O mercado nacional prefere viver de ilusões e de enganos como estes a reger-se pelas regras da verdade e da transparência. Porque, com essas, a esmagadora maioria dos seus agentes, instituições, empreendedores, capitalistas, políticos e por aí fora, não conseguiriam sobreviver nem alimentar os seus negócios e os outros negócios, direta e indiretamente.
Elidérico Viegas, há mais de duas décadas e meia presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, apresentou a demissão do cargo na sequência de uma entrevista ao jornal i em que teve a coragem de dizer que o Rei vai nu.
Os
seus associados não lhe perdoaram. Quem? O mercado.
O
que disse Elidérico Viegas naquela entrevista? Que muitos dos prémios
arrecadados por Portugal e pelos seus operadores ou agentes turísticos, por
praias, cidades, regiões, etc. não têm qualquer valor nem reconhecimento
internacional, porque... são comprados.
E
são. Apesar de logo se terem levantado inúmeras vozes a tentarem desdizer
Elidérico Viegas e a defender tão ‘importantes’ e ‘fantásticas’ conquistas. Com
argumentos que caem por terra pelo simples confronto com as regras concursais
dos ditos prémios nas suas páginas online.
Um embuste! Um gigantesco embuste!
Os
ditos concursos ou troféus são comprados, e isso é válido para o turismo como
para uma série de outros setores da nossa pobre economia, e os portugueses
estão entre os que mais investem neste tipo de promoção e marketing.
Aliás,
devemos ser dos países com mais instituições, CEO’s, empreendedores, concelhos,
locais e o que melhor aprouver mais galardoados da Europa, quiçá do Mundo.
O
mercado nacional prefere viver de ilusões e de enganos como estes a reger-se
pelas regras da verdade e da transparência. Porque, com essas, a esmagadora
maioria dos seus agentes, instituições, empreendedores, capitalistas, políticos
e por aí fora, não conseguiriam sobreviver nem alimentar os seus negócios e os
outros negócios, direta e indiretamente.
É
claro que o alvo a abater é sempre quem, como Elidérico Viegas, ousa desafiar o
status quo ou aquilo que na linguagem do futebol se qualificou como o sistema,
e que logicamente aproveita a quem domina.
O
sistema, na economia deste país, são estes estratagemas que corrompem tudo, que
subvertem tudo, que estagnam tudo. E porque estagnam, fedem.
Basta
olhar, por exemplo, para o que se passa – desde há muito tempo – com os
próprios meios de comunicação social, que deveriam ser os primeiros a escrutinar
todos esses tais esquemas.
A verdade é que são os próprios media dominantes os primeiros a beneficiar do sistema. Veja-se o que se passa no mercado das audiências, nas centrais e agências de meios de publicidade ou de comunicação, nas associações de imprensa e outras que se dizem com o objetivo de regular e até auditar o setor e que apenas servem para chancelar esse modus faciendi, para trucidar os mais vulneráveis e incómodos e continuar a alimentar gigantes industriais sugadores de subsídios e de apoios do Estado, a troco de se vergarem.
E
o Estado – o poder político – agradece e pactua com todas estas enormidades,
subsidiando e apoiando direta e indiretamente, ora contribuindo para aumentar
lucros escondidos, ora compensando os desmandos irracionais e os vícios de um
mercado paupérrimo que se projeta e compara aos dos mais desenvolvidos do
mundo.
Uma
mentira. Uma enorme mentira.
Toda
a gente sabe e conhece bem as marteladas que abundam e degradam ainda mais um
pequeno mercado cheio de gente medíocre e corrupta, prova provada do princípio
de Peter e do reconhecimento da incompetência, em que a meritocracia fica
guardada na gaveta enquanto o prémio que custou umas centenas ou milhares de
euros, libras ou dólares orgulhosamente se exibe na secretária ou na estante de
livros bem encadernados que só servem para decoração.
Os
prémios de que Elidérico Viegas fala não servem, de facto, para nada a não ser
enganar os próprios portugueses e atrair turismo de pé descalço que rende a
taxa de um ou dois euros para a autarquia.
Alimenta
as cadeias do ‘tudo incluído’, os alojamentos locais, os botequins e as tascas
mais baratas (e muitas até são bem boas), os supermercados, mas não cria
verdadeira riqueza.
O
investimento estratégico em turismo que gera retorno duradouro, postos de
trabalho, receitas para o Estado e para os empresários/investidores é outra
coisa – leia-se André Jordan nesta edição do Nascer do SOL (na pág. 57).
Portugal
tem magníficas praias, aldeias, cidades, uma gastronomia rica e ímpar, cada vez
mais bons vinhos, um clima temperado ótimo, segurança, oferta cultural e
patrimonial muito variada. Melhore-se a Justiça, as leis laborais, o
reconhecimento do mérito, a produtividade, a qualificação, combata-se a
corrupção e as mentiras que sobejam e a mediocridade de uma certa classe
dirigente – em todos os setores, incluindo o político – e não precisamos de
mais prémios.
Portugal
vale a pena como é. Autêntico. E seria dos sítios mais paradisíacos do mundo se
não fossem esses tantos portugueses tão medíocres que só dão cabo disto tudo.
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