quinta-feira, 16 de outubro de 2025

O “tríptico” de António Vieira na igreja de Santo Adrião de Sever?

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Por   ARMANDO  PALAVRAS


Há uns anos fotografámos estas três tábuas que se encontram na igreja de Sever (Santa Marta de Penaguião). Só o ano passado, ao revermos o nosso arquivo, nos deparámos, de novo, com essas imagens. E chegámos à conclusão que se tratava de um trabalho do pintor lamecense António Vieira.

Quem foi António Vieira?

Nasceu em Lamego no ano de 1592[1], onde faleceu, pobre, em 1642. Filho de um mercador de origem cristã nova. Estigmatizado pelo sangue judaizante da sua linhagem, manteve-se um discreto pintor beirão a óleo, têmpera e dourado, modalidades que o mantiveram com regular actividade ao serviço do mercado religioso das terras da Beira Alta. Assim como sua mulher, foi preso duas vezes, pelo tribunal do Santo Ofício nos cárceres da Inquisição de Coimbra.

Os processos inquisitórios a que foi sujeito, revelam-nos contornos sobre a migração de artistas “conversos” para as Américas durante os anos da União Ibérica. O que acabou por acontecer com o seu irmão, também pintor, Nicolau Vieira, cujas práticas judaicas, o obrigaram a refugiar-se com a sua família, através da chamada “Puerta Falsa de América” [2], na região do “Rio da Prata nas Índias de Castela”, para poder escapar às perseguições religiosas. E é bem provável que levasse no alforge os mesmos modelos imagéticos em que se havia educado.

A formação de António Vieira decorreu em Lisboa, iniciando a sua aprendizagem (que duraria seis anos) no ano de 1605, aos 13-14 anos, na oficina do pintor Gregório Antunes, o que explica a ruptura com os gostos tradicionais imperantes e a sua opção por uma linguagem maneirista ‘reformada’, com maior solidez de desenho e boa caracterização de acessórios. De Lisboa seguiu para Granada, onde andou alguns anos a aperfeiçoar a sua arte e onde deve ter acolhido algumas novidades do novo naturalismo protobarroco, expresso num claro-escuro que usará com competência nas tábuas de São Cosmado, e nestas de Sever. Volta a Lamego em 1617.

Apesar de tudo, ainda se manteve fiel aos tradicionais modelos tardo-maneiristas ainda dominantes no gosto acrónico dos mercados da Beira interior. O mundo artistico deste artista lamecense, denuncia sempre uma forte inspiração, como nos diz Vitor Serrão, em gravuras italo-flamengas, como Marcoantonio Raimondi, Cornelis Cort, Adriaen Collaert, Sadeler, Wierix ou Berwinchel.

Perante os dados, importa uma reflexão:

A relação deste “tríptico” com a igreja de Sever não é nenhuma. A hipótese provável da sua origem, prende-se com o convento de Santa Clara em Vila Real. Pesquisas sobre o pintor de Lamego atestam que em 1621, António Vieira pinta um retábulo para o mosteiro de Santa Clara de Vila Real, um conjunto com vários painéis que custou 70.000 rs, mas desapareceu. E estas tábuas da igreja de Sever, provavelmente pertenceram a esse retábulo desaparecido do Convento de Santa Clara. A relação de Santa Clara (de Assis) com os franciscanos é conhecida.

Um trabalho sobre esta questão foi recentemente publicado no nº 82 da Revista Tellus, Vila Real.



[1] A mesma fonte também indica o ano de 1590. Presumimos que tenha sido um lapso.

[2] Maria José Goulão já dedicou um estudo a este capítulo obscuro da expansão peninsular nas Américas. “La Puerta Falsa de América””. A influência artística portuguesa na região do Rio da Prata no período colonial, tese de Doutoramento, Universidade de Coimbra, 2005.

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