à
identidade e ao património cultural do Douro, incluindo o etnográfico, publicadas em cerca de 50 anos.
As crónicas a analisar vão desde a recolha publicada no volume «Sem Método», de
1938, às publicadas no Jornal O Arrais, semanário do Peso da Régua, desde o seu
primeiro número, de 23 de Março de 1978 a 31 de Dezembro de 1985, altura em que
o escritor faleceu. Adverte Martins de Freitas que «tivemos de fazer opções na
escolha do tema. Inclinamo-nos para a memória, a identidade e o património
cultural. Neste se insere a etnografia duriense».
Depois da explicação introdutória que é
fundamental à interpretação do leitor, Martins de Freitas entra na biografia do
biografado e dele diz aquilo que em João de Araújo Correia, num
estudo como este não poderia ser subestimado. Elaborou um esquema amplo e
envolvente à dimensão dos parâmetros a inquirir para concluir por três
capítulos elementares: etnografia, etnologia e antropologia. É essa a trilogia
que resulta da obra de João de Araújo Correia à luz do campo de análise que
quis invocar na sua produção literária. Uma espécie de monografia duriense que,
de ora em diante, obrigará todos aqueles que pretendam falar deste pedaço de
céu implantado nas margens do Rio Douro, a citar o mais importante livro que se
editou acerca do papel do médico João de Araújo Correia,desde a sua morte em
31/12/1985.
Barroso da Fonte
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