Rembrandt, Amesterdão, 1636
in: Dicionário do Judaísmo Português,
Presença, 2009, p.88.
Pela leitura do Dicionário do Judaísmo Português (Presença, 2009), em artigo redigido por Yosef Kaplan[1], ficamos na dúvida sobre o local de nascimento deste rabino sefardita de Amesterdão, cujo nome original era Manuel Dias Soeiro. Se Lisboa ou La Rochelle, França. Ao certo sabemos que nasceu no seio de uma família de cristãos-novos portugueses de origem judaica.
Cecil Roth[2] e António José Saraiva[3] apontam para que tenha nascido e sido educado em Lisboa. Contudo, Pinharanda Gomes[4], insinua que é obscura a sua origem. Porém, acrescenta que provinha da ilha da Madeira e teria nascido em La Rochelle. Na verdade, afirma Pinharanda, os seus biógrafos dão versões conjecturadas e copiadas uns dos outros.
O seu pai foi condenado pela inquisição e a família emigrou para Amesterdão por volta de 1613. Aí regressaram à fé judaica, aderindo à congregação sefardita de Neveh Shalom. Além de estudar o Talmude com o rabino Isaac Uziel, Israel alargou os seus conhecimentos teológicos e filosóficos, adquirindo ainda um amplo conhecimento do latim, do grego e de diversas línguas europeias.
Em 1626 fundou a primeira imprensa hebraica em Amesterdão que dirigiu pessoalmente até 1643, passando-a a partir desta data para a posse de seus filhos Joseph e Samuel que dela se ocuparam até 1656. Dedicou um poema e ofereceu livros à Rainha Cristina da Suécia, foi um teólogo sábio, e faleceu em Middelburgo. O epitáfio rezava: “Não morreu. Vive no céu na suprema glória e a sua pena torna a sua memória imortal sobre a terra”. A sua obra publicada foi vasta. Era consultado por várias personalidades sobre assuntos bíblicos e talmúdicos. Entre outras, cite-se Manuel Fernandes de Vila-Real, nascido em 1608, em Lisboa, cuja família era de Vila Real, terra que lhe ficou de sobrenome, como é narrado por António Borges Coelho em Um Politico e escritor do século XVII ou, do mesmo autor, Cristãos-novos, Judeus e Novos Argonautas[5].
Menasseh Ben Israel (ou Manuel Dias Soeiro) foi amigo de Grotius, Vossio e de Rembrandt[6], o “mítico” pintor holandês que lhe ilustrou a edição de Piedra Gloriosa, e lhe fez o retrato em gravura que acima se reproduz[7].
Armando Palavras
[1]The Mandel Institute of Jewish Studies, Faculty of Humanities, Hebrew University , Jerusalém , Israel
[2] A life of M. ben Israel (1934)
[3] Studia Rosenthaliana, I
[4] A Filosofia Hebraico-Portuguesa, Guimarães Editores, 2009
[5] A este propósito, cf., António Júlio de Andrade/Maria Fernanda Guimarães, A Tormenta dos Mogadouro na Inquisição de Lisboa, Vega, 2009; Dicionário Histórico dos Sefarditas Portugueses / Mercadores e Gente de trato, dir. A.A. Marques de Almeida, Campo da Comunicação, 2009; Cecil Roth, História dos Marranos, Civilização, 2001, pp. 112-113
[6] Cerca de 100 anos antes da realização deste retrato, Lisboa era o centro da Europa. Importantes colónias de mercadores, especialmente do Norte e do Centro europeu, constituíam-se em verdadeiras corporações comerciais que procuravam o lucro proporcionado por Portugal, constituído por um verdadeiro império à escala universal. É a época (1520-21) em que o português Ruy (ou Rodrigo) Fernandes de Almada, residente no magnífico palácio de Ymmerseele, em Antuérpia, oferece ao pintor Albrecht Dürer, então em viagem pela Flandres, os mais exóticos presentes, como é descrito por Joaquim de Vasconcelos (Albrecht Dürer e sua influência na Península, Renascença Portugueza, Estudos sobre as Relações artísticas de Portugal nos Séculos XV e XVI, Imprensa Portugueza, Porto, 1877). Relembrada por Dagoberto Markl numa homenagem a J. Pais da Silva, coordenada por Pedro Gomes Barbosa (Arte, História E Arqueologia, Esquilo, 2006). E sabe-se que do próprio Dürer [outro pintor extraordinário] existem algumas obras disseminadas pelo País, já identificadas.
[7] António Júlio de Andrade/Maria Fernanda Guimarães, em A Tormenta dos Mogadouro na Inquisição de Lisboa, Vega, 2009, informam em nota 19, página 31 que o médico Ephraim Bueno de possível ascendência bragançana, mereceu ser retratado por Rembrandt. Não podemos confirmar essa afirmação. Cecil Roth (História dos Marranos, Civilização, 2001, p.198), afirma apenas que Ephraim era amigo de Rembrandt. Poderá indiciar alguma coisa, mas nada prova.
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