Numa época em que todos os grandes filósofos (como Voltaire, Rousseau, Diderot, ou Hume) foram viajantes e europeus ávidos de conhecer o seu continente, Kant nunca se afastou da sua querida Königsberg. Ali nasceu, trabalhou e morreu. Apesar dos vários convites que recebeu das maiores universidades alemãs da época (Halle, Iena, Erlangren ou Mittau) para lá leccionar, como nos é descrito por Jean-Baptiste Botul nas suas conferências a propósito da sexualidade do filósofo (ed. Cavalo de Ferro, 2004).
Quando Immanuel Kant foi a enterrar em 1804, nessa cidade prussiana, onde havia vivido os seus oitenta anos (tornando-se célebre já perto dos sessenta), os seus amigos pensaram que seria um funeral simples, porque há anos que vivia em completo recolhimento. Enganaram-se. Filho de um pobre artífice, foi sepultado como um rei. Diremos mesmo como um imperador. Assim que a notícia da sua morte se espalhou, as pessoas acorreram para sua casa, num fluxo contínuo. Em Königsberg, no dia do funeral, o trânsito parou. Um cortejo a perder de vista acompanhou a urna ao som de todos os carrilhões da cidade. Como foi relatado pelos seus contemporâneos, jamais a população de Königsberg havia presenciado um semelhante cortejo fúnebre.
Quais as razões para esta espantosa manifestação espontânea? Para os seus concidadãos, à altura sob o regime monárquico absolutista de Guilherme III, Kant convertera-se na ressonância das ideias de 1776 (Revolução americana) e 1789 (Revolução francesa). E eles acorreram ao seu funeral para lhe testemunharem o seu reconhecimento como mestre e proclamador dos direitos do Homem, da igualdade perante a Lei, do cosmopolitismo, da auto-libertação através do saber e (talvez a mais importante) da paz eterna sobre a Terra.
Mas, invertendo a suposição de Karl Popper (na alocução proferida na British Broadcasting Corporation, em 12 de Fevereiro de 1954, como é narrado Em Busca de um mundo melhor, 1992), além deste significado tão profundo, a fama de Kant de grande filósofo e homem íntegro, ajudam a explicar essa manifestação espontânea. Kant era um cidadão na verdadeira acepção da palavra, como nos é proposto por Viriato Soromenho-Marques em A Era da Cidadania (1996).
Foram várias as gerações tocadas (e moldadas no carácter), no antigo Liceu, pelo pensamento deste filósofo enorme. Pelo dos clássicos latinos e gregos por influência dos Mestres, e pelo da Cristandade por influência familiar.
in: Negócios de Valpaços, nº 358, 15 de Março de 2010
in: Negócios de Valpaços, nº 358, 15 de Março de 2010
Immanuel Kant (1724 – 1804)
Armando Palavras
Já li estes artigos num jornal regional de Valpaços. É só cultura
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