sábado, 20 de julho de 2024

História de um almoço amigável

 


JORGE  GOLIAS


Marcado o dia e a hora, lá compareci sempre pontual, um pouco antes, como é meu hábito, esperando pelo amigo, que chega sempre, ou quase, um pouco depois. Traz uma desculpa qualquer, que lhe digo para não usar porque o mal está feito. Sou assim, um bocado agreste, mas amigo. Fomos ao bitoque, bem servido, só que num prato que me parece sempre pequeno demais para o conteúdo, obrigando a repescar as batatas fritas que vão caindo à medida que se escava entre a salada e o ovo frito para chegar ao bife. Com este calor não fomos para o vinho (tinto, porque vinho é tinto) mas para a imperial gelada. Mas ali não havia imperial, diz-nos o dono com ar comprometido. Só garrafa. Sentados em uma mesa com a do lado cheia de livros que íamos folheando e sobre que discutíamos, o que deixava o atendedor aturdido de tanta eloquência e sempre que nos abordava fazia-o em pose de respeito, meio dobrado, pedindo desculpa e fazendo o seu melhor. Como já somos velhos conhecidos o atendimento é à medida e sempre com oferta de mais comida, que recusamos e agradecemos. Quando chegamos vem solícito dizendo sempre o mesmo: -já não há pratos do dia! Nós, que vamos sempre ao bife, assim o anunciamos.

Foi assim que vi os livros de BD da vida de Agostinho Neto, um guerrilheiro angolano, médico formado em Portugal, poeta brilhante e aluno inteligente, o melhor da turma de brancos, como se deduz do diálogo entre a sua professora (branca) e os alunos (brancos) quando estes não resolviam um problema e ela, zangada, lhes dizia:

-Perguntem ao preto!

(Esta história foi contada pela esposa dele, a barrosã D. Eugénia Neto)

Uma hora de conversa, contas feitas, saímos para dar uma volta pelo Centro Comercial, que é um dos primeiros do género na zona de Lisboa – o Centro Comercial do Cacém, com lojas simpáticas e gente que atende bem, algumas modernices, estilo colocar a nota ou moedas no orifício, que o sistema devolve o troco, que é o orgulho da lojista, que nos olha divertida com alguma atrapalhação.

Hoje aproveitei para passar pelo mercadinho (um Paga Pouco, ou algo assim) para comprar ovos. Em substituição de ovos que tinha em casa e que foram parte para o lixo, porque testados em água, flutuaram! Entrei acompanhado do amigo António, que assistia com ar gozador às minhas incursões pelos corredores e prateleiras comprando o que precisava e não precisava. À certa confita tentei rasgar um saco de plástico de uma bicha deles, mas estava a tentar na parte errada e não na junta de separação dos mesmos. E foi uma negrinha que me ajudou a rasgar o raio do saco. Agradeci, sorri, e disse ao meu amigo: -pergunta à negrinha! O António (Chaves) riu a bandeiras despregadas!

No fim, na caixa de pagamento, lembrei-me de que tinha trazido tudo menos os ovos. E lembrei-me também de que este uso e costume é mesmo useiro e costumeiro, de entrar para comprar algo e trazer tudo menos o tal de algo. Pois, ainda fui a tempo de ovar o cesto de compras.

Chegou a hora da despedida, com promessas de repetir porque não há nada como um encontro de amigos, presencial, abraçal, depois de despejado o saco de novidades, de discussões, algumas velhas e relhas, muitas vezes recorrentes.

Regresso a casa pelo IC19, desvio para Carnaxide ali na zona do Palácio de Queluz, estacionamento, descarga e carga de dois sacos cheios, lixando as bursites e as tendinites, que se vão enganando com uma pomadinha milagrosa que fará tão bem como a massa dos queixais do porco fazia à papeira (hoje bócio).

E enquanto a vida rolar assim, não temos grandes razões de queixa.

CNX20JUL24JG83

 

1 comentário:

  1. O Sr.Coronel tem de se habituar a fazer uma listinha antes de entrar no Paga Pouco, se não paga muito e não há reforma que dê; nem mesmo com o subsídio dos Combatentes do Ultramar e o dos Heróis do 25 de Abril ! O Zé entra no Super para ir buscar apenas o pão ou leite e, quando se apercebe, começam as coisas a cair da gabela dos braços e as pessoas a ajudarem a apanhar do chão - e é isto sempre até chegar à caixa para pagar! Nem se lembra de levar o carrinho, pois era só o pão que era preciso ...- e é sempre isto!

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